segunda-feira, 12 de janeiro de 2015

Ministério sertanejo

Por Marcelo Leite*

Aldo Rebelo na Ciência e Kátia Abreu na Agricultura formarão um duo paranoico para lidar com o desmate

O governo anterior de Dilma Rousseff foi medíocre, e este se encaminha para ser pior. Todas as poucas coisas boas de seu primeiro mandato, no campo do alívio da pobreza, eram continuação de políticas de Lula. No que ela e Guido Mantega inovaram, bem, deu no que deu.

Como esta não é uma coluna de economia nem de política, fiquemos no campo da ciência e do ambiente. Dilma semeou ali material de sobra para colher uma safra recorde de desmatamento e de emissões de gases do efeito estufa --isso no ano em que deveria ir a Paris, em dezembro, para ajudar a pôr o mundo na rota da descarbonização.

A presidente escolheu Aldo Rebelo para ministro da Ciência, Tecnologia e Inovação. Seus 50 e tantos milhões de votos lhe dão legitimidade para entregar a um ex-maoísta que ainda acredita no materialismo dialético, mesmo que não no aquecimento global (a não ser como conspiração imperialista), uma pasta estratégica para curar o calcanhar de aquiles da economia brasileira (baixa produtividade). Mas não lhe dão razão, necessariamente, como parece acreditar Dilma.

Talvez para não dar asas às ideias retrógradas de Rebelo, que já defendeu o veto à introdução de tecnologias que economizem mão de obra, a presidente tratou de diminuir-lhe o ministério. Mandou cortar R$ 1,6 bilhão do orçamento para gastos administrativos de R$ 9,8 bilhões do MCTI, segundo reportagem de sexta-feira (9) nesta Folha.

Mesmo com a vara curta, Rebelo fará com Kátia Abreu no Ministério da Agricultura um duo suficientemente paranoico para cutucar a onça do desmatamento. Ela na CNA e ele na Câmara comandaram a aprovação do novo Código Florestal, que até contém algumas coisas boas, mas está sendo visto por boa parte dos grileiros, latifundiários e pecuaristas como licença para desmatar.

OK, o desmatamento voltou a cair em 2013/14, depois de ter aumentado pela primeira vez na década em 2012/13. O ano-base dessa contabilidade feita pelo Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais), porém, terminou em julho. De lá para cá, os sinais são de que o desmate da Amazônia voltou a recrudescer.

O governo fez de tudo para esconder os dados comprometedores. Os dados do sistema Deter, que antes eram divulgados mensalmente, agora só são a cada três meses, e mesmo assim com omissão de parâmetros fundamentais para que ONGs e institutos independentes façam seu próprio monitoramento.

ONGs? Aldo Rebelo e Kátia Abreu não as têm em boa conta. Parecem acreditar piamente que elas, pelo fato de algumas terem sede no exterior ou contarem com estrangeiros nos seus quadros, estão engajadas numa missão para prejudicar a competitividade do agronegócio.

O Inpe, agora, estará subordinado a Rebelo. É quase certo que o recém-ministro se prestará com convicção à tarefa de impedir que o instituto que ganhou fama internacional com o melhor sistema de monitoramento por satélite da destruição florestal prossiga no que o parlamentar deve considerar um trabalho de quinta coluna: fornecer dados transparentes sobre o estado da maior floresta tropical do planeta.

Cada governo tem o ministro que merece. Lula teve Eduardo Campos e Sérgio Rezende no MCTI. Dilma foi de Aloizio Mercadante, Marco Antonio Raupp e Clelio Campolina Diniz. Agora, vai dançar em Paris ao som da dupla Aldo e Abreu.

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