sexta-feira, 11 de setembro de 2015

Indenização a proprietários rurais por Terra Indígena é aprovada no Senado


Na última hora, relator aceita sugestão do senador Roberto Requião para permitir o pagamento pela terra nua também com Títulos da Dívida Agrária. De acordo com ele, mecanismo pode viabilizar pacificação de conflitos. Projeto agora vai à Câmara
O plenário do Senado aprovou, na noite de ontem (8/9), a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 71/2011, que prevê a indenização pela terra nua a proprietários rurais com áreas incidentes em Terras Indígenas (TIs). O projeto foi aprovado por unanimidade, em dois turnos, um logo após do outro e, de forma incomum, com apenas alguns minutos de diferença. A proposta segue agora para a Câmara.

Segundo o texto aprovado, somente serão alvo da indenização áreas sobrepostas a TIs homologadas após 5 de outubro de 2013 e poderá receber a compensação quem tiver títulos válidos obtidos de “boa-fé”. O pagamento deverá ser feito antes de o produtor rural deixar a terra, ainda de acordo com o projeto votado pelos senadores. Hoje, a Constituição determina a indenização apenas pelas benfeitorias.

Na última hora, já em plenário, o relator Blairo Maggi (PR-MT) acatou a sugestão de Roberto Requião (PMDB-PR) para incluir no projeto a possibilidade de indenização também por Títulos da Dívida Agrária (TDA), se for de interesse do beneficiado, além do pagamento em dinheiro (veja abaixo texto completo aprovado). A aposta de Requião é que o mecanismo poderá viabilizar as indenizações. O senador listou as vantagens do uso do TDA, como sua aceitação pelo mercado e dispensa de cobrança de imposto de renda.

“Na grande maioria dos casos, não haverá oposição, desde que consigamos chegar a um preço justo pela terra. Os produtores relutam a sair porque não podem deixar para trás 20, 30, 40 anos de trabalho sem um centavo, sem seu patrimônio”, afirmou Maggi.

A PEC havia sido aprovada na CCJ em março, mas recebeu quatro emendas de plenário e voltou à comissão na última semana. Maggi apresentou então um novo texto, incluindo trechos das emendas.

A maioria dos senadores concordou que a aprovação da PEC pode ser um passo importante para a pacificação dos conflitos de terra. O projeto foi aprovado na CCJ, na semana passada, depois que o indígena Simião Vilhalva Guarani Kaiowa foi assassinado por fazendeiros, no município de Antônio João, no sul do Mato Grosso do Sul, no sábado retrasado (29/8) (saiba mais). A aprovação da PEC foi articulada diretamente pelos três senadores do estado: Delcídio Amaral (PT), Waldemir Moka (PMDB) e Simone Tebet (PMDB).

Câmara
O desafio, agora, será aprovar o projeto na Câmara. Lá, os ruralistas seguem pressionando o governo a alterar os procedimentos de demarcação das TIs com o objetivo de pará-los. O principal cavalo-de-batalha é a PEC 215, que tramita na casa e pretende transferir do Executivo ao Congresso a atribuição de aprovar a demarcação de TIs, além de permitir a realização de empreendimentos de impacto socioambiental, como hidrelétricas e agricultura de escala. Se aprovada, significará na prática a paralisação definitiva da oficialização de TIs, Unidades de Conservação e Quilombos.

“Acho que a PEC 71 deveria servir de cláusula de contenção à PEC 215, esta, sim, uma ameaça aos direitos dos povos indígenas”, afirmou Randolfe Rodrigues (PSOL). Outros parlamentares, como Lindbergh Farias (PT-RJ), João Capiberibe (PSB-AP), Delcídio Amaral e Telmário Mota (PDT-RR) também afirmaram que a tendência é que a PEC 215 perca força. Há algumas semanas, 48 senadores divulgaram um manifesto contrário à proposta, o que já havia reduzido bastante suas chances de aprovação (leia mais).

“O presidente da CNA [Confederação de Agricultura e Pecuária do Brasil], João Martins, entende que a medida traz segurança jurídica ao produtor rural e, também, às comunidades indígenas, facilitando o fim dos conflitos e estabelecendo o diálogo entre as partes”, publicou o site da CNA.

“A proposta é muito mais alinhada com o que a Constituição estabeleceu e com a realidade de alguns estados que não têm terras devolutas, mas tituladas. O projeto avança, distensiona o campo”, argumentou Delcídio.

“Ao invés de expropriação, será desapropriação. Estamos falando de gente que tem o título da terra. Não estamos falando de grileiro nem de invasor. Que fique claro. Num primeiro momento, tenho certeza que a Câmara vai receber e sentir que pela primeira vez o governo tem uma ferramenta para indenização. Tenho certeza que essa PEC caminha para resolver de forma real o problema, uma ferramenta para promover a justiça entre povos indígenas e produtores rurais”, finalizou Waldemir Moka.

Veja como ficou o texto final da PEC 71:

As Mesas da Câmara dos Deputados e do Senado Federal, nos termos do § 3º do art. 60 da Constituição Federal, promulgam a seguinte Emenda ao texto constitucional:

Art. 1º O § 6º do art. 231 da Constituição Federal passa a vigorar com a seguinte redação:

“Art. 231. ............................................................

§ 6º São nulos e extintos, não produzindo efeitos jurídicos, os atos que tenham por objeto a ocupação, o domínio e a posse das terras a que se refere este artigo, ou a exploração das riquezas naturais do solo, dos rios e dos lagos nelas existentes, ressalvado relevante interesse público da União, segundo o que dispuser lei complementar, não gerando a nulidade e a extinção direito a indenização ou a ações contra a União, salvo quanto às benfeitorias derivadas da ocupação de boa-fé e o valor da terra nua e as benfeitorias nas hipóteses ressalvadas expressamente nesta Constituição.

Art. 2º O Ato das Disposições Constitucionais Transitórias passa a vigorar acrescido do seguinte art. 67-A:

“Art. 67-A. A União responderá, nos termos da lei civil, pelos danos causados aos detentores de boa-fé de títulos de domínio regularmente expedidos pelo Poder Público relativos a áreas declaradas, a qualquer tempo, como tradicionalmente ocupadas pelos índios e homologadas a partir de 5 de outubro de 2013.

Parágrafo único. Serão indenizados previamente em dinheiro, ou em Títulos da Dívida Agrária, se for do interesse do beneficiário da indenização, e de forma justa os danos decorrentes da responsabilidade a que se refere o caput deste artigo, cujos cálculos serão realizados com base no valor da terra nua e das benfeitorias necessárias e úteis realizadas, mas não serão reparados se a posse atual for injusta e de má-fé.’”

Art. 3º Esta Emenda à Constituição entra em vigor na data de sua publicação.

Sala da Comissão,
Presidente
Relator


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