Celso
Rodrigues, 42, foi morto a tiros por pistoleiros em Paranhos; em Douradina,
Polícia Civil prende cinco indígenas do acampamento na Terra Indígena Lagoa
Rica/Panambi
Renato
Santana*
Mais um
dia de violência e morte no Mato Grosso do Sul. De acordo com informações do
cacique Nicolau Guarani Kaiowá, da aldeia Paraguassú, Terra Indígena
Takwarity/Ivykwarusu, município de Paranhos, Celso Rodrigues, 42, indígena da
comunidade, foi morto a tiros por pistoleiros enquanto caminhava para o
trabalho, na manhã desta quarta-feira, 12.
“Dois
pistoleiros o tocaiaram enquanto ele passava perto de um córrego. O pai dele
está muito triste e revoltado. Eu também (...) é muito doloroso ver parentes
morrer”, explica o cacique. A Polícia Civil esteve no local para perícia, o
delegado Rinaldo Gomes Moreira pediu abertura de inquérito e o corpo de Celso
foi encaminhado ao Instituto Médico Legal (IML) de Ponta Porã.
A região
de Paranhos, sul do estado, é foco de conflitos entre indígenas e fazendeiros
que mantêm terras em áreas de ocupação tradicional Guarani. No mês de agosto do
ano passado, os Guarani Kaiowá retomaram parte do tekoha – lugar onde se é –
Arroio Korá, em Paranhos. Homologada desde 21 de dezembro
de 2009, a terra se mantinha nas mãos de fazendeiros. Durante visita
de equipe do Ministério Público Federal (MPF), pistoleiros atiraram contra a
comunidade.
Um mês
depois, em setembro, 500 indígenas Guarani Nhandeva retomaram parte dos 4.025
do tekoha Potrero Guasu, a 10 km de Paranhos, declarado como indígena
desde 13 de abril de 2000. Uma criança morreu durante fuga da comunidade em
invasão de pistoleiros.
Em outras
duas ocasiões, os Guarani Kaiowá da Paraguassú foram ameaçados por pistoleiros.
No tekoha vivem 127 famílias num espaço de 2.700
hectares homologados. Os indígenas pediram a revisão da demarcação.
Técnicos da Fundação Nacional do Índio (Funai) realizaram os estudos e os
resultados devem ser publicados no 2º semestre deste ano. “Três fazendas estão
dentro do território que reivindicamos. A principal delas é a Califórnia. Mexem
com agropecuária. Agora vamos enterrar o parente e seguir na luta”, declara o
cacique.
Para a
liderança Otoniel Ricardo Guarani Kaiowá, a situação no Mato Grosso do Sul
ultrapassou todos os limites de controle do Estado e dos governos. “Os
mecanismos de diálogo da Justiça e do Estado como um todo são ineficientes. Já
existe até a vontade dos fazendeiros de sair das áreas, mas mortes ainda
ocorrem”, diz.
Dourados:
mulher grávida presa
Se pela
manhã Celso Rodrigues foi morto, pela tarde a Polícia Civil de Dourados prendeu
cinco indígenas do acampamento Ita’y Ka’agurussu, Terra Indígena Lagoa
Rica/Panambi, município de Douradina. Entre os presos está a cacique Isigeninha
Hirto, grávida, além dos Guarani Kaiowá Samuel Gonçalves, Sérgio da Silva,
Elaine Hilton e João Isnarde.
Ainda não
se sabe os detalhes do mandado de prisão expedido no último dia 28 de maio para
sete indígenas, mas as prisões têm relação com fato ocorrido no dia 13 de
abril, no próprio acampamento. Arnaldo Alves Ferreira, policial militar
reformado, invadiu à cavalo a aldeia efetuando seis disparos contra os
indígenas, acertando na orelha o Guarani Kaiowá João da Silva.
Durante o
ataque, integrantes da comunidade indígena conseguiram desarmar o militar
reformado, defendendo-se dos disparos. Arnaldo foi mantido seguro pela
comunidade, que informou a ocorrência à polícia local. O PM e o indígena ferido
foram encaminhados ao Hospital da Vida, em Dourados. Arnaldo morreu
ainda na ambulância; o Kaiowá ferido foi preso pela polícia, acusado de
homicídio em flagrante. Ainda segue preso. Leia aqui matéria na
íntegra.
O delegado
Marcelo Damaceno, que preside o inquérito, notificou a Funai a apresentar os
indígenas no último dia 6 de junho. Por conta da Marcha Indígena, Quilombola e
Camponesa, que chegou à capital Campo Grande no mesmo dia, a apresentação dos
indígenas ficou para esta quarta-feira, 12. Dos sete indígenas nominados no
mandado de prisão, apenas cinco compareceram ao distrito policial.
Ao receber
voz de prisão, na presença de advogados da Funai e do Cimi, a cacique
Isigeninha se desesperou. Com truculência, conforme os observadores,
investigadores tentaram contê-la e na sequência registraram boletim de
ocorrência contra a indígena por desacato. “O delegado usou de má-fé: pediu
para a Funai apresentar os indígenas para depoimentos, não para prendê-los. Os
Guarani Kaiowá chegaram de boa-fé para colaborar”, critica o advogado Natanael
Santiago Dave, que defenderá os indígenas.
O advogado
informa que os presos foram recolhidos para a Cadeia Pública de Dourados.
“Estamos avaliando qual a medida a ser tomada, precisamos ver o inquérito.
Agora eu acompanho o caso desde o início e não há circunstâncias para
fundamentar as prisões, conforme diz o artigo 312 (Código Penal). O que está lá
juntado não é suficiente para decretar a prisão”, defende.
Otoniel
Guarani Kaiowá é enfático e adianta qual será a forma do povo protestar:
“Enganaram eles, mentiram. Chamaram para depor e prenderam. Todo mundo está revoltado
e vamos fazer retomadas. Não dá mais para aceitar isso. Os Ñanderu
(pajé/xamã) decidiram e está decidido. Vamos buscar nossos direitos”.
Fonte: Cimi