Por:
Camila Bomfim*
Dalton Avancini relatou que construtora se comprometeu a pagar R$ 20
mi. Ex-presidente da empresa citou suposta manobra do governo em leilão.
Um dos delatores da Operação Lava Jato, o ex-presidente da
construtora Camargo Corrêa Dalton Avancini relatou em um dos depoimentos de sua
delação premiada que a empreiteira se comprometeu a pagar ao PMDB propina
correspondente a R$ 20 milhões para atuar na construção da usina hidrelétrica
de Belo Monte, no Pará. O empreendimento federal, previsto para ser concluído
em janeiro de 2019, tem um investimento estimado em R$ 28,9 bilhões.
O consórcio que constrói a usina é formado por empresas
investigadas na Lava Jato: Camargo Corrêa, Odebrecht, Andrade Gutierrez, OAS,
Queiroz Galvão e Galvão Engenharia.
Preso em regime domiciliar desde que fechou, em março, o acordo de
delação premiada com a Justiça Federal do Paraná, Avancini contou à Polícia
Federal (PF) que, depois de ter sido formado o consórcio de dez empresas que
ergueria Belo Monte, o então diretor de Energia da Camargo Corrêa, Luiz Carlos Martins,
o informou sobre uma “contribuição” ao PMDB. O depoimento estava sob sigilo
desde 14 de março.
De acordo com o delator, Martins lhe disse que “houve um
compromisso de que haveria uma contribuição na ordem de 1% do valor do
empreendimento para o PMDB”. Avancini não detalha quem firmou o acordo de
pagamento da propina, mas destaca que foi comunicado de que o suborno seria
“proporcional à participação de cada empresa” na obra.
“A Camargo [Corrêa] detinha 15% da participação junto a obra, o
que resultaria em uma contribuição de R$ 20 milhões, o que deveria ser pago ao
longo do empreendimento”, contou o ex-presidente da construtora, que se
desligou do comando da empresa por conta de seu envolvimento no esquema de
corrupção que atuava na Petrobras.
Avancini também não mencionou nomes de políticos do PMDB que
possam ter sido beneficiados com a propina. Ele afirmou que não se lembrava de
nomes de parlamentares, funcionários públicos ou integrantes do governo que
estivessem envolvidos no suposto esquema de corrupção montado para garantir às
empreiteiras o contrato de construção da hidrelétrica da Região Norte, que terá
potência de 11.233 MW e deve gerar 4.571 MW médios.
O delator, entretanto, observou aos policiais federais, sem citar
nomes, que ouviu falar que um operador recebia os valores em nome do PMDB. No
fim do depoimento, Avancini foi questionado pela PF sobre se as “contribuições”
da Camargo Corrêa ao PMDB foram “espontâneas”. Ele respondeu que, na opinião
dele, as propinas eram uma “espécie de exigência indevida a fim de que os
interesses da empresa não fossem prejudicados”.
À TV Globo, o PMDB negou, por meio de sua assessoria, todas as
acusações de Dalton Avancini e afirmou que a legenda “jamais participou desse
tipo de acordo”. “O PMDB não autorizou quem quer que seja a utilizar o nome do
partido nesse tipo de transação”, ressaltou a assessoria da sigla.
A TV Globo não conseguiu localizar Luiz Carlos Martins ou a
assessoria da Camargo Corrêa.
Nesta quarta (24), o Tribunal de Contas da União (TCU) acolheu um
pedido do Ministério Público para investigar possíveis irregularidades no uso
de recursos federais na implantação da usina de Belo Monte. Os procuradores da
República querem averiguar se a prática de formação de cartel de empreiteiras e
pagamento de propinas já identificadas na na Petrobras também se estendeu às
empresas estatais do setor elétrico.
Consórcio
Em meio ao depoimento à Polícia Federal, Dalton Avancini relatou
uma suposta manobra do governo federal para escantear grandes construtoras brasileiras
do leilão que selecionou as empresas que iriam erguer o empreendimento
hidrelétrico. Conforme o delator, a intervenção do Palácio do Planalto permitiu
a vitória no leilão de um consórcio formado por empresas de pequeno porte que,
segundo ele, não teriam tradição no setor de energia.
Na delação, o ex-presidente da empreiteira afirmou que a Camargo
Corrêa havia desistido de participar do leilão de Belo Monte porque verificou
que o negócio não era economicamente viável. No entanto, destacou Avancini,
depois de comunicar que não concorreria ao contrato da usina do Pará, “houve
uma reação por parte do governo, o qual tomou a iniciativa de formar um outro
grupo”.
Segundo ele, a movimentação do Executivo federal “soou estranha ao
mercado”, em razão de o projeto de Belo Monte ser considerado, tecnicamente,
bastante complexo. Ainda conforme o delator, o consórcio integrado pela
construtora Andrade Gutierrez ofereceu menor preço e acabou vencendo o leilão.
Avancini destacou aos policiais que o resultado do processo gerou no mercado “a
impressão de que o governo pretendia dar uma lição em algumas grandes
empresas”, como Camargo Corrêa e Odebrecht”.
Concluído o leilão, contou o delator, tiveram início, por parte do
consórcio vencedor, negociações para que Camargo Corrêa, Odebrecht e Andrade
Gutierrez atuassem na fase de execução da usina hidrelétrica.
Avancini comentou que, na opinião dele, a proposta de adesão das
grandes empreiteiras ao projeto se deu pela incerteza de que o grupo de
empresas montado pelo governo conseguiria construir o empreendimento bilionário
no meio da Amazônia. Para ele, as empresas que venceram o leilão não estudaram
o projeto como haviam feito a Camargo Corrêa e a Odebrecht.
O ex-presidente da Camargo Corrêa, entretanto, disse aos policiais
federais desconhecer qualquer acerto na licitação da obra da usina de Belo
Monte.
A reportagem procurou a assessoria do Palácio do Planalto para
falar sobre as acusações do ex-dirigente da empreiteira, mas até a última
atualização desta reportagem não havia obtido resposta.
A TV Globo não conseguiu contato com as construtoras Andrade
Gutierrez e Odebrecht, nem com o consórcio responsável pelas obras de Belo
Monte.
Adhemar Palocci
No momento em que explicava aos delegados da PF quem havia
intermediado o pagamento do suborno ao PMDB, Dalton Avancini ressaltou que o
diretor de Planejamento e Engenharia da Eletronorte, Adhemar Palocci, teria
“algum envolvimento com o recebimento das propinas” de Belo Monte. Conhecido
como “Paloccinho”, Adhemar é irmão do ex-chefe da Casa Civil Antonio Palocci.
De acordo com Avancini, o ex-diretor de energia da Camargo Corrêa,
Luiz Carlos Martins, poderia dar detalhes sobre o suposto envolvimento de
Adhemar Palocci com a propina prometida ao PMDB.
O ex-presidente da empreiteira investigada na Lava Jato, contudo,
disse que não tinha “conhecimento” de envolvimento do ex-ministro da Casa Civil
com “o pagamento de propinas ou contribuições” ao PMDB.
A TV Globo não conseguiu localizar Adhemar Palocci ou a assessoria
da Eletronorte.
Fonte: G1