quarta-feira, 13 de novembro de 2013

A próxima vítima: Bacia do Rio Negro entra no mapa de hidrelétricas na Amazônia

Foto: corredeiras no Rio Negro. Amazônia Real
A bacia do rio Negro, no Estado do Amazonas, entrou no mapa de hidrelétricas na Amazônia do governo federal. Desde julho deste ano, a empresa Igplan Inteligência Geográfica Ltda., cuja sede é em Curitiba (PR), realiza levantamento na área. A empresa foi contratada pela Empresa de Pesquisa Energética (EPE), vinculada ao Ministério de Minas e Energia.
Conforme contrato firmado com a EPE, a IGPlan realizará em 360 dias “serviços técnicos especializados para elaboração de estudos para o diagnóstico socioambiental e dos usos múltiplos da água da bacia do rio Negro”. O estudo, chamado de pré-inventário, tem orçamento de R$ 1 milhão. O levantamento, segundo o edital da EPE, abrange “desde a região das cabeceiras inseridas no território nacional até a confluência com o rio Amazonas”.
A nascente do rio Negro é na Colômbia e sua foz é na capital amazonense, Manaus. O Negro é considerado o segundo maior rio do mundo em volume de água, atrás do rio Amazonas. Suas corredeiras, contudo, estão localizadas apenas nas cabeceiras, localizadas no Alto Rio Negro, fronteira do Brasil com a Colômbia, onde estão situadas várias terras indígenas e unidades de conservação. O local também é rico em substâncias minerais, como ouro e nióbio. O principal município do Alto Rio Negro é São Gabriel da Cachoeira (a 858 quilômetros de Manaus), onde 90% da população são de indígenas.
No mês passado, Igplan e EPE solicitaram da Federação das Organizações Indígenas do Alto Rio Negro (Foirn) um “banco de dados” com informações sociais, ambientais e demográficas. O pedido não foi atendido, segundo Nildo Fontes, da etnia tukano, e um dos diretores da Foirn.
Em entrevista ao Amazônia Real, Fontes disse que o pedido “chegou por email e de surpresa” e deixou os indígenas apreensivos com a possibilidade de construção de uma hidrelétrica na região. Ele afirmou que a Foirn ainda está estudando se responde ou não o pedido de informações das empresas.
“Chegou para a Foirn uma solicitação sem muita clareza, mas nos pareceu um projeto pronto para ser implementado e executado. O pedido está na nossa assessoria jurídica para avaliação”, disse Fontes.
O diretor da Foirn afirmou que a realização do estudo é “uma preocupação a mais” que os indígenas do Alto Rio Negro terão que enfrentar. “Uma das nossas maiores preocupações atuais é o projeto de regulamentação de mineração em terra indígena. Agora nos surpreendemos com esse estudo para a possível construção de hidrelétrica”, disse Fontes.
Fontes disse que o pedido de informações também foi enviado para o Instituto Socioambiental (ISA), organização que desenvolve trabalho junto aos indígenas do Alto Rio Negro. O Amazônia Real tentou falar com a assessoria jurídica do ISA, mas esta não retornou ao contato feito por telefone e por email.
Inviável
O cientista Philip Fernside, que há vários anos vem estudando os impactos de hidrelétricas na Amazônia, disse ser “inviável” uma hidrelétrica na bacia do rio Negro.
“O rio é muito profundo. Só restariam as corredeiras do Alto Rio Negro, mas ali não tem grandes centros urbanos e demandaria custos altos. Agora, obviamente dizer que isto é inviável não quer dizer muita coisa, pois sobre Balbina (hidrelétrica que abastece Manaus) se dizia a mesma coisa e ela foi construída”, disse.
Segundos dados da Foirn, a região do Médio e Alto Rio Negro tem 30 milhões de hectares de extensão. Desta área, 11 milhões de hectares são demarcados como terras indígenas ocupadas por 23 grupos étnicos das famílias Tukano Oriental, Arawak e Maku. É a área de maior diversidade indígena e linguística do país.
Oficina em Manaus
No início do mês passado, EPE e Igplan realizaram em Manaus uma oficina intitulada “Indicação de Alvos e Metas de Conservação na Bacia do Rio Negro”. No convite enviado para especialistas em fauna e flora que atuam no Amazonas, as empresas informam que um dos objetivos do evento é o “mapeamento de áreas críticas para conservação da biodiversidade na bacia através da metodologia do Planejamento Sistemático da Conservação”.
Um dos participantes da oficina que pediu para não ter seu nome publicado nesta matéria disse ao Amazônia Real que o representante da EPE informou que o estudo feito pela Igplan é um pré-inventário cujo objetivo é analisar relevo e hidrometeorologia do Alto Rio Negro. Um mapeamento das faixas de fronteira em escalas menores já estaria sendo realizado pelo Exército com o objetivo de ajudar no pré-inventário. O levantamento também avaliaria melhor o potencial dos afluentes do rio Negro.
“O representante da EPE nos disse que após todos esses levantamentos o Ministério de Minas e Energia vai definir se haverá abertura para realizar inventários e estudos de viabilidade. A EPE admite que o entrave é justamente as terras indígenas e o isolamento da área que geraria problemas logísticos para escoar a energia gerada para outras regiões”, disse o participante.
Durante a oficina, o representante da EPE também teria informado que outras bacias já estão sendo avaliadas. Uma delas é a do rio Branco (afluente do rio Negro) onde o inventário foi aprovado e a fase atual é de avaliação de potencial. A etapa seguinte é uma decisão política do governo federal.
“Na minha opinião, apesar da presença de corredeiras, construir barragens naquela área do Negro é inviável, sem falar que é tudo terra indígena. Talvez para as pequenas barragens sim, mas não é essa a intenção da EPE, que quer exportar energia para fora da Amazônia. A área não tem aptidão para receber grandes empreendimentos. O problema é que este governo está numa busca ensandecida por potencial energético na Amazônia que não me surpreenderia se alguma hidrelétrica fosse construída naquela região”, disse.
O portal também apurou que a EPE tentou realizar inventários em afluentes do rio Negro localizado no território demarcado dos índios Yanomami, mas estes não deixaram.
O Amazônia Real entrou em contato com a direção da IGPlan, mas esta orientou o portal a procurar a EPE. Apesar dos contatos por telefone e por email, a EPE não atendeu pedido de informações e de entrevista feito pelo portal.
Procurada pelo portal, a assessoria de imprensa do Exército disse que se manifestaria até nesta segunda-feira (11).
Fonte: Amazônia Real via Adital
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