Marcelo
Leite*
Levantamento obtido com exclusividade
pela Folha indica que a presidente
Dilma Rousseff, em seu primeiro mandato, reduziu para R$ 1,78 bilhão os gastos
com prevenção e combate ao desmatamento na Amazônia.
Em relação à despesa do governo
anterior (R$ 6,36 bilhões), uma queda de 72%.
A pesquisa foi realizada pelo portal Infoamazônia, coordenado pelo jornalista Gustavo
Faleiros. O relatório, "A Política do Desmatamento", será apresentado
nesta terça-feira (31).
O antropólogo Ricardo Verdum reuniu os
dados sobre gastos relacionados ao Plano de Ação para Prevenção e Controle do
Desmatamento na Amazônia Legal (PPCDAm) por meio do Siga Brasil, sistema de
informações sobre orçamento público do Senado.
O Ministério do Meio Ambiente (MMA) apresenta valores diferentes,
pois leva em consideração os investimentos previstos no plano em suas três
fases.
O relatório cobre os anos de 2007 a
2014. Esse período coincidiu com a manutenção da queda nas taxas de
desmatamento iniciada em 2005. Desde então, elas despencaram de 27.772 km2
(2003-04) para uma estimativa preliminar de 4.848 km² em 2013-14 (ou seja, nos
12 meses até julho do ano passado), uma diminuição de 83%.
Há sinais, no entanto, de que a
devastação na Amazônia pode aumentar neste ano. Desde esse último dado anual
fechado (2013-14), o Imazon (Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia),
de Belém, registrou em seu sistema SAD o total de 1.702 km2. Um salto de 215%
sobre o intervalo agosto.
A confirmação dessa tendência,
contudo, só virá com os dados oficiais do programa Prodes, do Inpe (Instituto
Nacional de Pesquisas Espaciais), no final do ano. Sistemas de alerta como o
SAD e o Deter (do Inpe) trabalham com grandes margens de erro.
Entre agosto de 2013 e janeiro de
2014, o Deter apontou 1.162 km²; nos mesmos meses de 2014 para 2015, o sistema
apontou 2.215 km²–incremento de 91%.
Novo
Patamar
Nos últimos seis anos, desde que a
destruição da floresta amazônica caiu abaixo dos 10 mil km² anuais, a taxa tem
oscilado em torno de 4.850 km2 (o triplo da área do município de São
Paulo). Mantido esse ritmo, o Brasil cumpriria sua meta voluntária de reduzir em
80% o desmate até 2020.
Há a suspeita, no entanto, de que o
combate à devastação esbarrou numa espécie de piso. De ora em diante seria
difícil rompê-lo, em especial se o governo se fixar só em ações de repressão,
como a Operação Castanheira, que desarticulou uma quadrilha de grileiros
atuante em Novo Progresso (PA) há oito meses.
Segundo o MMA, após essas prisões o
desmatamento caiu 65% na região da rodovia BR-163.
Além disso, os R$ 17,4 bilhões em
autuações já aplicadas pelo Ibama não querem dizer muita coisa. Estima-se que
apenas 1% dessas multas termina de fato recolhido.
A análise dos gastos do governo
federal feita pelo Infoamazônia indica que o Planalto tem privilegiado as
operações policiais, de comando e controle, como se diz. Em segundo plano
ficaram as medidas voltadas a criar alternativas econômicas menos predatórias
que a exploração ilegal de madeira seguida de desmate e pecuária extensiva.
O PPCDAm foi criado ainda durante a
gestão de Marina Silva no Ministério do Meio Ambiente (MMA), após o recrudescimento
das taxas de desmate em 2004. O plano se organiza em torno de três eixos:
ordenamento territorial e fundiário; monitoramento e controle; fomento a
atividades de desenvolvimento sustentável.
O Infoamazônia classificou dispêndios
do PPCDAm com base nessas rubricas e verificou um padrão no governo Dilma ainda
mais preocupante que a redução de 72% nos gastos. As ações de fomento, como o
apoio ao extrativismo e ao manejo sustentável de florestas para extrair
madeira, foram as que mais sofreram.
No segundo mandato do presidente Luiz
Inácio Lula da Silva (2007-2010), o fomento recebeu R$ 4,58 bilhões. No
quadriênio seguinte, 2011-2014, esse item despencou para R$ 638 milhões, ou 86%
menos.
Quando se consideram os gastos anuais,
a evolução parece ainda mais sombria. Em 2008, o governo Lula gastou R$ 1,9
bilhão com fomento. Em 2014, Dilma ficou em R$ 17 milhões.
As iniciativas de ordenamento, como
revisão de títulos fundiários e cadastramento ambiental rural (CAR), foram
menos atingidas. De R$ R$ 820 milhões (Lula-2), caíram para R$ 436 milhões
(Dilma-1), um corte de 47%.
Não foi só o dispêndio que encolheu. Lula criou 350 mil km2 de áreas
protegidas (unidades de conservação e terras indígenas), segundo o relatório.
Dilma subtraiu 913 km2 de sete unidades.
O item menos afetado pelo corte foi o
de monitoramento e controle, em que se encaixam as ações do Ibama com a Polícia
Federal e a modernização dos sistemas de satélite (Prodes e Deter). A redução
aí alcançou 27%, de R$ 959 milhões para R$ 703 milhões.
Tempo
de bonança
Mauro Oliveira Pires, que já chefiou o
combate ao desmatamento no MMA e atuou como consultor do relatório "A
Política do Desmatamento", afirma que o desmatamento "galopante"
pode voltar, se o governo não fizer mais que fiscalização ambiental.
"Quase nada foi investido em
política florestal, em favorecer o comércio legal de madeira. Paga-se mais
imposto na atividade do manejo florestal do que na de pecuária, e as concessões
florestais estão paralisadas", diz. "Temos de aproveitar o tempo de
bonança, de desmatamento baixo, para fazer as grandes mudanças
estruturais."
"O governo federal parece ter
entrando numa zona de conforto com o desmatamento médio de cerca de 5.000
km2 nos últimos três anos", aponta Adalberto Veríssimo, do Imazon.
"Esquece que o desmatamento da Amazônia brasileira é ainda um dos maiores
do mundo. Está na hora de o Brasil ser mais ousado e propor um desmatamento
inferior a 1.000 km2 em 2020."
Para Adriana Ramos, do Instituto
Socioambiental (ISA), "o fomento a atividades sustentáveis seria o caminho
para uma efetiva mudança no modelo de ocupação de desenvolvimento econômico da
região, e sua baixíssima execução orçamentária demonstra que está longe de ser
uma preocupação ou prioridade para o governo".
Segundo Paulo Barreto, também do Imazon,
"a redução de gasto era previsível, dado que o PPCDAm perdeu o seu
ponto principal, que era uma articulação na Casa Civil para tentar facilitar o
diálogo intra-governo”.
Fonte: Folha
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Amazônia