segunda-feira, 10 de março de 2014

Direito à terra indígena está acima de título de propriedade

À vista da Constituição, os chamados ‘‘direitos originários indígenas’’, reconhecidos como mais antigos do que qualquer outro, preponderam sobre os direitos adquiridos, inclusive sobre aqueles materializados em escrituras públicas ou títulos de legitimação de posse em favor de não-índios.
O argumento levou a 3ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região a negar Apelação de um fazendeiro do Paraná, que tentou derrubar na Justiça os efeitos da Portaria 1.794/2007, que versa sobre a demarcação de terras indígenas. O colegiado entendeu que, em face do que reza a atual Constituição, não poderia valer a coisa julgada constituída no ano de 1940. Até porque as partes acionadas no processo não estavam presentes à época, e nem havia menção ao direito dos indígenas.
O relator do recurso, juiz federal convocado Sérgio Renato Tejada Garcia, observou que não se exige a imemorialidade da ocupação para identificar uma terra como indígena. Ou seja, não é preciso que a comunidade indígena fixe sua habitação em toda terra reivindicada, que a ocupe fisicamente, mas que ela seja essencial para a sua subsistência, o desenvolvimento das atividades tradicionais e a preservação da herança cultural.
‘‘Assim, é de suma importância não descuidar os preceitos constitucionais e os tratados internacionais que visam salvaguardar o direito dos povos interessados de utilizar terras que não estejam exclusivamente ocupadas por eles, mas às quais, tradicionalmente, tenham tido acesso para suas atividades tradicionais e de subsistência’’, escreveu no acórdão, lavrado na sessão do dia 15 de janeiro.
A ação
O autor foi à Justiça com o objetivo de anular os efeitos da Portaria 1.794/2007, de 31 de outubro de 2007, do Ministério da Justiça, na parte que declarou a Fazenda Passo Liso como área de tradicional ocupação dos índios caingangues. A propriedade se localiza no município de Laranjeiras do Sul, no Paraná.
Sustentou que a norma ofende o instituto da coisa julgada, constituída nos autos de medição e divisão sob o número 129, de 1940, que tramitaram perante a Justiça Estadual da Comarca de Guarapuava. A ação anulatória foi proposta em face da União, do Estado do Paraná e da Fundação Nacional do Índio (Funai).
A sentença
A juíza substituta Fernanda Bohn, da 1ª Vara Federal de Guarapuava, acenou com a literalidade do artigo 472 do Código de Processo Civil, que assim dispõe: ‘‘A sentença faz coisa julgada às partes entre as quais é dada, não beneficiando, nem prejudicando terceiros. Nas causas relativas ao estado de pessoa, se houverem sido citados no processo, em litisconsórcio necessário, todos os interessados, a sentença produz coisa julgada em relação a terceiros’’.
Da leitura deste dispositivo, extrai-se que, como regra geral, a sentença constitui coisa julgada apenas inter partes; ou seja, apenas em relação às partes que integraram a lide — reforçou a magistrada.
Para a julgadora, os documentos anexados à petição inicial não demonstram que a União e/ou a Funai tenham sido partes no processo judicial proposto no ano de 1940, motivo pelo qual tais entidades não são atingidas pela coisa julgada produzida naqueles autos.
"Restam afastadas, ainda, as hipóteses de coisa julgada com efeitos erga omnes [vale para todos] excepcionalmente previstas no artigo 103 do Código de Defesa do Consumidor (Lei 8.078/90) e no artigo 16 da Lei de Ação Civil Pública (Lei 7.347/85). Logo, a improcedência do pedido é a medida que se impõe", definiu a juíza.
 Clique aqui para ler o acórdão.
*Fonte:  Consultor Jurídico
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