O órgão de licenciamento ambiental pede a reformulação do estudo de impacto em mais de 180 pontos que necessitam ser aprofundados
O processo de licenciamento da hidrelétrica de São
Luiz do Tapajós, no Pará, pode demorar mais que o esperado pelo governo
federal. Em avaliações técnicas divulgadas entre novembro de 2014 e o início de
março, o IBAMA (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais
Renováveis) aponta diversas falhas no estudo de impactos sociais e ambientais
da hidrelétrica e pede sua reformulação. Do jeito que o estudo está é
impossível para o órgão licenciador julgar a viabilidade ambiental do
empreendimento.
A expectativa do governo é de que a hidrelétrica
de São Luiz entre em operação em agosto de 2020, de acordo com o último Plano
Decenal de Expansão de Energia. Essa é a primeira das sete hidrelétricas
planejadas para o Complexo Tapajós, que junto às hidrelétricas do rio Teles
Pires se ligará ao sistema de energia do Sudeste/Centro-Oeste. Se construída, a
barragem irá alagar território indígena Munduruku e remover completamente os
ribeirinhos da comunidade centenária de Pimental, além de impactar as cidades
de precária infraestrutura social no oeste do Pará, entre elas, Itaituba.
Os pareceres do IBAMA, publicados em seu site,
somam 478 páginas de comentários sobre as informações apresentadas na pesquisa
feita pela CNEC Worley Parsons, empresa de consultoria contratada pela
Eletrobras, líder do Grupo de Estudos Tapajós. O grupo tem participação de
outras empresas do setor de energia elétrica, como Endesa, as francesas GDF
Suez e EDF, e da construtora Camargo Corrêa, acusada de pagar cerca de R$ 20
milhões em propina no projeto da usina de Belo Monte.
A avaliação do órgão ambiental sobre
empreendimentos que possam gerar grandes impactos socioambientais é obrigatória
por lei. Sem as licenças emitidas pelo IBAMA, a hidrelétrica não pode ser
construída.
A Eletrobras foi notificada oficialmente dia 2 de
março sobre a necessidade de detalhar e discutir questões relacionadas às
alternativas técnicas para o empreendimento, como a localização da barragem, e
as interferências causadas no Tapajós pelo enchimento e operação do
reservatório da hidrelétrica. Entre mais de 180 pontos que precisam ser
aprofundados no estudo, de acordo com os técnicos ambientais, o IBAMA também
julgou necessário um detalhamento maior sobre o modo de vida, infraestrutura,
educação, segurança e pesca nas áreas diretamente afetadas pelo projeto.
Conforme apontado nos pareceres, até dados básicos
– como os índices de educação dos municípios de Itaituba e Trairão, por
exemplo, estão errados. O estudo declara se basear no Atlas do Desenvolvimento
Humano no Brasil, mas classifica os índices desses municípios como “alto”,
enquanto a avaliação do Atlas é de “muito baixo”. “Pode-se dizer que os erros
nos dados do EIA comprometem de tal forma a avaliação dos impactos relacionados
ao tema que não é possível dimensionar a carência na educação nos municípios”,
escreveram os técnicos do IBAMA. A observação vai de encontro às críticas
feitas pela administração de Itaituba, que em outubro de 2014, apontou à CNEC
WorleyParsons erros nas informações apresentadas no estudo de impactos (leia
mais em: Lá vem o progresso).
Os técnicos também observaram que, embora o estudo
cite questionamentos dos moradores da comunidade ribeirinha de Pimental, as
dúvidas sobre como foi feito o cadastramento da população não foram resolvidas.
“As respostas às questões apresentadas não foram descritas no EIA [Estudo de
Impacto Ambiental]. Assim como não foram detalhadas a forma de lidar com essas
questões nem no diagnóstico, nem nos impactos e nem nas propostas de medidas
mitigadoras.”
O parecer ainda recomenda atenção para a possível
diminuição de peixes na região. O pescado é a fonte principal de proteína para
os ribeirinhos e o risco é de que o empreendimento comprometa a segurança
alimentar dessa população. (Leia mais em: Ninguém os ouviu)
Essa não é a primeira vez que o Grupo de Estudos
Tapajós precisa refazer o trabalho sobre impactos sociais e ambientais. Em
julho de 2014, o grupo apresentou os estudos de impacto às comunidades
indígenas do Tapajós, mas a Funai julgou as informações precárias. A segunda
versão do estudo foi apresentada em setembro. Nela, os pesquisadores apontam
que aldeias indígenas serão diretamente afetadas e recomendam sua remoção, o
que é vetado por lei. Por isso, a Funai produziu um parecer interno que considerou o projeto de São Luiz do
Tapajós inviável. (Leia mais em: A batalha pela fronteira Munduruku)
Mas o IBAMA ainda aguarda manifestação oficial do
órgão indigenista. Também são necessárias as manifestações das prefeituras das
cidades afetadas, do IPHAN sobre o patrimônio arqueológico presente na região e
do ICMBio sobre os impactos nas áreas de conservação que circundam a área
planejada para a barragem.
A Pública questionou
o IBAMA sobre os prazos e condições dadas à empresa para refazer os estudos,
mas até o fechamento desse texto não obteve resposta.