quinta-feira, 31 de janeiro de 2013

STJ nega anistia de multas anteriores ao Novo Código Florestal

Mesmo com a entrada em vigor do novo Código Florestal (Lei 12.651/12), os autos de infração emitidos com base no antigo código, de 1965, continuam plenamente válidos. Esse é o entendimento unânime da Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ).

A Turma rejeitou petição de um proprietário rural que queria anular auto de infração ambiental que recebeu e a multa de R$ 1,5 mil, decorrentes da ocupação e exploração irregulares, anteriores a julho de 2008, de Área de Preservação Permanente (APP) nas margens do rio Santo Antônio, no Paraná.

Na petição, o proprietário argumentou que o novo Código Florestal o isentou da punição aplicada pelo Ibama, pois seu ato não representaria mais ilícito algum, de forma que estaria isento das penalidades impostas. Segundo sua tese, a Lei 12.651 teria promovido a anistia universal e incondicionada dos infratores do Código Florestal de 1965.

O relator do caso, ministro Herman Benjamin, afirmou que no novo código não se encontra a alegada anistia universal e incondicionada. Apontou que, ao contrário do que alega a defesa do proprietário rural, o artigo 59 da nova lei “mostra-se claríssimo no sentido de que a recuperação do meio ambiente degradado nas chamadas áreas rurais consolidadas continua de rigor”.

Suspensão das penalidades

Herman Benjamin, renomado especialista em direito ambiental, ressaltou que para ocorrer a isenção da punição, é preciso um procedimento administrativo no âmbito do Programa de Regularização Ambiental (PRA), após a inscrição do imóvel no Cadastro Ambiental Rural, com a assinatura de Termo de Compromisso (TC), que vale como título extrajudicial.

A partir daí, as sanções são suspensas. Havendo cumprimento integral das obrigações previstas no PRA ou no TC, apenas as multas serão convertidas em serviços de preservação, melhoria e qualidade do meio ambiente.

“Vale dizer, a regra geral é que os autos de infração lavrados continuam plenamente válidos, intangíveis e blindados, como ato jurídico perfeito que são – apenas sua exigibilidade monetária fica suspensa na esfera administrativa, no aguardo do cumprimento integral das obrigações estabelecidas no PRA ou no TC”, explicou o ministro.

Para fundamentar sua interpretação, Benjamin afirmou que, “se os autos de infração e multas tivessem sido invalidados pelo novo código ou houvesse sido decretada anistia ampla ou irrestrita das violações que lhes deram origem, evidenciaria contradição e ofensa à lógica jurídica a mesma lei referir-se a ‘suspensão’ e ‘conversão’ daquilo que não mais existiria”.

Regularização ambiental

Herman Benjamin destacou que, conforme o novo código, a regularização ambiental deve ocorrer na esfera administrativa. Para ele, é inconveniente e despropositado pretender que o Poder Judiciário substitua a autoridade ambiental e passe a verificar, em cada processo, ao longo de anos, a plena recuperação dos ecossistemas degradados e o cumprimento das obrigações instituídas no PRA ou TC.

No caso julgado, não há nem mesmo comprovação de que o proprietário rural tenha aderido aos programas, condição indispensável para ter direito aos benefícios previstos na lei.

Conflito intertemporal de leis
O tema do conflito intemporal de normas urbanística-ambientais já foi tratado pela Segunda Turma, conforme lembrou Herman Benjamin. A conclusão é a de ser inviável a aplicação de norma mais recente com a finalidade de validar ato praticado na vigência de legislação anterior que, expressamente, contrariou a lei então em vigor.

Desta forma, a matéria em discussão deve ser tratada nos termos propostos desde o início do processo, com fundamento na legislação então vigente, e não de acordo com alteração superveniente.

O ministro reconhece que não há “solução hermenêutica mágica” que esclareça, de imediato e globalmente, todos os casos de conflito intertemporal entre o atual e o novo Código Florestal.

Contudo, ele estabeleceu um esquema básico, de acordo com as normas gerais do direito brasileiro. O novo código não pode retroagir para atingir o ato jurídico perfeito, direitos ambientais adquiridos e a coisa julgada. Também não pode reduzir, de tal modo e sem as necessárias compensações ambientais, o patamar de proteção de ecossistemas frágeis ou espécies ameaçadas de extinção.

Reconsideração
Antes de analisar o mérito, Benjamin constatou que a petição apresentada tinha nítido caráter de pedido de reconsideração de acórdão da Segunda Turma. Nesse ponto, a jurisprudência do STJ estabelece ser manifestamente incabível pedido de reconsideração de decisão proferida por órgão colegiado.

No julgamento anterior, a Turma  negou recurso especial em que o proprietário rural pretendia anular o auto de infração ambiental e o pagamento de indenização pelo reflorestamento da APP que havia em sua propriedade. 

quarta-feira, 30 de janeiro de 2013

Para José Dirceu, Kátia Abreu é um exemplo de luta política


A senadora e presidente da Confederação Nacional da Agricultura, Kátia Abreu, dedicou a sua coluna no jornal Folha de São Paulo para de se defender de um artigo publicado dias antes no mesmo jornal pelo bispo emérito de Goiás, Dom Tomás Balduíno (Veja detalhes AQUI).

Um dia depois, a ruralista apareceu novamente no sítio do jornal com um artigo em que se dedica à criticar à Procuradoria Geral da República pela Ação Direta de Inconstitucionalidade protocolada junto ao Supremo Tribunal Federal contra vários artigos do novo Código Florestal (Veja essa notícia AQUI)

Trazendo o batido e contraditório discurso da “insegurança jurídica”, a presidente da CNA ganhou um texto-elogio de ninguém menos do que o ex-ministro, ex-presidente do Partido dos Trabalhadores e condenado pelo escândalo do mensalão, José Dirceu em seu blog.

“Independentemente de concordarmos ou não com o mérito da questão, o artigo da senadora Kátia Abreu (PSD-TO) publicado na Folha de S.Paulo no sábado é um exemplo para o PT e a base de apoio do governo federal. Um exemplo porque expressa a necessidade do debate e do contraditório em relação ao papel do Ministério Público Federal”, afirma Dirceu.

Em outro trecho, depois de longas citações do artigo da senadora aliada, o petista deixa claro que entre Kátia Abreu e o Ministério Público Federal, prefere a primeira: “Vejam que a senadora Kátia Abreu enfrentou a ação do Ministério Público de forma direta e objetiva – novamente, independentemente se concordamos ou não com o mérito da questão. Muitas vezes, é isso que falta à base de apoio do governo, começando pelas bancadas do PT, com excelentes exceções.”

Dirceu não chega a mencionar o artigo de Kátia Abreu em resposta a Dom Tomás Balduíno, mas talvez o fato da ruralista conseguir emplacar suas visões quase que diariamente num dos principais jornalões do país contribua para o ex-ministro aponta-la como um “exemplo para o PT e a base de apoio do governo federal”.

No texto do ex-presidente do PT, ainda coube alguns parágrafos para atacar novamente o MPF, desta vez por também na semana passada a Procuradoria Geral da República encaminhou denúncia crime contra o Senador Renan Calheiros (PMDB-AL), candidato do governo à Presidência do Senado.

Leia a íntegra do texto de ser José Dirceu: Artigo de senadora é exemplo para a base aliada do governo

Justiça suspende reintegração de posse do assentamento Milton Santos


Decisão ocorreu com base em recurso impetrado pelo INSS em conjunto com o Incra; medida não encerra o caso, mas evita despejo do assentamento que poderia acontecer logo

Por Guilherme Zocchio*

O Tribunal Regional Federal da 3ª região (TRF-3) determinou, na noite desta terça-feira (29), a suspensão da reintegração da área onde está o assentamento Milton Santos, entre as cidades de Americana e Cosmópolis, no interior de São Paulo. A decisão da Justiça ocorreu com base em recurso suspensivo impetrado pelo Instituto Nacional de Seguridade Social (INSS) em conjunto com o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra).

Wellington Diniz, superintendente do Incra em São Paulo, confirmou que a reintegração de posse foi suspensa. “Nossos procuradores entraram junto com o INSS com uma medida cautelar pedindo a suspensão”, disse por telefone à Repórter Brasil.
Segundo ele, no entanto, o imbróglio jurídico envolvendo o assentamento Milton Santos ainda não está encerrado. “Uma vez suspensa a liminar, há agora uma batalha do INSS junto com o Incra, que vai, sobretudo, provar que a área é do INSS e derrubar de vez essa decisão judicial. O INSS reivindica parte do processo, dizendo que o terreno é deles e que não há motivo para contestar”, aponta.
No final do ano passado, o TRF-3 havia concedido a reintegração de posse da área em favor da Usina Ester S/A, que mantinha um contrato de arrendamento com o grupo Abdalla na mesma área onde vivem, há 7 anos, 68 famílias assentadas pela reforma agrária.
O prazo para os agricultores do assentamento deixarem a área se encerrava na quarta-feira (30), dia a partir do qual a Polícia Militar poderia realizar uma remoção à força dos ocupantes do local. O Projeto de Desenvolvimento Sustentável (PDS) Comuna da Terra Milton Santos, nome oficial do assentamento, é considerado modelo em agroecologia e um dos mais produtivos do Estado de São Paulo.
Para pedir a reintegração de posse, o grupo Abdalla alegava ser proprietário da área.  A usina Ester aparece como parte no processo em função do contrato de arrendamento que mantém com os Abdalla. No recurso, o INSS alega, porém, que havia adquirido o terreno, nos anos 1970, para que o grupo empresarial saldasse dívidas previdenciárias com o Instituto. Em 2005, o órgão transferiu as terras ao INCRA, que as destinou para a reforma agrária, com a criação do PDS Milton Santos.
*Fonte: Repórter Brasil

Leia também:  A luta em defesa do Milton Santos texto de Frederico Daia Firmiano no sítio do jornal Brasil de Fato. 

MPF abre inquérito para apurar parecer do Incra que atestou como produtiva área da Camargo Corrêa


Conforme denúncia, dois técnicos fiscalizaram 67 mil hectares em dois dias, o que segundo o Sintraf é um prazo irreal

O Ministério Público Federal abriu inquérito para apurar suspeita de irregularidades em parecer do Incra que atestou como produtiva uma área do grupo Camargo Corrêa em Nortelândia (254 quilômetros de Cuiabá).
Com 67 mil hectares, as terras pertencentes à Arrossensal Agropecuária e Industrial S/A ocupam praticamente metade do município e são requisitadas para a reforma agrária por 1.688 famílias da região.
Segundo denúncia do Sintraf (Sindicato dos Trabalhadores na Agricultura Familiar de Nortelândia), a vistoria realizada por dois servidores do órgão foi uma fraude destinada a impedir a desapropriação.
“Fraudaram o laudo para tirar o sonho de centenas de famílias da região”, disse Josafá Santos da Rocha, coordenador-geral do sindicato.
Rocha afirma que o relatório da vistoria na área acrescentou 32 mil bois ao rebanho da propriedade, mencionou dados sobre cobertura vegetal que não correspondem ao CAR (Cadastro Ambiental Rural) e foi concluído em um prazo irreal.
“Dois servidores concluíram em sete dias um levantamento de 67 mil hectares? Isso não existe. Aquele era um trabalho para durar até seis meses”, disse o coordenador.
O parecer, assinado pelos servidores Carlos Eduardo Barbieri e Juscelino Antônio Tomas, resultou no arquivamento do pedido de criação de um assentamento rural nas terras da Camargo Corrêa.
O Sintraf protocolou, então, denúncia na Ouvidoria Agrária Regional do Incra, que, segundo a Procuradoria, produziu um relatório de apuração “ratificando todas as irregularidades” apontadas pelo sindicato.
Em despacho assinado no dia 24 de janeiro, a procuradora da República Vanessa Scarmagnani determinou a abertura de inquérito e encaminhou ofício à Controladoria Geral da União em Mato Grosso, pedindo que seja feita uma perícia no relatório de vistoria.
A procuradoria pretende, ainda, investigar o crime de “desobediência de cumprimento de requisição por parte do MPF”, em razão da ausência de resposta a cinco ofícios com pedidos de informação encaminhados às representações do Incra em Mato Grosso e em Brasília.
“Até o presente momento, tanto o Superintendente Regional do Incra quanto o próprio presidente do Incra não apresentaram informações (…) não obstante tenham sido notificados”, apontou.
O DIÁRIO procurou a assessoria de imprensa do Incra, que disse que o órgão só irá se manifestar após tomar conhecimento do relatório da Ouvidoria Agrária.
Procurada pela reportagem, a assessoria da Camargo Corrêa não respondeu até a conclusão desta edição.
Fonte: Diário de Cuiabá

Atualizando a notícia (31/janeiro): Incra nega irregularidade 

A Superintendência do INCRA em Mato Grosso negou irregularidades na perícia que afirmou ser produtiva uma área de 67 mil hectares pertencente ao grupo Camargo Corrêa em Nortelândia (254 quilômetros de Cuiabá). 

Em nota à imprensa, o órgão contestou as denúncias do Sintraf que motivaram a abertura de inquérito pelo Ministério Público Federal. Além das afirmações da entidade, a abertura do inquérito levou em conta um relatório de apuração produzido pela Ouvidoria Agrária Regional do próprio INCRA, que, segundo a Procuradoria, ratificou "todas as irregularidades”. 

Segundo o INCRA, a perícia nas terras da Arrossensal Agropecuária e Industrial S/A levou em conta a "legislação em vigor e documentos comprobatórios fornecidos por outros órgãos públicos." 

Na nota, o INCRA afirma ainda que os trabalhos de vistoria levaram 16 dias e foram conduzidos por uma equipe de quatro servidores (dois engenheiros agrônomos, um topógrafo e um motorista). 

"Quanto às questões ambientais, o laudo baseou-se em informações da Secretaria de Estado do Meio Ambiente de Mato Grosso, tais como processo de Licenciamento Ambiental (LAU e CAR) do imóvel, que foram conferidas com imagens de satélite do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais", disse, em um trecho. 

O órgão negou que a perícia mencione o número de 32 mil cabeças de gado que, segundo o Sintraf, teria sido adicionado ao rebanho real da propriedade. "O imóvel possuía no período analisado 12.201 animais entre bovinos, equinos, asininos e ovinos, bem diferente dos 32 mil citados na reportagem." 

Ainda segundo a nota, o trabalho foi chancelado pela Divisão de Ordenamento da Estrutura Fundiária, que classificou a área como "Grande Propriedade Produtiva, apresentando grau de utilização da terra superior a 80% e grau de eficiência na exploração superior a 100%". 

O INCRA disse ainda "lamentar" a divulgação do nome dos servidores Carlos Eduardo Barbieri e Juscelino Antônio Tomas, que assinam a vistoria. "Trata-se de ação inicial do MPF, o que torna temerária e leviana a exposição dos mesmos quando não há decisão de mérito sobre a questão." 

terça-feira, 29 de janeiro de 2013

Governo discute a criação de um Instituto de Gestão de Terras

A criação de um “Instituto de Gestão de Terras” foi tema de uma reunião entre o Secretário-Executivo Adjunto da Casa Civil e os Ministérios da Fazenda, do Planejamento e do Desenvolvimento Agrária e do Incra.

O assunto estava na agenda da Casa Civil que registrava uma reunião para discutir esse assunto nesta terça-feira, 29 de janeiro. 

O esvaziamento ou extinção Incra é negada por membros do governo Dilma, mas parece que na prática, caminha-se para isto.

Atualizando a notícia: na noite de 29 de janeiro, após o fim do expediente, a Casa Civil alterou a Agenda do Dia e a reunião acima descrita sumiu da pauta, enquanto os demais eventos e até as reuniões que não ocorreram eram mantidas na pauta, identificadas com riscos sobre o texto.

Gilson Bitterncourt: apetem os cintos, a agenda sumiu!
Mais cedo, havia encaminhado para a Casa Civil, por correio eletrônico, o seguinte pedido:

Com os cumprimentos, venho com base na Lei de Acesso à Informação requisitar cópia na íntegra e em formato digital da memória da reunião ocorrida em 29 de janeiro de 2013 entre o Secretário Executivo Adjunto desta Casa Civil, Sr. Gilson Bitterncourt, e representantes dos Ministérios da Fazenda; Planejamento, Orçamento e Gestão; do Desenvolvimento Agrário e do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária, conforme consta na Agenda disponibilizada no sítio http://www.casacivil.gov.br/ministro/agenda-da-ministra/2013/01/29-de-janeiro-de-2013 e que tratou do “Instituto de Gestão de Terras”.

Solicito ainda a cópia integral em meio digital de todos os documentos públicos e sem restrições de sigilo apresentados na reunião.

O envio de tais documentos pode ser direcionado para meu correio eletrônico:candinho1979@yahoo.com.br

Atenciosamente,
Cândido Neto da Cunha
Eng. Agrônomo/ Incra-SR30

segunda-feira, 28 de janeiro de 2013

Para MST, Kátia Abreu não está com Dilma e sim com Serra

Depois de negar participação e até condenar a “invasão” do Instituto Lula por assentados ameaçados de despejo, o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra parece que resolver aumentar a blindagem ao governo federal.

Na semana passada, enquanto ainda se desenrolava a ocupação do Instituto Lula e do prédio do Incra em São Paulo por assentados e apoiadores do assentamento Milton Santos, o sítio da Ong Repórter Brasil publicava uma interessante matéria que detalhava os interesses da Usina Ester, os também donos da EPTV (afiliada da Rede Globo em Campinas), na expulsão das famílias do assentamento.

A matéria originalmente tem como título Donos da EPTV controlam usina que tenta despejar assentamento Milton Santos e focou-se neste assunto. Ao final, noticiava a ocupação dos prédios do Incra e do Instituto, sem entrar em detalhes sobre a posição do MST para cada caso.


Mas na página do MST, a mesma matéria recebeu outro título: Agronegócio e mídia burguesa, os inimigos do assentamento Milton Santos. O título buscava associar a matéria à nota e às declarações do assessor de comunicação do MST, Igor Felipe, que afirmavam que o movimento era contra a ocupação do Instituto Lula. Na nota, o MST afirma que pressionava o governo federal e acompanhava a movimentação do Incra em relação ao assentamento Milton Santos, mas que o movimento “(...) têm como orientação geral denunciar os verdadeiros inimigos da reforma agrária, como o agronegócio, o latifúndio, o Poder Judiciário e a imprensa burguesa e pressionar os órgãos de Estado para que façam a Reforma Agrária.”

A ocupação do Instituto Lula seria um ato “inócuo” e “ineficaz”, conforme ainda as palavras do porta-voz do MST, Igor Felipe, já que ele Lula não era mais presidente.

Já neste início de semana, a blindagem do governo ganhou tons surreais.

Nesta segunda (28/01), repercutindo um artigo de Dom Tomás Balduíno publicado na Folha de São Paulo (republicado AQUI) - curiosamente publicado no mesmo dia em que o MST condenava a “invasão” do Instituto Lula - o sítio do movimento trouxe uma foto de Kátia Abreu ao lado de José Serra, que em nenhum momento é citado nem no artigo do bispo, nem na própria matéria feita pelo MST. Apesar de Serra não ter sido em nenhum momento envolvido nas denúncias contra Kátia Abreu e sua família, e também não ser (merecidamente) o Presidente da República, sua foto com Kátia Abreu ilustra a matéria e é destaque na página principal do movimento. 


Em seu artigo, o bispo emérito de Goiás retoma as denúncias de como a senadora e sua família e foram beneficiados com um esquema de grilagem e expulsão de camponeses de suas terras no município de Campos Lindos, no Tocantins; Tal denúncia, já havia sido feita pela revista Carta Capital em 2009, quando Kátia Abreu ainda era do DEM e foi reproduzida hoje pelo MST junto com a matéria sobre o artigo de Dom Tomás. Veja AQUI.

O artigo de Dom Tomás, “Apreensão no campo” teve forte repercussão devido à força que a senadora e presidente da Confederação Nacional da Agricultura adquiriu junto ao governo Dilma, ao ponto de, sob ordens da presidente petista, a presidente ruralista passar a negociar diretamente com ministérios pautas que vão da liberação da criação tambaqui na bacia do rio Tocantins, passando pela homologação de terras indígenas, marcos legais para fiscalização da terra, até a aceleração na entrara de lotes de assentamentos de reforma agrária no mercado de terras.

O flerte de Kátia Abreu com o governo é tão grande que a ruralista é cotada para assumir um ministério no governo Dilma, assim que for oficializada a entrada de seu “novo” partido, o PDS, no governo.


Dom Tomás, em seu artigo, conclui: “(...) as lideranças camponesas e indígenas estão muito apreensivas com o estranho poder econômico, político, classista, concentracionista e cruel detido por essa mulher que, segundo dizem, está para ser ministra de Dilma Rousseff. E se perguntam: "Não é isso o Poder do Mal?"

A aproximação de Dilma e Kátia Abreu também pode ser medida pela quantidade de fotografias pela internet em que ambas aparecem juntas. As presidentes (da República e dos ruralistas) constantemente aparecem em audiências e eventos públicos nos últimos meses. Com certeza, não foi a falta de fotografias da petista com a dama do agronegócio que fez com que o MST publicasse em seu sítio uma foto de Kátia Abreu com José Serra e de Dom Tomás Balduíno com Dilma. O MST parece adotar a distorção de uma realidade tão dura, que fez o bispo de Goiás pedir orações para a ruralista.

Indignada por aquilo que considera “(...)um texto rancoroso e eivado de fúria acusatória e caluniosa”, Kátia Abreu respondeu Dom Tomás Balduíno no dia 25 de janeiro, em sua coluna semanal na Folha, com texto intitulado "Não darás falso testemunho”.

“Como católica praticante, jamais imaginei um dia polemizar com um representante da mais alta hierarquia da fé que professo. Mas a fé que professo não parece ser a mesma que a dele. As palavras que me dirigiu não foram de um cristão”, afirma a “religiosa” no artigo em que contesta as acusações do bispo.

Santa Maria: o drama e o espetáculo da mídia...



sábado, 26 de janeiro de 2013

Coordenador de ocupação do MST na Usina Cambahyba é assassinado no Rio


O trabalhador rural e militante do MST Cícero Guedes foi assassinado por pistoleiros nesta sexta-feira (25/1), nas proximidades da Usina Cambahyba, no município de Campos dos Goytacazes (RJ).

Cícero foi baleado quando saía do assentamento de bicicleta. Nascido em Alagoas, ele foi cortador de cana e coordenava a ocupação do MST na usina, que é um complexo de sete fazendas que totaliza 3.500 hectares.

Esse latifúndio foi considerado improdutivo, segundo decisão do juiz federal Dario Ribeiro Machado Júnior, divulgada em junho. A área pertencia ao já falecido Heli Ribeiro Gomes, ex-vice governador biônico do Rio, e agora é controlada por seus herdeiros.

Cícero Guedes era assentado desde 2002 no Sítio Brava Gente, no norte do Rio de Janeiro, no assentamento Zumbi dos Palmares, mas continuou a luta pela Reforma Agrária. Era uma referência na construção do conhecimento agroecológico tanto entre os companheiros de Movimento como também entre estudantes e professores da Universidade do Norte Fluminense.

No lote, ele desenvolvia técnicas da agroecologia, com uma diversidade de plantas , respeitando a natureza e aproveitando de tudo que ela poderia dar. Começou com o plantio de sua cerca viva de sabiá, que viu sua propriedade melhorar visualmente e também obter uma boa fonte de renda.

Cícero também era conhecido pelas suas bananas, presentes em muitas partes do lote, consorciadas com leguminosas, milho e espécies frutíferas.Os filhos cresceram vendo a experiência se desenvolver e aprenderam com o pai que os alimentos produzidos na agroecologia  têm  qualidade superior aos do supermercado.

O agricultor assentado Cícero Guedes dos Santos, desde o inicio da ocupação do seu lote em 2002, já possuía o desejo de ter em sua área diversidade de plantas , respeitando a natureza e aproveitando de tudo que ela poderia dar. A natureza , inclusive, foi a fonte de inspiração para esse tipo de consciência e o entendimento da mesma fez com que esse sentimento de preservação e convívio fosse dia-a-dia aumentando.

Cícero Guedes, experiência em seu lote virou
destaque na região. 
Violência do latifúndio
O complexo de fazendas tem sido palco de todo tipo de violência: exploração de trabalho infantil, exploração de mão de obra escrava, falta de pagamento de indenizações trabalhistas, além de crimes ambientais.

Em dezembro, o Incra fez o compromisso de criar um assentamento na área da usina, mas até agora não avancou no sentido de assentar as famílias.

A morte da companheiro Cícero é resultado da violência do latifúndio, da impunidade das mortes dos Sem Terra e da lentidão do Incra para assentar as famílias e fazer a Reforma Agrária. O MST exige que os culpados sejam julgados, condenados e presos.

As fazendas da Usina Cambahyba acumulam dívidas de milhões com a União e seu processo de desapropriação está paralisado há 14 anos — desde que o Incra (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária) considerou aquelas terras improdutivas e passíveis de desapropriação para fins de reforma agrária.

Porém, a dívida da usina não se limita ao aspecto financeiro. No último mês de maio, os brasileiros ficaram estarrecidos com a revelação de que os fornos de Cambahyba foram usados para incinerar corpos de 10 militantes políticos durante a ditadura civil-militar brasileira. A confissão do ex-delegado do Departamento de Ordem Política e Social (Dops), Cláudio Guerra, consta no livro “Memórias da uma guerra suja” e foi divulgada por toda a imprensa.

Até hoje, porém, a Justiça Federal impede a desapropriação da área e já determinou despejos violentos de famílias que reivindicam a terra. Essa é a segunda vez que o MST realiza uma ocupação na área da usina.

A primeira foi em 2000, e seis anos depois, as Polícias Federal e Militar, por decisão da Justiça Federal de Campos, despejaram as 100 famílias que haviam criado o acampamento Oziel Alves II.

Fonte: MST

sexta-feira, 25 de janeiro de 2013

Frases

O Assentamento Milton Santos está no olho do furacão e tem nas mãos a tarefa de defender a Reforma Agrária mais autêntica, a Reforma Agrária constituída na luta, a Reforma Agrária que assume cada vez mais a forma de enfrentamento contra o grande capital. 

Penso que, por tudo isso, seja absolutamente urgente e necessária uma tomada de posição muito clara do MST em relação ao governo Dilma e à inteira forma lulista de tentar conciliar o inconciliável, de menosprezar a contradição social que emana dos interesses do agronegócio e da Reforma Agrária, que emana da luta de classes”, trecho da entrevista da socióloga Maria Orlando Pinasse concedida ao Correio da Cidadania em 17 de janeiro de 2013.

"Não queremos julgar essa atitude de invasão do Instituto Lula, mas a consideramos inócua, ineficaz. Lula não está no poder, não é mais presidente. O problema não está com ele, nem ele pode resolvê-lo", afirmou o assessor de comunicação do MST, Igor Felippe, ao Sítio Brasil 247 em 24 de janeiro em matéria em que se busca desqualificar os assentados do projeto Milton Santos que ocupavam o Instituto Lula. Na era governista, o MST não julga, mas não apoia e condena os "invasores" do Instituto do aliado Lula, contra os assentados ameaçados de despejo do assentamento Milton Santos.


"Relatei o movimento e ele [Lula] ficou chateado porque o pessoal invadiu e ele teve de mudar a agenda, mas faz parte", disse diretor-presidente do Instituto Lula, Paulo Okamotto, referindo-se aos mesmos "invasores" citados pelo assessor do MST. A notícia repercutiu na grande imprensa.

"Se vira moda todo mundo ocupar coisa por coisa nós estamos lascados”, Paulo Okomotto, ainda sobre o mesmo assunto, mas agora usando o termo "ocupar" em vídeo que pode ser visto AQUI.

Sérgio Sauer: "Mudanças não podem justificar paralisia da reforma agrária”


Para o professor Sergio Sauer, do Programa de Pós Graduação em Meio Ambiente e Desenvolvimento Rural da Universidade de Brasília (UnB) “não há novidade” na proposta de mudar o Incra. “Sempre que se têm resultados ruins, se fala em mudança”

Pedro Rafael*

Em meio as críticas após mais um pífio resultado na incorporação de novas áreas de reforma agrária pelo governo Dilma – em dois anos, foram 86 desapropriações de terras, desempenho que supera apenas o período Collor – o Incra sinaliza mudanças da política agrária na tentativa de melhorar a atuação do órgão.

Reportagem do Brasil de Fato já havia detalhado a reorientação do governo Dilma no setor, que inclui a descentralização das ações de construção de moradias e de infraestrutura básica dos assentamentos para outros ministérios. O presidente da autarquia, Carlos Guedes, afirma que a meta é recuperar o prestígio do Incra, desfazendo principalmente a fama de má gestão.

Para o professor Sergio Sauer, do Programa de Pós Graduação em Meio Ambiente e Desenvolvimento Rural da Universidade de Brasília (UnB) e relator do Direito Humano a Terra, Território e Alimentação (Plataforma DhESCA Brasil), “não há novidade” na proposta de mudar o Incra. “Sempre que se têm resultados ruins, se fala em mudança”, aponta. A questão não é quem vai fazer, mas se será feito, avalia o professor.

“Essas pretensas atualizações não podem servir como justificativas para a imobilidade governamental. Não há qualquer sombra de dúvidas que a reforma agrária, como uma política estruturante, traz temas como o desafio da sustentabilidade ambiental e dos direitos à alimentação adequada, não só no campo, mas do conjunto da população”, situa. Mesmo assim, Sauer desconfia do empenho do governo em ver a questão sob essa perspectiva. “Toda a temática agrária não é prioridade para o mandato Dilma”. A seguir, confira a entrevista de Sergio Sauer ao Brasil de Fato.

Brasil de Fato – Qual a sua impressão sobre a mudanças que estão em curso no Incra?
Sergio Sauer – A troca na presidência do Incra gerou mudanças nas pessoas que ocupavam alguns cargos, tanto no próprio Instituto como no MDA [*no início de 2012, o deputado Pepe Vargas, do PT-RS assumiu o Ministério do Desenvolvimento Agrário e, meses mais tarde, o economista e servidor Carlos Guedes foi indicado para a presidência do instituto agrário*]. No entanto, de uma maneira geral, não houve uma mudança significativa, nem em termos políticos, nem em termos de direção. Por outro lado, é historicamente comum quando há baixa execução das ações estratégicas do órgão, a formulação de discurso enfatizando a necessidade de mudanças administrativas. A proposta de descentralização das ações do Incra não é nenhuma novidade, pois já apareceu na administração FHC e foi veementemente criticada pelos movimentos sociais do campo.
As críticas são aconteceram porque há uma defesa da centralização, mas porque, primeiro, geralmente, essas mudanças administrativas dispendem muita energia e os resultados são pífios. Em segundo lugar, as propostas de descentralização são feitas em uma lógica ideal, ou seja, o Incra deve “deixar de ser provedor” como se qualquer outro Ministério ou órgão público estivesse pronto e disposto a assumir tais tarefas e ações nessa área, o que não é, nem de longe, uma realidade. Mais perigoso do que a perda de autonomia, as ações e políticas simplesmente não serão executadas, diminuindo ainda mais o ritmo na implementação das já poucas ações de acesso à terra e consolidação do setor familiar camponês.

Segundo o presidente do Incra, essas mudanças se inserem na ideia de que é preciso “atualizar” a reforma agrária e que as zonas de maior concentração fundiária já não coincidem com os acampamentos onde estão a maior parte das famílias sem-terra que aguardam para serem incluídas no programa. Em que medida isso deveria alterar a política?
Novamente, é surpreendente o discurso de “reformar a reforma agrária”, pois essa expressão (e outras correlatas como essa do atual presidente do Incra) estava em um dos primeiros pronunciamentos do então recém eleito Fernando Henrique Cardoso, em 1995. O Brasil é historicamente marcado por uma profunda concentração da propriedade e do acesso à terra. Essa leitura de que apenas algumas regiões possuem essa concentração não é só um equívoco, como um mecanismo de justificação de ações pontuais, que em nada alteram a atual iniquidade no campo. Também é difícil de entender como um pretenso descompasso entre o número de demandantes por terra – existência de um número maior sem terra – e níveis mais baixos de concentração possam justificar a total paralisia nas ações governamentais de desapropriação e assentamento de famílias.
Agora, assim como qualquer ação humana ou política, a luta pela terra suas causas e consequências – necessita de constantes releituras. No entanto, essas pretensas atualizações não podem servir como justificativas para a imobilidade governamental. Não há qualquer sombra de dúvidas que a reforma agrária, como uma política estruturante, traz temas como o desafio da sustentabilidade ambiental e dos direitos à alimentação adequada, não só no campo mas do conjunto da população. Estamos falando de um bem não renovável, a terra e o solo fértil, portanto, a reforma agrária continua sendo um tema atual.

O senhor acredita que houve mudança na política agrária do governo Lula para o governo Dilma?
Não houve uma mudança significativa das políticas agrárias em geral entre os dois governos. No entanto, as mudanças para pior, sem sombra de dúvidas, estão situadas na diminuição – se não na total paralisia – das ações de desapropriação e assentamento de famílias. Há sempre a necessidade de reconhecimento da melhoria na implementação de alguns programas, mas não há novidades, inclusive porque toda a temática agrária não é prioridade para o mandato Dilma.

A reforma agrária cabe no atual modelo de desenvolvimento econômico do Brasil para o setor agrícola?
Como disse, acredito que o tema é atual e urgente, pois qualquer olhar sobre a importância socioambiental da terra recoloca a questão agrária na pauta política nacional. No entanto, não acredito que seja possível pensar em qualquer avanço no contexto do atual modelo e momento do agronegócio exportador de commodities. O atual modelo é excludente e concentrador, portanto, tende sempre na direção absolutamente oposta a qualquer ação de democratização do acesso à terra. Isso sem falar na expansão do monopólio do setor agropecuário, com o crescente domínio das multinacionais que, ao monopolizar concentram os diferentes serviços do fornecimento de insumos à comercialização da produção. Isso, associado a uma corrida mundial por commodities, torna o tema mais candente e de difícil solução.

Existe uma avaliação que o eixo da luta de classes se deslocou, principalmente, para o mundo do trabalho, devido ao processo recente de crescimento econômico, aumento do emprego e diminuição da miséria. E que as políticas sociais do governo, como o Bolsa Família, entre outras, teria desmobilizado as ações no meio rural. O senhor concorda com essa análise?
Não tenho certeza! Não tenho uma análise precisa sobre as razões que explicariam as dificuldades de mobilização das populações do campo, mas elas não estão paralisadas (assim como não há grandes mobilizações dos setores urbanos). A presença de programas assistenciais certamente é parte das contradições desse momento histórico. Por outro lado, é preciso reconhecer que houve uma diminuição sensível das ocupações de terras, mas há várias outras frentes de lutas, envolvendo outros atores sociais do campo, a exemplo de quilombolas, povos indígenas, e muitas comunidades que resistem à expropriação de suas terras e recursos.

Há lugar para o desenvolvimento rural que tenha agricultura familiar e agronegócio “convivendo” simultaneamente?
A tese de um sistema bimodal de produção e ocupação do campo tem lugar e vários defensores, ou seja, é possível imaginar e defender uma realidade em que haveria “lugar para todos” no campo. No entanto, essa não é – e nunca foi – nossa realidade. Até podemos dizer que infelizmente nunca foi assim, inclusive há de se reconhecer que os enfrentamentos não são opção de alguns maniqueístas de plantão. Se há convivência também há muita disputa, inclusive disputas pela assistência do Estado e por recursos públicos. Os recentes processos de criminalização de lideranças e movimentos sociais salientam mais as disputas que a convivência, deixando claro que a questão não se resolve apenas com um acordo econômico-produtivo.
A questão da terra (que é conceitualmente diferente da questão agrária!) continua um tema atual, especialmente se olharmos essa terra como parte, por exemplo, da sustentabilidade social e ambiental. A terra, como um bem não renovável, adquire outra dimensão, portanto, não pode ser reduzida a uma noção ou a um problema econômico-produtivo. Não estou querendo vincular com a dimensão de identidade cultural – tão cara aos nossos povos indígenas e outras comunidades que dependem de seus territórios -, mas apenas enfatizar que existe uma dimensão e um desafio vinculado à função socioambiental da terra, o que é uma perspectiva nova e um desafio imenso!

*Fonte: Brasil de Fato

Incra precisa resgatar credibilidade, afirma presidente do órgão


Para desfazer a fama de desmatador da floresta amazônica, Carlos Guedes promete atuar permanentemente sobre dois mil assentamentos na região, num total de 190 mil famílias

Pedro Rafael*

Alvo preferencial de críticas que vão desde os ruralistas, meios de comunica­ção, assentados e até setores do próprio governo, cada qual com objetivos bem distintos, o Incra necessita enfrentar os pontos fracos e readquirir prestígio. Esta é a avaliação de Carlos Guedes, à frente da autarquia há pouco mais de seis meses.

“Existem três ideias gerais sobre o funcionamento do Incra. São críticas que se consolidaram historicamente na sociedade: a de que cria assentamen­tos que viram favelas rurais, a de que é o responsável pelo desmatamento na Amazônia e a de que presta um serviço de baixa qualidade. Assumi com o com­promisso de enfrentar essas situações, mas mantendo o papel central do ór­gão”, explicita.

Para desfazer a fama de desmatador da floresta amazônica, o Incra promete atuar permanentemente sobre dois mil assentamentos na região, num total de 190 mil famílias.

Desde dezembro, um boletim trimes­tral vai divulgar as ações que estão sen­do executadas, com dados Instituto Na­cional de Pesquisas Espaciais (Inpe), via Programa de Cálculo do Desflores­tamento da Amazônia (Prodes) e o Sis­tema de Detecção do Desmatamento em Tempo Real na Amazônia (Deter). Segundo Guedes, essas famílias estão sendo incluídas em programas do go­verno para blindar o desmatamento.

Na parte de serviços, a ênfase será a modernização dos instrumentos para certificação de imóveis rurais, medida que atende pequenos, médios e grandes proprietários de terra. Para os assenta­dos, a meta é ampliar a liberação da De­claração de Aptidão ao Pronaf (DAP), documento que habilita os agricultores para obter financiamento federal. Ain­da é grande o número de assentados que não dispõe desse certificado.

Desenvolvimento
Guedes contabiliza 50 mil famílias as­sentadas em situação de extrema po­breza em áreas de reforma agrária. Não é muito, se comparado ao total de um milhão de famílias que receberam ter­ra do governo pelo programa. “Não po­demos ter ninguém nessa condição, por isso vamos identificar e priorizar as po­líticas públicas em favor dessas famí­lias”, garante.

“Quando se vai a um assentamento, qual a reclamação principal? Falta de estrutura. Precisamos acelerar o pro­cesso de implantação dos assentamen­tos, que antes demoravam mais de 10 anos”, completa, ao justificar as mu­danças. Para o deputado Marcon (PT­-RS), no entanto, a descentralização das atividades é prejudicial.

“O Incra perde poder. A Caixa Econô­mica Federal, por exemplo, é quem vai definir quantas famílias assentadas, por ano, vão receber casa. Acharam uma válvula de escape. Nada contra as ou­tras políticas do governo, mas quem vai propor não é mais o Incra. Não será o Incra a conduzir o processo, mas outros ministérios. Essa mudança desfavorece o processo de reforma agrária no Bra­sil”, afirma. Para o deputado Valmir As­sunção (PT-BA), a descentralização do Incra remonta ao período do governo Fernando Henrique Cardoso. “O que estão fazendo é aquilo que o Jungmann [Raul Jungmann, ex-ministro da refor­ma agrária no governo do PSDB] quis fazer e não conseguiu”, cutuca.

Carlos Guedes tenta rebater os argu­mentos. “Não tem sentido afirmar que há riscos da extinção do Incra e deixar de aproveitar programas que são me­lhores do que os seus. O programa Luz para Todos demonstrou isso e implan­tou eletricidade com muito mais velo­cidade do que o Incra faria sozinho”, exemplifica.

Fonte: Brasil de Fato

Megainvestimento abre nova rota para soja

Por Gerson Freitas Jr.

Com a aproximação das obras de pavimentação da BR-163 de Itaituba (PA), empresas privadas começam a tirar do papel os planos para a criação de um novo sistema logístico, capaz de escoar até 20 milhões de toneladas de grãos de Mato Grosso pelos portos da Bacia Amazônica. Ao todo, os investimentos na construção de estações de transbordo, armazéns, terminais portuários, empurradores e embarcações devem consumir mais de R$ 3 bilhões até o fim da década.
O corredor abre uma nova rota para a exportação da soja e do milho colhidos no entorno dos municípios de Sinop, Sorriso, Nova Mutum e Lucas do Rio do Verde, cortados pela BR-163. Hoje, mais de 70% da safra mato-grossense é escoada pelos portos de Santos (SP) e Paranaguá (PR), a mais de 2 mil quilômetros da origem. Alguns caminhões vão ainda mais longe, até São Francisco do Sul (SC) e Rio Grande (RS).
Boa parte dos recursos privados deve ser investida no município paraense de Itaituba, especificamente no distrito de Miritituba, localizado à margem direita do Rio Tapajós e próximo ao entroncamento entre as rodovias BR-163 e BR-230, a cerca de 900 quilômetros desse cinturão agrícola. O objetivo é transformar o município em uma espécie de "hub", capaz de receber a produção do Médio-Norte de Mato Grosso e distribuí-la em comboios de barcaças para os portos exportadores de Santarém (PA), Vila Rica (PA) e Santana (AP). A expectativa é que os primeiros carregamentos de Mato Grosso passem por esse corredor a partir da safra 2014/15.
Pelo menos oito empresas já adquiram terrenos em Miritituba para a construção de estações de transbordo à margem do Tapajós, um rio naturalmente navegável para barcaças. Destas, ao menos quatro - as tradings americanas Bunge e Cargill e as operadoras logísticas Hidrovias do Brasil e Cianport - possuem projetos em estágio final de licenciamento ambiental e com obras a iniciar ainda em 2013.
Segundo o vice-presidente da Associação dos Terminais Privados do Rio Tapajós (ATAP), Geraldo Affonso, as quatro companhias devem investir, ao todo, R$ 600 milhões apenas em Miritituba e outros R$ 1,4 bilhão na construção dos comboios de barcaças e em aumento de capacidade em seus terminais nos portos exportadores. "Os investimentos já conhecidos somam R$ 2 bilhões, mas o valor será muito maior", afirma.
Composta por oito empresas, a ATAP foi criada em novembro do ano passado com o objetivo de representar os interesses das empresas com planos de investimento no novo sistema. Além das quatro empresas citadas, fazem parte da associação Brick Logística, Chibatão Navegações, Reicon e Unirios.
A Cargill, que há 10 anos opera um terminal graneleiro no Porto de Santarém (PA), é uma das maiores interessadas no projeto. Segundo o gerente de portos da companhia, Clythio Buggenhout, a múlti pretende investir cerca de R$ 200 milhões para receber a produção em Miritituba e transportá-la, pelo Tapajós, até o porto. Com isso, a empresa quer triplicar o volume de soja exportado por Santarém, das atuais 1,9 milhão de toneladas para 4 milhões por ano.
"Miritituba é um entreposto óbvio de interligação rodo-hidroviária, é um curinga. De lá podemos ir a qualquer porto grande da Região Norte. O projeto abre uma matriz de alternativas logísticas", afirma Buggenhout. "Estamos falando de investimentos totais de R$ 3 bilhões a R$ 4 bilhões nesse eixo".
O executivo afirma ainda que o investimento vai mitigar o "impacto socioambiental" que a chegada de milhares de caminhões carregados com soja teria sobre Santarém após a conclusão da BR-163 - cada comboio de barcaças pode transportar até 30 mil toneladas de grãos, substituindo mais de 800 caminhões. Hoje, a soja exportada do terminal da Cargill em Santarém é transportada de caminhão até Porto Velho (RO), de onde segue por barcaça até Santarém.
Comboios de barcaças que vão operar nos rios da bacia amazônica para os portos de Vila do Conde e Santana podem transportar até 30 mil toneladas de grãos, substituindo mais de 800 caminhões
A Bunge não comenta seus investimentos na região, mas o Valor apurou que a companhia deve aportar cerca de R$ 500 milhões na construção de uma estação de transbordo em Miritituba e de um terminal portuário no porto de Vila do Conde, no município paraense de Barcarena. Segundo as fontes ouvidas pelo jornal, a empresa pretende construir uma capacidade para movimentar até 5 milhões de toneladas pelo novo corredor. Só o investimento em barcaças para operar o trecho deve demandar outros R$ 300 milhões.
A Hidrovias do Brasil, empresa controlada pelo fundo P2 Brasil - criado pelos grupos Pátria Investimentos e Promon - teria planos de investir um montante semelhante ao da Bunge em seu eixo, também ligando Miritituba a Vila do Conde.
O presidente da Hidrovias do Brasil, Bruno Serapião, não confirma os valores, mas afirma que o sistema operado pela companhia terá capacidade para movimentar 4,4 milhões de toneladas de grãos. "Pretendemos iniciar a construção dos dois terminais [Miritituba e Vila do Conde] ainda no primeiro semestre e entrar em operação na safra 2015/16", afirma.
Segundo ele, a companhia deve escoar até 1,5 milhão de toneladas no primeiro ano de operação e atingir a capacidade total na temporada 2020/21. O executivo revela ainda que a companhia deve contratar a construção de pelo menos sete comboios de barcaças, com capacidade individual para transportar até 700 mil toneladas anuais.
Serapião afirma que a Hidrovias do Brasil vai construir e operar o sistema, mas não descarta a entrada de um sócio. "Há interesse de empresas no mercado em desenvolver parcerias e estamos estudando essa possibilidade".
Para ele, a entrada em operação do novo eixo logístico deverá resultar em uma "queda significativa" nos custos de frete, mas ainda é cedo para fazer projeções. "Trata-se de um sistema novo e ainda precisamos saber qual será a base tributária desses investimentos, o que é determinante para o cálculo do preço final".
Já a Cianport, uma joint venture entre as mato-grossenses Fiagril Participações e Agrosoja (ver matéria ao lado), prevê investir entre R$ 350 milhões e R$ 380 milhões na construção de estruturas de recebimento e embarque em Miritituba e no Porto de Santana, no Amapá. O objetivo é transportar até 3 milhões de toneladas pelo corredor. Na primeira fase, com implantação entre 2014 e 2018, a empresa deve movimentar 1,8 milhão de toneladas. A empresa captou um empréstimo de R$ 73 milhões do fundo da marinha mercante, operado pelo BNDES.
O secretário de Desenvolvimento do Pará, Sydney Rosa, diz que mais de 15 empresas podem se instalar em Miritituba nos próximos anos. "Precisamos garantir um processo ordenado, pois crescerão as demandas sociais na região", afirma.
*Fonte: Valor Econômico