quinta-feira, 7 de agosto de 2014

Esqueça mitos coloniais: o contato dos Xatanawa no Acre põe fim a uma resistência centenária

O que está por trás do contato com os sete indígenas de uma populaçõa que vive de forma autônoma na Amazônia


por Felipe Milanez e Glenn Shepard*

Eles são jovens. Todos saudáveis. Corpos esbeltos, cabelos bem cortados, algumas leves pinturas no rosto. Carregam arcos e flechas bem feitas, bem apontadas, com as penas impecavelmente cortadas. Portam um cinto de casca de envira, que utilizam para segurar um machado, e amarram o pênis nesse mesmo cinto. Imitam animais da floresta com perfeição e cantam belas melodias características das sociedades falantes a língua pano, como as músicas dos Kaxinawa e dos Yawanawa que se pode escutar em CDs. Por trás dessa bela aparição de jovens indígenas que tomaram coragem e decidiram passar a interagir com a violenta sociedade que os cerca, estão terríveis histórias de massacres – um provavelmente recente, e suspeita-se perpetrado por um narcotraficante.  A história do “contato” dos Xatanawa é uma extraordinária história de resistência.

Vídeos e fotografias sobre a chegada de um povo tido como em “isolamento voluntário” em uma aldeia do povo Ashaninka, no Acre, tem provocado comoção nas redes sociais, questionamentos, comentários racistas, e ganharam atenção da imprensa nacional e internacional e da televisão. Dois vídeos divulgados com exclusividade no blog do jornalista Altino Machado romperam com o silêncio da Funai, muda sobre os riscos do contato e apenas expressando-se em notas à imprensa cheias de mistérios. A notícia saiu desde o Jornal Nacional ao britânico Guardian.  Tem merecido manchetes de portais sensacionalistas até revistas científicas como a Science. Quase sempre, a história dos massacres e da resistência dessa população é deixada em um segundo plano para dar espaço ao sensacionalismo, exotismo e colonialismo da relação com essa nação indígena.
Ideias tais como “emergiram da floresta” ou “saíram do isolamento”, “um grupo de índios isolados da civilização” que estão “vindo até nós” contribuem muito mais para esconder o real significado desse processo de aproximação e interação em curso. Nas caixas de comentários há sempre a surpresa pelo machado, terçado, a espingarda, ou a “carteira do Corinthians” portada pelos indígenas. “Será que a FUNAI vai, também, demarcar o Itaquerão?”
Essa perspectiva etnocêntrica contribui para se deixar de lado a responsabilidade dos Estados brasileiro e peruano em protegerem e dar garantias para que essa população possa continuar vivendo livre – e se quiserem, mesmo contra o Estado.
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