Os limites do Cadastro Ambiental Rural (CAR) para territórios tradicionalmente ocupados serão debatidos em seminário em Curitiba, nos próximos dias 17 e 18 de novembro.
Realizado na Faculdade de Direito da
Universidade Federal do Paraná, o evento deve reunir povos e comunidades
tradicionais que debaterão a possibilidade do cadastramento com os responsáveis estaduais e
federais pelo Cadastro.
Representantes do Serviço
Florestal Brasileiro, Secretaria de Extrativismo e Desenvolvimento Rural de
Brasília e a Secretaria de Meio Ambiente e Recursos Hídricos do Paraná devem
participar da atividade.
O CAR é um instrumento criado a
partir do Novo Código Florestal que objetiva o “controle, monitoramento e
combate ao desmatamento das florestas e demais formas de vegetação nativa do
Brasil, bem como para planejamento ambiental e econômico dos imóveis rurais”.
Apesar de o cadastro ser
obrigatório para todos os imóveis rurais do país, há questões que dificultam a
inscrição dos territórios de tradicionalmente ocupados no Sistema Nacional de
Cadastro Ambiental Rural (Sicar). Falta de clareza do instrumento por parte de
povos e comunidades tradicionais e limitações nas normas do CAR relativas a
esses grupos contribuem para que os cadastros não tenham sido realizados.
Apesar da diferenças de uso e conservação entre imóveis rurais individuais e
imóveis rurais coletivos – como no caso de povos e comunidades tradicionais -,
o Sicar trata as duas situações como semelhantes.
A possibilidade de
mostrar como esses grupos constroem seus territórios é o que persegue a Rede
Puxirão de Povos e Comunidades Tradicionais – integrada por benzedeiras,
cipozeiras, faxinalenses, ilhéus, indígenas, pescadores artesanais e
quilombolas - que promove o evento com o apoio de grupos de
pesquisa. A aproximação do esgotamento do prazo para inscrição no CAR em maio
do próximo ano (após ser finalizado em meio de 2015, o prazo foi estendido por
doze meses) traz o desafio de combater o a invisibilidade desses grupos nos
mecanismos do reconhecimento do Estado.
O evento se soma às
lutas que estão sendo realizadas por povos e comunidades tradicionais na última
década, que colocam a defesa dos modos de vidas tradicionais.
A atividade é promovida
pela Rede Puxirão de Povos e Comunidades Tradicionais com o apoio dos
grupos de pesquisa de Direito Socioambiental da PUC-PR, pelo Coletivo de
Estudos sobre Conflitos pelo Território e pela Terra (ENCONTTRA) do curso de
Geografia, pelo projeto de extensão em Políticas Públicas para a Agricultura
Familiar Agroecológica do curso de Direito – ambos da Universidade Federal do
Paraná -, e pela Terra
de Direitos.
Dificuldades de
cadastramento
Os
limites trazidos pelo instrumento para o cadastramento de povos e comunidades
tradicionais é discutida em texto dos
pesquisadores Carlos Marés, Claudia Sonda, Angelaine Lemos.
Os autores apontam a
dificuldade que populações tradicionais como faxinalenses, geraizeiros,
quebradeiras de coco, seringueiros, pescadores e ribeirinhos encontram para o
cadastramento. “Os órgãos ambientais, em geral, não reconhecem as
especificidades e particularidades culturais dos povos tradicionais, por isso
aplicam as leis de forma homogênea sobre realidades e direitos plurais
heterogêneos”, aponta o texto. “Esta luta dos povos tradicionais para cadastrar
seus territórios inicia com o reconhecimento da propriedade ou posse coletiva,
em contradição com a propriedade ou posse individual”.
A mesma dificuldade é
encontrada por indígenas e quilombolas, ainda que assistidos por instituições
como a Fundação Nacional do Índio (Funai) e o Instituto de Colonização e
Reforma Agrária (Incra), respectivamente – no entanto, no caso de quilombolas,
por enquanto, parece não estar definida a instituição responsável para a
contribuição do cadastramento.
“Com essa interpretação
das leis ambientais a ação dos órgãos ambientais acirra conflitos e muitas
vezes estabelecem injustiças e desrespeito aos direitos culturais. Esta prática
é conhecida pelos povos tradicionais que têm dificuldade, muitas vezes, de usar
as terras segundo seus costumes e tradições por imposição dos órgãos ambientais
que, quase sempre, os criminaliza pelas práticas tradicionais. O CAR, como
instrumento de monitoramento, porém, deve se apropriar destas diferenças”.