sexta-feira, 6 de março de 2015

Justiça dá prazo para reestruturação da Funai em Altamira

Apesar de ser condicionante de Belo Monte, até agora nem Norte Energia nem poder público cumpriram as obrigações para suportar o aumento das demandas dos indígenas afetados

Atendendo a pedido do Ministério Público Federal (MPF), a Justiça Federal de Altamira deu prazo de 60 dias para que a Fundação Nacional do Índio (Funai) e a Norte Energia apresentem e cumpram um plano de reestruturação para que a Fundação possa atender as crescentes demandas dos povos indígenas afetados pela usina de Belo Monte. Apesar de ser condicionante da obra, com várias obrigações previstas no licenciamento, até agora nem a empresa responsável pela usina nem o poder público tomaram as providências para fortalecer a estrutura da Funai.

O plano deverá conter, de acordo com a decisão do juiz Cláudio Pina, a definição do imóvel para abrigar a sede definitiva da Funai, um cronograma detalhado para as obras da sede, relatório com o quantitativo de servidores que devem ser lotados para atender os indígenas afetados por Belo Monte e um cronograma para realização do concurso público que permita reforçar o quadro da Fundação tanto em Brasília quanto na região do Xingu. Além disso, o juiz ordenou que a Norte Energia apresente o termo de compromisso assinado com a Funai que a obriga a dar apoio material e fazer contratação temporária de profissionais.

Como é costume nos processos judiciais envolvendo as obrigações de Belo Monte, a defesa do governo federal alegou que o poder Judiciário não deveria interferir na definição de políticas públicas. A decisão do juiz respondeu que, “para aquém da judicialização de políticas públicas, o presente feito trata somente do cumprimento de obrigações assumidas para a viabilização de empreendimento em pleno curso”.

“Trata-se, portanto, de incursão não no âmbito da política pública, mas do efeito, ou seja, nas consequências jurídicas, sociais e econômicas da política pública já adotada e levada a efeito pela União no âmbito de sua atuação discricionária na escolha do projeto energético nacional”, prossegue a decisão, para concluir: “o exercício do poder discricionário na escolha da política pública não pode servir de pretexto para o descumprimento de compromissos assumidos para a viabilização do projeto ou limitações escudadas na cláusula da reserva do possível”

A situação das populações indígenas atingidas por Belo Monte no médio rio Xingu é considerada insustentável pelo MPF. Os compromissos e obrigações previstos desde 2010 para evitar e compensar os impactos não foram cumpridos até hoje. A ação demonstrou à Justiça os graves prejuízos.

“Presença constante dos índios na cidade, em locais provisórios e degradantes; ruptura completa da capacidade produtiva e alimentar; conflitos sociais, divisão de aldeias e deslegitimação das lideranças; vulnerabilidade extrema, com aumento do alcoolismo, consumo de drogas e violência sexual contra menores; modificação radical dos hábitos alimentares; surgimento de novas doenças, como diabetes, obesidade e hipertensão; super produção de lixo nas aldeias; vulnerabilidade das terras indígenas; diminuição da oferta de recursos naturais; conflitos interétnicos; impedimento do usufruto de seus territórios e desestímulo às atividades tradicionais. Esses são apenas alguns exemplos do que Belo Monte representa hoje aos povos indígenas do médio Xingu.”

Para o MPF, a inação do poder público diante da necessidade de obrigar o cumprimento das condicionantes e de, nos casos de descumprimento, aplicar as punições necessárias levou a Norte Energia a controlar totalmente o processo de licenciamento ambiental. “O empreendedor reescreve suas obrigações e implementa políticas anômalas, sem o devido controle da Funai, incapacitada que está de cumprir sua missão institucional e de fazer valer as normas deste licenciamento”, constata o MPF.

Íntegra da liminar

Fonte: Ministério Público Federal no Pará
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