Por Carlos Madeiro*
Os
sete assassinatos registrados em Anapu (a 678 km de Belém, no Pará) trouxeram
de volta o clima sangrento à região que ficou mundialmente conhecida após a
morte da missionária Dorothy Stang, em fevereiro de 2005. Além das mortes, há
vários relatos de intimidação por parte de fazendeiros da região. Das vítimas,
ao menos três já haviam relatado ameaça. Trinta pessoas estariam em uma lista e
marcadas para morrer a qualquer momento.
A
guerra pela disputa da terra no local foi denunciada pelo MPF (Ministério
Público Federal) do Pará, após relato da CPT (Comissão Pastoral da Terra). Um
inquérito civil público foi aberto para investigar a violência no local. A
Comissão Nacional de Combate à Violência, ligada à Ouvidoria Agrária Nacional,
também irá ao local no início de dezembro tentar amenizar o clima de medo que
tomou conta da zona rural do município.
As
características das mortes são semelhantes: homens encapuzados chegam em uma
moto, identificam a vítima e atiram com arma de fogo. Os crimes ocorreram
sempre na região urbana. Para a CPT, isso seria uma forma de despistar a
motivação agrária dos crimes.
As
últimas duas mortes ocorreram nos dias 27 e 31 de outubro. A primeira delas
vitimou José Nunes da Cruz Silva, conhecido como Zé da Lapada, um dos primeiros
a ocupar terras na região e que sofrera ameaça antes de morrer, em agosto. A
outra vítima, Cláudio Bezerra da Costa, conhecido como Ivanzinho, também estava
no local desde 2002.
O
conflito em Anapu tem origem na época em que a extinta Sudam (Superintendência
de Desenvolvimento da Amazônia) financiou empresários para projetos de médio e
grande porte no campo. Sem fiscalização, o dinheiro foi desviado, e os projetos
serviram para grilagem de grandes extensões de terras públicas.
Assim,
vieram os pistoleiros que, a mando de grileiros, tentam expulsar colonos pobres
da região. A União tenta hoje, na Justiça Federal, anular os documentos de
terras griladas, mas o processo é lento. O conflito piorou nos anos 2000 depois
do anúncio do governo federal que a usina de Belo Monte seria construída.
Migrantes passaram a chegar na região, e a violência recrudesceu até a morte de
Dorothy.
O
novo ciclo de violência está relacionado a uma nova atração populacional e
também à impunidade do mandante do assassinato de Dorothy, Regivaldo Galvão,
que foi condenado a 30 anos de prisão em 2010, mas nunca cumpriu a pena –
aguarda o recurso em liberdade. Dos outros quatro condenados, dois cumprem pena
em regime semiaberto, um está em prisão domiciliar e Rayfran das Neves Sales,
autor dos disparos, depois de cumprir quase nove anos na cadeia e ter direito à
progressão de regime, foi detido novamente acusado de envolvimento em outro
assassinato.
Na
terça-feira (10), a Ouvidoria Agrária Nacional se reuniu, em Brasília, com
todas as autoridades envolvidas no caso. Durante o encontro, foi apresentada
uma carta da mãe de uma das vítimas acusando a Polícia Civil em Anapu de
direcionar as investigações para desvincular o conflito agrário como motivação.
A
vítima citada foi Jesusmar Batista de Farias, morto em 11 de agosto na oficina
após voltar de visita ao lote 83, o mais tenso da área. Cinco mortes são de
pessoas com ligação ao lote. Para tentar amenizar o clima de tensão, ficou
acertado que a Comissão Nacional de Combate à Violência do Campo vai a Anapu em
caráter de urgência.
“A
comissão vai colher o depoimento dos familiares das pessoas que foram
assassinadas. Elas estão com medo de falar com a polícia, então é importante
alguém de fora que dê confiança”, disse o procurador federal Felício Pontes
Júnior, que participou do encontro.
Outro
ponto acertado foi que as polícias do Pará vão realizar rondas nas fazendas
citadas como pontos de tensão, e uma grande operação será feita para tentar
desarmar moradores e fazendeiros.
Em
nota encaminhada ao UOL, a Secretaria de Segurança Pública do Pará informou que
as sete mortes estão sendo investigadas e que apenas uma teria ligação com
conflito agrária (leia o quadro).
“Nas
demais possibilidades de homicídios, dois estão sob investigação, com motivação
ainda não definida para conflito. Outros três casos já estão esclarecidos e não
apresentam vinculação com crime agrário”, completou. A polícia diz também que
uma das supostas vítimas não teria sido morta, e sim fugido de Anapu.
Fonte: UOL Notícias