Todas as provas e alegações das partes
já foram produzidas e, para evitar mais prejuízos ao povo Munduruku, Justiça
pode sentenciar imediatamente a continuidade da demarcação.
O
Ministério Público Federal (MPF) pediu à Justiça Federal que faça o julgamento
antecipado do processo que discute a demarcação da Terra Indígena Sawré-Muybu,
dos índios Munduruku, na região de Itaituba, sudoeste do Pará. É essa região
que o governo federal planeja alagar com a usina hidrelétrica de São Luiz do
Tapajós. A pressão para que a terra não seja demarcada parte do setor elétrico
e a disputa é em torno da simples publicação do Relatório Circunstanciado de
Identificação e Delimitação (RCID), pronto desde o ano de 2013 e que permitiria
somente o avanço da demarcação e não sua conclusão.
A
Fundação Nacional do Índio, a quem cabe conduzir o procedimento, recusa-se a
publicar o relatório, oficialmente por motivos de “orçamento” e “planejamento”,
mas em reunião com os Munduruku, pouco antes de sair da presidência da Funai, Maria
Augusta Assirati confessou publicamente o real motivo: para não atrapalhar o
projeto de barragem do rio Tapajós. “Isso é uma estratégia de governo. O nosso
papel é defender os direitos de vocês, mas têm órgãos dentro do governo que têm
como prioridade, sim, construir a hidrelétrica”, disse.
No
pedido de julgamento antecipado, o MPF ressalta que a publicação do RCID não esgota
o procedimento de demarcação – ao contrário, é o que inicia as contestações e o
exercício do contraditório. Quanto maior a demora, sustenta o procurador da
República Camões Boaventura, mais vulnerabilizados ficam os Munduruku diante
das invasões de garimpeiros e madeireiros. Os próprios índios, diante da
omissão da Funai, promovem desde o ano passado um procedimento de autodemarcação,
em que percorreram o território e detectaram dezenas de pontos com a presença
de invasores retirando madeira. Há ainda um garimpo inteiro, denominado Chapéu
do Sol, com 300 pessoas retirando ouro e causando severos danos ambientais.
O
MPF demonstrou, durante o processo, que vários dos argumentos apresentados oficialmente
pela Funai para justificar a demora na publicação do relatório são inverídicos.
Ao contrário do que afirma a Fundação, existe prazo de 15 dias, definido no
decreto 1.775/96, para a publicação do RCID. A Funai alega ainda que existe uma
programação para as demarcações e que no período entre 2012 e 2015 o planejamento
teria priorizado as demarcações nas regiões centro-sul, sudeste e nordeste,
enquanto que na Amazônia o planejamento prevê políticas de fiscalização e
monitoramento territorial e ambiental.
“Tal
declaração causa espanto e estarrecimento naqueles que confiam nas leis e na
justa e necessária luta pelo reconhecimento de direitos! Fica claro, a partir
do que fora transcrito acima, que há uma infeliz inversão de valores no Estado
brasileiro. Afinal, não cabe à autarquia indigenista o dever legal de delimitar/demarcar
territórios indígenas? Por que razão suplantar as leis, em especial a
Constituição Federal de 1988, e condicionar um direito absoluto a interesses e
atores estranhos ao procedimento normatizado? Só mesmo em um país onde as leis
são descartáveis, como ocorre no Brasil, que um direito constitucionalmente
assegurado é simplesmente negligenciado face a ingerência de interesses
políticos e econômicos”, diz o MPF
Outro
argumento da Funai, de limitações orçamentárias, é contraditado com um parecer
da 6a Câmara de
Coordenação e Revisão do MPF, que comparou os valores orçamentários destinados
à regularização fundiária indígena entre 1988 e 2012 e constatou que na maioria
dos anos analisados, a Funai tinha mais dinheiro autorizado do que foi capaz de
gastar. Portanto, há verbas sobrando para demarcação de terras indígenas.
Além
da continuidade da demarcação, o processo do MPF busca também indenização por
danos morais coletivos em favor dos Munduruku da terra Sawré Muybu, pelas inúmeras
violações de direitos que vêm sofrendo em virtude da omissão da Funai em
garantir o direito fundamental ao território. Se a Justiça concordar com o julgamento
antecipado, o processo não precisará de novas provas ou argumentações e pode
passar imediatamente à fase de sentença.
Veja o pedido de julgamento antecipado na íntegra
Processo
nº 1258-05.2014.4.01.3908
Fonte:
Ministério Público Federal no Pará - Assessoria de Comunicação