Enxurrada de lama atinge município de Mariana após rompimento das barragens de rejeitos - Daniel Marenco / Agência O Globo |
A subprocuradora Sandra Cureau, que atua na área de meio ambiente na Procuradoria-Geral da República, criticou o decreto da presidente Dilma Rousseff que classificou como “desastre natural” o rompimento da barragem de Mariana (MG) para que os atingidos possam sacar recursos do FGTS. Para Cureau, a medida poderá ter reflexos nas áreas penal e cível e pode ser usada pela mineradora Samarco, controlada por Vale e BHP, e seus dirigentes para buscar reduzir penas nessas esferas.
– Isso pode ser usado pela Samarco para dizer que não deu causa ao desastre. Isso pode ter reflexo na área penal, também na área cível. Se foi natural, não é responsabilidade de ninguém. A presidente não pode editar um decreto dizendo que um quadrado é redondo, que uma laranja é azul. Esse desastre não é natural – afirmou Cureau, após participar de audiência na Câmara que debate o desastre.
Ela ressaltou que a própria liberação
do FGTS já desvirtua o objetivo do fundo, que não deveria ser usado para
reparar danos que são de responsabilidade da mineradora. Apesar da preocupação,
a subprocuradora disse não acreditar que eventual defesa da Samarco a linha de
que o desastre foi “natural” tenha chance de prosperar no poder Judiciário,
mesmo que seja para reduzir valores de multas que lhe serão impostas.
– Não acredito que nenhum juiz vá cair
nessa, mas é um decreto infeliz. Ainda que a intenção tenha sido boa, é preciso
deixar claro que o FGTS nem é para isso – registrou.
A subprocuradora afirmou que o acordo
de R$ 1 bilhão firmado com a mineradora é apenas para as ações emergenciais e
que os danos devem superar esse valor. Segundo ela, a preocupação de fixar um
valor rápido foi para que já estivesse liberado o dinheiro para as primeiras
fases de reparação dos danos do desastre. Cureau ressaltou que o acordo
substitui medidas como eventual pedido de indisponibilidade de bens da empresa.
O presidente da comissão externa da
Câmara que acompanha o caso, deputado Sarney Filho (PV-MA), também fez críticas
ao decreto e disse esperar que o governo “conserte” o termo usado. Afirmou que
caso isso não ocorra o Congresso poderá aprovar proposição sustando o decreto.
– Esse decreto é uma trapalhada. Não
vamos aceitar isso – afirmou o deputado.
Mais cedo, por meio da rede social
Twitter, o ministério da Casa Civil afirmou que o decreto não exclui a
responsabilidade da empresa pela tragédia. Ressalta que o único objetivo foi
beneficiar os atingidos com saques do FGTS.
“O decreto nº 8572/2015 foi editado
com a intenção de permitir o enquadramento das vítimas do desastre com a
barragem do Fundão em Mariana (MG) ao disposto na lei do FGTS. De forma alguma,
exime as empresas responsáveis pela reconstrução das moradias dos atingidos ou
do pagamento de qualquer prejuízo individual ou coletivo; haja visto o processo
de apuração em andamento e as multas já aplicadas pelo Ibama”, afirmou a Casa
Civil.
A decisão da presidente Dilma Rousseff
de classificar esse tipo de desastre como natural gerou discussões e críticas
na internet. A principal reclamação é de que a mudança dá margem para
desobrigar a Samarco, empresa responsável pela barragem, de arcar com os danos
causados pelo rompimento.
A lei 8.036 de 1990, alterada para
incluir as vítimas do acidente, prevê que o trabalhador tem o direito de sacar
o FGTS em casos de desastre natural desde que residente em áreas atingidas, em
situação de emergência ou em estado de calamidade pública, formalmente
reconhecidos pelo Governo Federal. O valor máximo do saque é de R$ R$ 6.220 e é
opcional.
Fonte: O Globo