sexta-feira, 12 de junho de 2009

Legalização da grilagem

Editorial do Correio da Cidadania*

O governo legalizou a grilagem. Não é a primeira vez. No período colonial e no império houve diversas dessas legalizações.

A mais escandalosa até o presente foi a legalização permitida pela Lei de Terras de 1850. O Registro Paroquial instituído por essa lei permitia aos poderosos fazendeiros, mediante simples declaração, legalizar posses com o vigário da sua cidade, cabendo ao declarante indicar o tamanho e os limites dessas terras! Desse modo, as sesmarias caducas (terras públicas, portanto) foram legalizadas e formaram os enormes latifúndios que perpetuam até hoje a escandalosa concentração da propriedade da terra.

Mas, agora, a Medida Provisória 458, aprovada esta semana no Senado, foi mais longe: entregou 67 milhões de hectares de terras a grileiros que tomaram posse ilegalmente de terras devolutas já arrecadadas pelo Estado e matriculadas nos registros públicos como terras públicas. Desse modo, pessoas que deveriam ser criminalmente processadas foram aquinhoadas com a faculdade de comprar, por dá cá aquela palha, as terras que usurparam da reforma agrária.

A medida é totalmente inconstitucional e visa unicamente "lavar" títulos ilegítimos de terra (como se lava dinheiro do narcotráfico) para que seus detentores - os grileiros - possam transferi-los aos mega agronegócios nacionais e estrangeiros. Esses honrados empresários não querem confusão com a Justiça quando forem montar as enormes fazendas de produção de soja, cana-de-açúcar para fabricação de etanol, carne e exploração madeireira naquela região.

Além de inconstitucional, a Medida Provisória representa um enorme prejuízo ecológico, pois já não há mais quem desconheça que a região amazônica é imprópria para o tipo de exploração que essas empresas irão implantar.

Infelizmente, o estado de anomia da sociedade brasileira é tamanho que uma monstruosidade destas passa no Congresso sem maiores manifestações dos diversos setores sociais.

Se nem a entrega de terras que a Constituição destinou à reforma agrária nem o comprometimento do equilíbrio ecológico de uma região sabidamente vulnerável conseguem tirar a opinião pública do estado letárgico em que se encontra, não há muita esperança de que a consideração do risco à soberania nacional sobre aquela região consiga provocar alguma reação.

De qualquer forma, contudo, é preciso deixar registrado aqui: a Medida Provisória, agora convertida em lei, se não for fulminada pela Justiça, marcará o início de um novo período na história do país – uma mudança de qualidade no histórico de "entreguismo" da burguesia brasileira. Até hoje essa burguesia desfibrada entregou ao capital estrangeiro a propriedade da indústria, das finanças, do comércio e dos serviços. Mas ainda não havia cedido a propriedade da terra, porque o domínio da terra é a condição primeira da soberania.

Não é preciso lembrar o Acre para saber o que acontece quando um país deixa que a maioria das terras de uma região caia em mãos de estrangeiros. Na década de setenta, os militares, preocupados com a compra de terras por estrangeiros na Amazônia, fizeram editar uma lei que punha limites nessas transações.

A conjuntura que estamos vivendo é a mais adversa que a Nação brasileira já enfrentou, de modo que toda reação parece inútil. Mas que ninguém se iluda: a história cobrará desta geração a entrega da Amazônia ao capital estrangeiro.

Quem não quiser que seus descendentes carreguem essa vergonha, precisa se manifestar agora.


*05-Jun-2009
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