João Carlos Magalhães*
Documento interno do Incra (Instituto
Nacional da Colonização e Reforma Agrária) indica o fim da defesa de uma
tradicional reivindicação do órgão e de movimentos sociais, a atualização dos
índices de produtividade rural.
Segundo o pedido, a adequação desses
padrões, estabelecidos com dados de 1975, revelaria que parte das grandes
fazendas do país -se levada em conta a evolução tecnológica das últimas
décadas- são improdutivas, não realizam sua função social e devem ser
desapropriadas.
O relatório diz que a alta
produtividade das grandes fazendas é empecilho para desapropriações, sem
entretanto citar que o índice para medir a produtividade pode estar
artificialmente baixo.
"A disseminação da tecnologia
está permitindo que haja uma homogeneidade dos índices alcançados de
produtividade física. São poucas as propriedades rurais com boas terras e bem
localizadas que sofrerão a sanção constitucional da desapropriação em função
dos indicadores de produtividade física", afirma o documento
-"Proposta de Atualização Institucional do Incra"-, feito em
dezembro.
O texto não apenas deixa de propor a
atualização do índice como diz que outra abordagem deve ser avaliada.
Em lista de "estratégias de
acesso à terra", o relatório propõe "debater um índice de
sustentabilidade em vez da produtividade física", mas sem detalhar como a
discussão ocorreria e quais variáveis comporiam o padrão.
A primeira parte relata o que foi
feito pelo órgão nos últimos anos. A segunda, propõe ideias para o futuro e
cita reivindicações salariais.
Mudança
A proposta, responsabilidade do atual
presidente do Incra, Carlos Guedes, difere do que outros ocupantes do cargo
falaram desde a chegada do PT ao governo federal.
Rolf Hackbart, que esteve à frente do
instituto durante as duas gestões do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva,
defendeu diversas vezes a modernização das bases de comparação. Celso Lacerda,
que o substituiu, também o fez, mas com menos ímpeto.
A mudança sempre sofreu forte
resistência do agronegócio, mas, graças em parte à pressão do Incra, em certos
momentos da gestão Lula chegou perto de acontecer. Nos últimos anos, com o
fortalecimento da bancada ruralista e o arrefecimento do conflito agrário, o
assunto sumiu da agenda do governo.
Patrus Ananias (PT), novo titular do
Ministério do Desenvolvimento Agrário - ao qual o Incra é ligado-, já disse ser
favorável à mudança.
O MST (Movimento dos Trabalhadores
Rurais Sem-Terra), por sua vez, criticou o abandono da bandeira. "É com
preocupação que a gente vê essas coisas. Houve uma mudança de ideologia quanto
a desapropriar terras, o Incra não busca mais enfrentar o latifúndio",
afirma Alexandre Conceição, da coordenação nacional do movimento.
Em nota à Folha, o Incra disse: "O documento foi elaborado para informar
e subsidiar o novo ministro Patrus Ananias sobre os temas que dizem respeito ao
Incra. O documento, entregue ao ministro, está sob sua análise, portanto não
cabe comentários sobre os pontos colocados".
O texto reafirma a justificativa do
governo federal para diminuir o ritmo de desapropriações, segundo a qual é mais
eficiente desapropriar terras que tiverem condições de se tornarem produtivas.
"O desafio é identificar os
fatores que podem levar grandes imóveis com boas condições de aptidão,
logística e acesso a equipamentos públicos para serem destinados ao programa de
reforma agrária de forma mais célere pelo Incra", conclui o documento”.
Fonte: Folha de São Paulo
Leia também: Nota sobre a proposta de "atualização" do Incra