terça-feira, 1 de abril de 2008

A MP 422 é Legalziação da Grilagem de Terras Públicas na Amazônia

Ariovaldo Umbelino de Oliveira
arioliv@usp.br


A Amazônia continua nos noticiários. Agora, se trata da MP 422, que dispensa de licitação a venda de terras públicas do INCRA até 1.500 hectares. E, por de traz dela, está a estratégia de ação do agronegócio/agrobanditismo em sua sanha de se apropriar ilegalmente das terras públicas griladas daquela região.

A grilagem das terras públicas da Amazônia sempre veio alimentada pelas políticas públicas dos diferentes governos nos últimos cinqüenta anos. Primeiro foi a “Marcha para o Oeste” de Getúlio Vargas. Depois, os incentivos fiscais da SUDAM, da ditadura militar formulados pelo então ministro Delfim Neto. E por último, FHC e Lula, e a aliança com a bancada ruralista no Congresso e as prorrogações infindáveis de suas dívidas que nunca são ou serão pagas.

Mas, qual foi a mudança na estratégia de ação do agronegócio na apropriação privada das terras públicas da Amazônia?

O uso da grilagem foi sendo sofisticado. Agora, não é mais necessário envelhecer os documentos com a ajuda dos grilos. Dois novos recursos passaram a ser utilizados. Primeiro foi a estratégia de tentar regularizar as terras através de “laranjas”, via falsas procurações. Foi o período que denominei de “grilagem legalizada” durante os governos militares. Ou seja, o grileiro interessado entrava com o pedido de “compra” da área. O máximo que podia adquirir, entre 1946 e 1967, era de 10.000 hectares. Depois esta área foi reduzida entre 1967 e 1988, para 3.000 hectares e, após 1988, para 2.500 hectares. A denúncia deste expediente gerou inúmeras Comissões Parlamentares de Inquéritos, cuja única conseqüência, foi a introdução nos Atos das Disposições Constitucionais Transitórias da Constituição de 1988 do artigo 51 onde está prevista a revisão por Comissão Mista do Congresso Nacional de “todas as doações, vendas e concessões de terras públicas com área superior a três mil hectares, realizadas no período de 1º de janeiro de 1962 a 31 de dezembro de 1987”. Entretanto, até hoje o Congresso nada fez para providenciar esta revisão.

Com a “Nova República”, veio o I Plano Nacional de Reforma Agrária e a nova Constituição. A partir daí, o destino das terras públicas, insisto devolutas ou não, porque segundo o Supremo, devolutas são todas as terras públicas não discriminadas, passou a ser regido pelo artigo 188 da Constituição: “A destinação de terras públicas e devolutas será compatibilizada com a política agrícola e com o plano nacional de reforma agrária.” Mesmo assim, há nos protocolos do INCRA das diferentes superintendências da Amazônia Legal, pedidos para “comprar” todas as terras públicas arrecadadas e discriminadas. Trata-se de um verdadeiro crime lesa Pátria.

Como a Constituição de 1988, manda compatibilizar a destinação das terras públicas com o plano nacional de reforma agrária, uma nova estratégia passou a ser montada para continuar favorecendo os grileiros do agronegócio. Uma parte dos funcionários do INCRA, particularmente os que “cuidam” do Cadastro, sempre estiveram envolvidos em corrupção, acusados de “venda” de terras públicas na Amazônia. Pois bem, são eles que passaram a “oferecer” e “reservar” as terras públicas para os grileiros e indicar o caminho “legal” para obtê-las. Portanto, quem está realizando a “grilagem legalizada” é uma parte dos próprios funcionários corruptos do INCRA e dos órgãos estaduais de terra.

A denúncia destes fatos, já levou a Polícia Federal a fazer a Operação Faroeste no Pará e mandar para a prisão altos funcionários do INCRA. Também, o Ministério Público move ação para cancelar os “assentamentos da reforma agrária laranja” da regional de Santarém. O motivo é sempre o mesmo: a tentativa de “oficializar” a grilagem das terras públicas.

A população brasileira precisa saber que o INCRA, desde os governos militares, arrecadou e/ou discriminou, um total de 105.803.350 hectares distribuídas da seguinte forma pelos Estados da Amazônia Legal: Rondônia 15.355.503 ha; Acre 3.079.206 ha; Amazonas 32.784.807 ha; Roraima 14.440.460 ha; Pará 20.038.516 ha; Amapá 8.837.835 ha; Tocantins 4.500.000 ha; Mato Grosso 6.767.023 ha; e Maranhão 1.730.924 ha.

Deste total, o INCRA até o ano de 2003, durante a elaboração do II PNRA do governo Lula, tinha destinado um total de 37.979.540 hectares. E possuía ainda sem destinação 67.823.810 hectares. Estas terras públicas do INCRA estão assim distribuídas: Rondônia 4.907.824 ha; Acre 6.291.734 ha; Amazonas 20.962.020 ha; Roraima 9.208.315 ha; Pará 17.934.669 ha; Amapá 0; Tocantins 1.031.876 ha; Mato Grosso 5.756.448 ha; e Maranhão 1.730.924 ha.

O mais espantoso de tudo, é que todas estas terras estão “cercadas e apropriadas privadamente”. Os funcionários corruptos do INCRA “venderam” praticamente quase todo este patrimônio público. Agora, estão junto como o governo Lula, propondo soluções “jurídicas” para legalizar o crime cometido. É por isso, que no final do ano de 2005, conseguiram enfiar no meio da famosa “MP do bem” (Lei nº 11.196 de 21/11/2005) o artigo 118, que passou a permitir a regularização das terras na Amazônia Legal até 500 hectares, quando o artigo 191 da Constituição autoriza a posse apenas até 50 hectares. Aliás, não custa lembrar que, a Constituição de 1.967 dos militares, autorizava área de posse de apenas 100 hectares. Estes princípios são válidos particularmente, quando a terra é devoluta, porque as terras públicas não são passíveis de usucapião (Artigo 200 do Decreto-Lei 9760 05/09/1946, § 3º do artigo 183 da Constituição de 1988). Além disso, a lei que regulamenta as licitações de bens públicos (Lei Nº 8.666, de 21/06/1993), já havia sido alterada para permitir a alienação de terras públicas na Amazônia Legal até 500 hectares.

A Instrução Normativa nº 32 de 17/05/2006 do INCRA, fixou os procedimentos legais para que o crime de uma parte da grilagem das terras públicas pudesse começar a ser legalizado. Se não bastasse este ato do governo Lula, afrontando as conquistas da “Constituição cidadã” de 1988, em 11 de junho de 2007, o INCRA baixou a Instrução Normativa nº 41, publicada no DOU em 18/06/2007. Esta nova norma simplesmente “estabelece critérios e procedimentos administrativos referentes à alienação de terras públicas em áreas acima de 500 hectares limitadas a 15 (quinze) módulos fiscais mediante concorrência pública.” Como o maior módulo fiscal na Amazônia é de 100 hectares, a área máxima será de 1.500 hectares, isto se não mudarem também a dimensão destes módulos.

Agora com assinatura da Medida Provisória nº 422, que altera novamente a Lei nº 8.666, a alienação de imóveis públicos da União com dispensa de licitação, vai até 15 módulos fiscais. Como a maioria dos municípios da Amazônia Legal tem módulos fiscais de 100 hectares, a dispensa de licitação atinge quase 1500 hectares.
Assim, a MP 422 segundo o diretor de Ordenamento da Estrutura Fundiária do Incra, Roberto Kiel, “agora eles poderão comprar do governo federal as terras que já ocupavam há anos e não vão precisar de concorrer com outros interessados”.(http://www.incra.gov.br, “Assinada MP para regularização fundiária da Amazônia” publicada em: 26/03/08, acessada às 15:30hs).

Outra parte desta engenhosa operação para legalização da grilagem de terras do INCRA na Amazônia Legal foi o aproveitamento do aumento do desmatamento naquela região para fazer o recadastramento dos imóveis, permitindo assim, que os grileiros que ainda não tinham cadastrados as terras públicas que grilaram, podem agora fazê-lo, e assim se habilitarem para “comprar” as terras griladas sem licitação. Aliás, a notícia no site do INCRA sobre o recadastramento já, forma absurda reconhece os grileiros como posseiros: “Os donos ou posseiros de áreas maiores que quatro módulos fiscais (um módulo representa 60 a 80 hectares, conforme o município) terão que levar ao Incra, de 3 de março a 2 de abril, documentos que comprovem a titularidade ou posse pacífica da terra, plantas e memoriais descritivos com a correta localização geográfica dos imóveis rurais.” (http://www.incra.gov.br, “MDA e Incra anunciam como será o recadastramento de imóveis rurais na Amazônia” publicada em: 22/02/08, acessada às 16:00hs do dia 26/03/2008).

Dessa forma, é preciso deixar claro que as verdadeiras posses das famílias camponesas ribeirinhas ou não na Amazônia não ocupam mais de 100 hectares, portanto, estes atos do INCRA são para regularizarem as grilagens das terras públicas do próprio INCRA que seus funcionários corruptos “venderam” para ao agrobanditismo.

Vale lembrar que apenas duas vezes na história do Brasil a grande posse foi legalizada, na Lei de Terra de 1850 e na ditadura militar entre 1964/1984.

Por isso volto a repetir, trata-se de uma afronta aos princípios constitucionais e a tudo o que o PT pregou antes de sua chegada a presidência da República: o governo Lula está fazendo o que nenhum governo, depois dos militares, fez, “vendendo” ao agronegócio/agrobanditismo mais de 50 milhões de hectares de terras públicas do INCRA na Amazônia que deveriam ser reservadas para a REFORMA AGRÁRIA, à demarcação de terras indígenas e ou quilombolas, e a criação de unidades de conservação ambiental.




PELA REVOGAÇÃO IMEDIATA DA MP 422 E DA INSTRUÇÃO NORMATIVA Nº 41, PORQUE AS TERRAS PÚBLICAS DO INCRA DEVEM SER DESTINADAS APENAS PARA A REFORMA AGRÁRIA
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