A decisão do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1) acata o pedido realizado pelo Ministério Público Federal (MPF) e anula a Licença de Instalação (LI) parcial, que autorizou o início da construção dos canteiros de obras da hidrelétrica de Belo Monte em 2011
A Justiça também decidiu que o BNDES não deve repassar qualquer recurso para a Norte Energia, empresa responsável pela construção da usina, antes que as 40 condicionantes da Licença Prévia (LP), primeira licença da usina, sejam cumpridas. A decisão judicial foi tomada pelo desembargador Souza Prudente e precisará ser confirmada por decisão colegiada do tribunal.
As 40 condicionantes da Licença Prévia tratam de ações estabelecidas pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente (Ibama) para que as cidades próximas da região onde Belo Monte está sendo construída fossem preparadas para enfrentar os impactos da obra. Para iniciá-las, o empreendedor e o governo teriam que cumprir uma série de condições, várias delas complexas, como a retirada de ocupantes não indígenas das Terras Indígenas da região e a instalação de uma infraestrutura de saúde, educação e segurança nas cidades que receberiam os aproximadamente 100 mil migrantes anunciados nos estudos de impacto da obra.
Em janeiro de 2011, o Ibama concedeu uma Licença de Instalação (LI) Parcial que permitia o início da construção somente dos canteiros de obras. A ação judicial do MPF se voltava contra essa LI parcial, pois teria sido dada sem que as condicionantes consideradas pelo próprio Ibama como de cumprimento indispensável antes do início de qualquer obra tivessem sido realizadas. “A Licença de Instalação Parcial, figura inexistente na legislação brasileira, permitiu que a empresa Norte Energia driblasse as obrigações da Licença Prévia sem atrasar o cronograma de construção da usina”, analisa Biviany Rojas, advogada do ISA.
Ibama concedeu licença sem cumprimento de medidas antecipatóriasApesar de ter verificado que as condicionantes não haviam sido cumpridas, o Ibama decidiu autorizar o início das obras e reeditar as metas e prazos das condicionantes. Pouco depois, em junho de 2011, o órgão ambiental concedeu a Licença de Instalação para o restante das obras, novamente sem o cumprimento das medidas antecipatórias. Essa segunda LI substituiu a LI parcial, de modo que a decisão do TRF-1 diz respeito não só à construção dos canteiros, mas à toda a obra.
A Licença Prévia, concedida em fevereiro de 2010, também foi assinada pelo presidente do órgão ambiental mesmo havendo um parecer de sua equipe técnica, emitido dois dias antes, que afirmava não haver “elementos suficientes para atestar a viabilidade ambiental do empreendimento”.
A decisão de Souza Prudente poderá ainda ser encaminhada pelo governo e pela Norte Energia ao presidente do Superior Tribunal de Justiça, que pode suspender a decisão. “O STJ poderá mandar voltar as obras utilizando critérios políticos e econômicos, independentemente de ter sido descumprida a legislação ambiental”, avalia Leonardo Amorim, advogado do ISA. “Isso porque o país não se livrou de uma lei que tem suas origens na ditadura, que permite que o governo ignore as decisões judiciais até o julgamento final das ações contra ele. Enquanto isso, a obra é concluída e depois considerada fato consumado”.
A última vez que a Justiça mandou paralisar as obras da usina foi em agosto de 2012, quando o TRF1 entendeu que o governo brasileiro não atendeu ao direito dos povos indígenas afetados em serem consultados, mas a decisão foi suspensa pelo então presidente do STF, ministro Ayres Britto, e ainda aguarda julgamento.
“A fragilidade do Ibama na fiscalização das condicionantes e a demora em obtermos decisões judiciais definitivas apenas agravam o quadro social, tornando-o cada dia mais grave”, avalia o Procurador da República no Estado do Pará (MPF/PA), Ubiratan Cazetta.
A usina hidrelétrica de Belo Monte recebeu financiamento de R$ 3,2 bilhões para investimento em obras socioambientais, maior valor já aprovado pelo BNDES para iniciativas socioambientais. (Saiba mais).
“O BNDES só formalizou o empréstimo após o licenciamento de instalação da obra. A Norte Energia, desobedecendo as pré condições estabelecidas pelo Ibama, não antecipou investimentos para realização das condicionantes que deveriam anteceder o início da obra. Só o fez após a licença de instalação e quando assegurado o empréstimo do BNDES. O Ibama relevou esta desobediência em seu último parecer oficial, que hoje resulta num enorme descompasso entre o ritmo da obra e os investimentos socioambientais considerados básicos para minimizar os impactos na região”, afirma o secretário executivo do ISA, André Villas-Bôas.
Veja aqui a tabela das ações judiciais do MPF contra Belo Monte (a ação em que houve a decisão de Souza Prudente foi a de nº 11)
Fonte: Instituto Socioambiental