Seis aldeias Pataxó da Terra Indígena
(TI) Comexatibá, no extremo sul da Bahia, podem sofrer ação de despejo a
qualquer momento. Caso a ação ocorra, a responsabilidade será exclusiva do
governo federal: os procuradores da Advocacia-Geral da União (AGU) entraram com
o pedido de reintegração de posse na Justiça Federal de Eunápolis (BA)
representando o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade
(ICMBio).
Os Pataxó decidiram resistir no
território tradicional. A decisão de primeira instância autoriza o apoio da
Polícia Militar aos efetivos da Polícia Federal. Em 2013, os Terena foram
vítimas de ação semelhante: na ocasião, policiais federais e militares
investiram contra os indígenas e Gabriel Oziel Terena acabou morto a
tiros de arma de fogo.
A ação movida pelo ICMBio visa a retirar os indígenas de dentro de
parte do Parque Nacional do Descobrimento, unidade de conservação da mata
atlântica gestada pelo órgão ambiental ligado ao Poder Executivo
(saiba mais aqui).
O parque incide sobre a TI Comexatibá, já
identificada e delimitada pela Fundação Nacional do Índio (Funai)
como terra tradicional do povo Pataxó.
A procuradoria da Funai, também integrante da AGU, poderia entrar
com um pedido de suspensão de segurança no Supremo Tribunal Federal (STF), mas
a decisão política do governo federal é de não o fazer.
Representantes do governo tentam apenas negociar a suspensão da
execução do despejo, mas não o indeferimento completo da ação de reintegração
de posse, o que mantém a insegurança para os indígenas.
O despejo está programado para acontecer até o dia 18 de março, um
dia depois da relatora especial da Organização das Nações Unidas (ONU) para os
Direitos e as Liberdades Fundamentais dos Povos Indígenas,
Victoria Tauli-Corpuz, encerrar sua
visita ao Brasil. No último
domingo, a relatora esteve com os Pataxó de
Comexatibá na aldeia Serra do Padeiro,
Terra Indígena Tupinambá de Olivença. Victoria ouviu os
representantes Pataxó.
“O ICMBio diz que protege o meio ambiente, o Parque do
Descobrimento. Por isso eles falam que a gente tem de sair. Agora eles permitem
que fazendeiros destruam a mata com suas grandes máquinas, caçadores, todos
esses empreendimentos de turismo. Cansamos de denunciar essa gente e o ICMBio
não fez nada, ficou assistindo e dizendo que a gente é que desmatava”, declarou
Kamaiurá Pataxó.
Kamaiurá afirmou que o povo não arredará os pés do território. O
clima é de tensão, com mulheres, crianças e idosos sem saber como será o
futuro, mas “vamos resistir. Se querem acabar com o povo Pataxó, que eles
comecem agora porque estamos preparados para lutar”, frisou Kamaiurá.
Victoria disse ao indígena que a questão de parques de conservação
ambiental incidentes em terras indígenas serão alvo de investigação de sua relatoria.
“Se criam um parque e permitem a degradação ambiental, me parece que há um
problema (...) o governo brasileiro precisa para de emendar a Constituição
Federal e fazer aquilo que é certo, garantir o direito indígena”, afirmou a
relatora da ONU.
No momento, as polícias federal e militar, que devem executar o
despejo, já estão reunidas no município de Prado (BA), mesmo em que fica a
Terra Indígena. Indígenas denunciam que agentes da Polícia Federal e
funcionários do ICMBio estão indo até as comunidades e ameaçando os indígenas
com a possibilidade de um despejo violento.
Se a reintegração de posse acontecer, mais de 300 pessoas, entre
crianças, adultos e idosos, serão removidas de seis aldeias e quatro escolas
indígenas terão seu ano letivo interrompido.
Despejo pode ser o segundo na mesma
Terra Indígena em dois meses
Parte das aldeias Cahy e Gurita fica fora da área do Parque
Nacional do Descobrimento e, em janeiro, elas,
decorrente de outra ação de reintegração de posse contra
os indígenas. Na ocasião, as casas dos indígenas foram destruídas, muitas delas
ainda com seus pertences, e 75 famílias ficaram desalojadas até a decisão de
reintegração ser suspensa – o que aconteceu três dias depois da ação.
Duas ordens de reintegrações de
posse durante visita da ONU
A reintegração de posse na TI Comexatibá é a segunda que está
programada para ocorrer enquanto a relatora especial da ONU, Victoria
Tauli-Corpuz, visita o Brasil.
Uma outra ação de reintegração de posse, esta contra o povo Guarani e Kaiowá da Terra Indígena
Taquara, no Mato Grosso do Sul, deve ocorrer
até o dia 17 de março – último da visita da relatora ao Brasil, quando a
relatora realizará uma coletiva de imprensa para falar sobre suas impressões
durante os dez dias de visita ao país.
Além da Bahia, a relatora também visitou os estados do Pará e do
Mato Grosso do Sul. Neste último, logo após sua visita, pelo menos duas
comunidades indígenas do povo Guarani e Kaiowá foram atacadas a tiros.
Em uma delas, um indígena foi baleado,
mas não corre risco de morte.
Fonte: Cimi, 15 de agosto de 2016 - Mapa: ISA
Entenda mais sobre o conflito: ICMBio quer retirada de Pataxó da Terra Indígena Comexatiba, no sul da Bahia (ISA, 15 de março de 2016).
TRF-1 suspende reintegração de posse na TI Comexatiba, sul da Bahia (ISA, 18 de março de 2016).