domingo, 6 de dezembro de 2015

Operação investiga esquema de desmatamento ilegal e fraude em sistemas florestais


Grandes empresas exportadoras de madeira atuando no Pará são suspeitas de usar créditos florestais para “esquentar” madeira ilegal

Foi deflagrada hoje (4 de dezembro) uma operação do Ministério Público Federal, Polícia Federal, Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e Justiça Federal que investiga um esquema de desmatamento ilegal e fraude em sistemas florestais no qual estão envolvidas algumas das maiores empresas exportadoras de madeira do Pará. A operação envolve buscas e apreensões em 41 endereços ligados a cinco empresas no Pará, São Paulo e Curitiba. Duas pessoas tiveram prisões preventivas decretadas, outras 16 ficarão em prisão temporária e 10 serão conduzidas coercitivamente para prestar esclarecimentos. Também houve busca e apreensão na sede do Instituto de Terras do Pará (Iterpa), porque há suspeita da participação de uma servidora nas fraudes.

A operação faz parte de uma investigação sobre esquema que faz a chamada lavagem de madeira. Análises de dados dos sistemas florestais e escutas telefônicas forneceram provas importantes para os investigadores. Nesse tipo de esquema, a madeira retirada em desmatamentos ilegais na Amazônia entra nos sistemas de controle da comercialização de produtos florestais por meio de fraude em planos de manejo aprovados pelo poder público, geralmente em nome de laranjas. Comprada por grandes empresas exportadoras, a madeira derrubada ilegalmente é vendida com aparência de legalidade para compradores no exterior.

Cada plano de manejo aprovado pode comercializar quantidades determinadas de madeira, os chamados créditos florestais. Nos planos usados para esquentar madeira ilegal, os créditos são usados apenas para justificar a compra e a venda de madeira ilegal. No caso da operação Tabebuia (referência ao nome científico do ipê, tabebuia serratifolia) o esquema começou a ser desvendado quando o Ibama identificou uma grande concentração de ipê e maçaranduba, duas madeiras nobres, em quantidade acima de 50% em um plano de manejo aprovado. A concentração contraria os dados científicos sobre a dispersão dessas espécies na floresta amazônica.

A partir dessa discrepância, descobriu-se que 81% da madeira retirada do plano de manejo fraudulento tinha sido destinada à Jari Florestal S.A, uma das maiores empresas exportadoras de madeira do país. No total, a Jari, segundo os registros no sistema de controle, teria recebido dois carregamentos de madeira somando quase 9 mil metros cúbicos de um plano de manejo localizado há mais de 500 km de distância da sede da empresa. Para se ter uma ideia, essa quantidade de madeira teria que ser transportada por uma frota de mais de 220 caminhões.

Apesar do volume e da distância, a investigação mostrou que cada carregamento demorou, entre a entrada no sistema de controle e o registro da chegada, apenas dois dias para alcançar o destino. Como não há estrada entre Juruti, onde fica o plano de manejo fraudulento, e Almeirim, sede da Jari Florestal, a madeira teria que ter percorrido a distância em caminhões e depois balsas, o que seria impossível em dois dias. Com o avanço das investigações, a Polícia Federal descobriu que o mesmo tipo de operação com evidência de fraude ocorreu envolvendo a Jari e outros planos de manejo.

Só de um dos planos de manejo, foram movimentados mais de R$ 28 milhões em madeira ilegal entre dezembro de 2014 e fevereiro de 2015, devido ao alto valor comercial do ipê: um metro cúbico de madeira serrada pode alcançar o preço de R$ 3 mil dólares no mercado internacional. O ipê é considerado uma das madeiras mais resistentes, usada em deques e revestimentos para áreas externas e ate parques públicos em grandes cidades dos Estados Unidos.

A Jari Florestal também comprou créditos para comercializar ipê de outras sete empresas próximas da capital paraense, Belém. Em várias dessas compras, o sistema registrou tempos curtos demais para a chegada da madeira, sendo que distância entre Belém e Almeirim é de mais de 800 km. Em uma das movimentações, a madeira enviada pela Pampa Exportações (outra empresa investigada) atravessou o Pará em apenas 10 minutos.
Ao examinar os dados das transferências de madeira feitas para a Jari Celulose, a PF encontrou a localização, através do IP (Internet Protocol) dos computadores de onde foram feitos os registros nos sistemas florestais, todos com a senha do suposto dono do plano de manejo, Jovino Vilhena. As transações milionárias de madeira entre Almeirim e Juruti na verdade tinham sido feitas de um computador em uma empresa de informática na periferia de Belém.

Vilhena foi um dos alvos da operação hoje. Ele atua como despachante para várias empresas madeireiras e, segundo a investigação, não tem recursos financeiros para ser proprietário de terras e titular de um plano de manejo. Os mesmos IPs foram utilizados em várias outras operações suspeitas envolvendo as cinco empresas investigadas na operação Tabebuia: Jari Florestal, Pampa Exportações, KM Comércio e Exportação de Madeiras, Legno Trade Comércio, Importação e Exportação de Madeira e Irmãos Alvarenga Indústria e Comércio de Madeira. Todas são alvo de buscas e apreensões.

Fonte: Ministério Público Federal no Pará - Assessoria de Comunicação

Indígenas Gamela sofrem atentado em área ocupada no Maranhão


Ataque pode ser retaliação depois da retomada de duas fazendas pelos indígenas nos últimos dias

Na noite de ontem (2/12), entre 21h e 22h, uma Toyota Hilux preta parou na estrada próxima à área onde cerca de 100 indígenas Gamela estavam acampados, na zona rural do município de Viana, Maranhão, a 220 quilômetros de São Luís. O motorista acendeu os faróis altos em direção aos índios e um atirador efetuou disparos. Não se sabe quantas pessoas participaram do atentado. Depois do ataque, duas viaturas da polícia foram enviadas para o local, onde ficaram até cerca de 2h da manhã. Ninguém ficou ferido.

Testemunhas dizem que a Hilux preta continuou rondando o acampamento indígena na manhã de hoje (3/12). De acordo com informações do Conselho Indigenista Missionário (CIMI), os Gamela retomaram duas fazendas desde segunda-feira, motivados pela falta de providências da Fundação Nacional do Índio (Funai) para abrir o processo demarcatório da área. Segundo os indígenas, as fazendas ocupadas fazem parte do território tradicional da etnia e são fruto de grilagem.

Hoje à tarde, foi realizada uma reunião para discutir estratégias de proteção aos Gamela, além de pedir apoio ao governo estadual do Maranhão na tentativa de pressionar a Funai a agilizar o processo de demarcação e regularização do território indígena. Participaram da reunião representantes da Secretaria Estadual de Direitos Humanos e Participação Popular, da Secretaria Estadual do Meio Ambiente, da Funai, do Instituto de Colonização e Terras do Maranhão, além do delegado regional da Secretaria de Segurança Pública do Estado. Movimentos sociais foram representados pelo Cimi, pelo Movimento Interestadual das Quebradeiras de Coco Babaçu e pela Comissão Pastoral da Terra (CPT).

No sábado de manhã, está agendada uma visita à área ocupada pelos Gamela dos representantes das instituições que participaram da reunião.

Para saber mais, acesse a notícia sobre as retomadas das fazendas pelos Gamela no site do Cimi.


Fonte: ISA

Nota pública: Somos ameaçados, estamos morrendo



O Conselho Nacional da CPT, formado pela Direção Nacional e por representantes dos 21 regionais da CPT, reunido em Luziânia (GO) vem a público denunciar as graves situações de assassinatos e ameaças de morte, ocorridas no contexto de conflitos no campo.

Neste ano de 2015, registros parciais do Banco de Dados do Centro de Documentação Dom Tomás Balduino dão conta de 46 pessoas assassinadas e 79 ameaçadas até a presente data. O número de pessoas assassinadas é o maior desde 2004.

O grave desta situação é que as ameaças, registradas em Boletins de Ocorrência feitos nas delegacias de Polícia ou denúncias feitas à Ouvidoria Agrária Nacional, à Secretaria de Direitos Humanos ou a outros órgãos públicos, não encontram a merecida atenção e não são elucidadas. Com isso, os que ameaçam ficam impunes e as vítimas desprotegidas. A omissão do Estado é gritante. Poucas das vítimas são inseridas no Programa de Defensores dos Direitos Humanos, que tem se mostrado com sérias fragilidades nos acompanhamentos.

Das 79 pessoas que receberam ameaças em 2015, quatro foram executadas:

- A líder comunitária, Maria das Dores Salvador Priante, ‘Dora’, assassinada no dia 12 de agosto deste ano, em Iranduba, AM. Ela havia registrado dois Boletins de Ocorrência das ameaças que recebia. Também as havia denunciado à Assembleia Legislativa do Amazonas;

- Jesusmar Batista de Farias, assassinado em Anapu (PA) no dia 11 de agosto, havia recebido ameaças em 25 de maio, em sua oficina de motos, por uma pessoa que se apresentou com parente de Zé Iran, um suposto dono da terra em conflito, o lote 83 da Gleba Bacajá;

- José Nunes da Cruz Silva (Zé da Lapada), assassinado em Anapu (PA), em 27 de outubro, diante da esposa, recebera ameaças menos de um mês antes da morte, da parte de Debs Antônio Rosa, que se apresenta também como um dos donos do lote 83;

- Raimundo Santos Rodrigues, Conselheiro do ICMBio (Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade), na Reserva Biológica do Gurupi e Presidente da Associação dos Pequenos Produtores Rurais do Rio da Onça II, foi assassinado no dia 25 de agosto, em Bom Jardim (MA), numa emboscada. Em 18 de junho, recebera ameaças de Jesus Costa.

Em 2014, cinco das trinta e seis pessoas assassinadas já haviam recebido ameaças de morte. Entre elas, a ex-presidenta do Sindicato dos Trabalhadores na Agricultura de União do Sul, em Mato Grosso, Maria Lúcia do Nascimento. Ela havia registrado Boletins de Ocorrência das ameaças sofridas e o fato foi comunicado ao Ouvidor Agrário Nacional, desembargador Gercino José da Silva Filho, na Audiência Pública de 05 de agosto, em Cuiabá, uma semana antes do assassinato, que aconteceu no dia 13 de agosto.

Nesta mesma Audiência, o trabalhador rural Josias Paulino de Castro, Presidente da ASPRONU (Associação de Produtores Rurais Nova União) e sua esposa, Ireni da Silva Castro, denunciaram as ameaças que sofriam. Josias afirmara: "Estamos morrendo, somos ameaçados, o governo de Mato Grosso é conivente, a PM de Guariba protege eles, o Governo Federal é omisso, será que eu vou ter que ser assassinado para que vocês acreditem e tomem providências?”. Foram assassinados no município de Colniza (MT), em 16 de agosto de 2014, 11 dias depois da audiência.

Em 2011, após o assassinato do casal Maria do Espírito Santo e José Cláudio, em Nova Ipixuna, Pará, a CPT levou à Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República a relação de 1.855 pessoas que haviam sofrido ameaças de morte entre os anos 2000 e 2011. Dessas, 42 haviam sido assassinadas, 30 haviam sofrido tentativas de assassinato e 165 haviam sofrido mais de uma ameaça. Entre 2012 até a presente data o número de pessoas ameaçadas de morte somou 799. Dessas, 18 foram assassinadas, 22 sofreram tentativas de assassinato e 124 sofreram ameaças mais de uma vez.

As ameaças atingem não somente os trabalhadores, mas também os que os apoiam. Das 799 pessoas ameaçadas, de 2012 até a presente data, 28 se encontravam na categoria de agentes de pastoral, missionários ou religiosos. 16 são agentes da CPT. Outros quatro ameaçados eram advogados e dois ambientalistas.

A maioria das ameaças e intimidações é decorrente de conflitos por terra, defesa dos direitos territoriais e ambientais. Elas partem dos próprios fazendeiros, mas a maior parte das vezes de seus jagunços ou pistoleiros. É comum a presença de policiais nas milícias que dão suporte às fazendas, como têm denunciado reiteradamente os camponeses da região de Ariquemes e Vale do Jamari, em Rondônia.

Diante desse recrudescimento da violência no campo, o Conselho Nacional da CPT EXIGE uma ação rigorosa, elucidativa e punitiva para os casos de ameaças de morte, agressões e assassinatos nos conflitos agrários.

Uma presença efetiva do Estado é necessária para dar segurança e garantia de vida não só aos ameaçados individualmente, mas às comunidades às quais pertencem, pois as ameaças às lideranças e aos que as apoiam têm como objetivo direto minar as comunidades na sua capacidade de resistência e enfrentamento.

É inconcebível que o campo, a terra e o território de tantas comunidades e povos, espaço de vida, cultura e produção, em pleno século XXI, continuem sendo expropriados e palco de uma barbárie histórica e assassina.

Goiânia, 27 de novembro de 2015.

O Conselho Nacional da Comissão Pastoral da Terra (CPT)

sábado, 5 de dezembro de 2015

Hidrelétricas: Tapajós ampliará emissão por desmatamento


Por: Cíntya Feitosa e Claudio Angelo*

Complexo de hidrelétricas pode induzir desmate de até 3 milhões de hectares de florestas e afetar mais de 30 terras indígenas, segundo cálculo apresentado em Paris pelo IPAM

Enquanto o governo federal prepara uma medida provisória para autorizar a construção de hidrelétricas em terras indígenas, um novo cálculo sugere que o complexo hidrelétrico do Tapajós pode induzir o desmatamento de até 3 milhões de hectares, no pior cenário.
De acordo com o estudo, apresentado pelo IPAM (Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia) em Paris, mais de 30 terras indígenas na região podem ser afetadas, direta ou indiretamente. Isso porque, de acordo com os pesquisadores, o maior desmatamento ocorre de 70 a 90 quilômetros de distância das hidrelétricas. Assim, as emissões de gases de efeito estufa por desmatamento podem aumentar.
O projeto de geração de energia no Tapajós é um dos grandes investimentos previstos no Programa de Aceleração do Crescimento. Segundo o OC apurou, a expansão do parque hidrelétrico brasileiro foi objeto de discussões ásperas entre a presidente Dilma Rousseff e sua equipe em setembro, na definição do compromisso brasileiro para a conferência do clima de Paris – a INDC. Maurício Tolmasquim, presidente da EPE (Empresa de Pesquisa Energética, vinculada ao Ministério de Minas e Energia), era contra essa proposta , e defendia mais investimentos em energia eólica.
Tolmasquim afirmou hoje, em Paris, que o governo está trabalhando para que o leilão das usinas hidrelétricas do Tapajós ocorra em 2016. Ele afirmou que o Brasil não deverá explorar todo o potencial hidrelétrico da Amazônia, mas que novas hidrelétricas são essenciais para garantir a segurança energética do país. “Uma parte desse potencial não será utilizado, devido aos impactos sociais e ambientais. Mas 50% devem ser explorados”, diz Tolmasquim.
O presidente da EPE disse ainda que modelos climáticos que indicam maior incidência de crises hídricas em médio prazo são incertos e, por isso, os investimentos em geração hidrelétrica serão mantidos. A análise de Tolmasquim inclui o estudo encomendado pela extinta Secretaria de Assuntos Estratégicos, que mostra que a expansão da energia hidrelétrica no país pode ser um risco de investimento já em 2040. “Se for construída uma hidrelétrica que gere energia por 30 anos e depois reduza seu potencial, ainda assim é viável economicamente”, diz. “Não devemos ficar prisioneiros dessa questão.” Em 2016 devem ser realizados quatro leilões de energia – já contando com a licença de Tapajós.
Terra indígenas
O OC teve acesso à prévia de uma medida provisória que pretende criar um mecanismo de compensação financeira por meio da exploração do potencial hidráulico para geração de energia. Os recursos seriam aplicados em um fundo de apoio a povos indígenas.
De acordo com Maurício Guetta, advogado do Instituto Socioambiental, a medida é inconstitucional. “Uma eventual regulação deste tema não poderia ser feita via medida provisória.” Guetta avalia que a medida provisória é uma tentativa de aprovar o recebimento de mais recursos, com a atual crise econômica vivida pelo país. Ouça a declaração do advogado ao OC:
A edição da medida provisória ocorre uma semana depois da aprovação do licenciamento “fast track” na Comissão de Desenvolvimento do Senado. O projeto, de autoria do senador Romero Jucá (PMDB-RR), acelera a liberação de licenciamento ambiental para obras consideradas estratégicas para o desenvolvimento do país.
Nara Baré, representante da COIAB (Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira), afirmou que os indígenas também foram pegos de surpresa sobre a possível MP e considera a medida incompatível com o posicionamento do Brasil na conferência do clima de Paris. “O governo do Brasil se posiciona como se houvesse um diálogo e um consenso sobre a questão indígena, e não há.” Nara Baré também destaca o papel de preservação de florestas e, consequentemente, de carbono desempenhado pelas terras indígenas. “As metas que o Brasil coloca para 2030 são boas, mas o governo não terá perna para cumpri-las.”

*Fonte: Observatório do Clima