Por Leonardo Sakamoto*
A auditora fiscal Vera
Lúcia Albuquerque pediu exoneração, na manhã desta quinta (11), da chefia da
Secretaria Nacional de Inspeção (SIT) do Trabalho do Ministério do Trabalho e
Emprego – cargo que ocupava há um ano e dez meses. O órgão é responsável por
verificar o cumprimento da legislação trabalhista em todo o país e tem, entre
outras atribuições, a responsabilidade por fiscalizar denúncias de escravidão
contemporânea, de trabalho infantil e de fraudes no FGTS.
Vera desempenhou um
papel importante na articulação política pela aprovação da proposta de emenda
constitucional que prevê o confisco de terras em que trabalho escravo for
encontrado. A PEC 438/2001 passou em segundo turno na Câmara dos Deputados, em
maio deste ano, e retornou ao Senado sob o número 57A/1999.
“Estou indignada com o
profundo desrespeito à inspeção do trabalho”, afirmou em entrevista a este
blog. Vera reclama do risco de mudança na política do Ministério do Trabalho e
Emprego. “Há uma tentativa de defender o empregador a qualquer preço. O
ministério tem que estar a serviço da sociedade e não apenas de empregadores ou
de interesses pessoais e partidários”, afirma. “Estão tentando colocar um
cabresto político na inspeção do trabalho.”
“Procurar o ministro
para tentar mostrar a ele os problemas não adianta, porque ele nunca aparece”,
reclama. Ela também alerta para o risco de partidarização da fiscalização do
trabalho. Uma disputa estaria ocorrendo entre o ministro Brizola Neto e o
ex-ministro Carlos Lupi pelo controle do PDT.
Vera afirma que há uma
tentativa de enfraquecimento da inspeção do trabalho no país. E que isso passa
pela fragilização da estrutura e por trazer pessoas por motivações políticas
para cargos que exigiriam conhecimento técnico. Por exemplo, ela teme que o seu
cargo seja ocupado não por um auditor fiscal de carreira, mas por alguém que
não tenha conhecimento sobre o assunto. Questiona qual seria o real interesse
de colocar pessoas que não dominam a legislação, normas e instruções para essas
funções.
Em uma carta enviada a
auditores fiscais de todo o Brasil, ela cita o artigo sexto da Convenção número
81 da Organização Internacional do Trabalho, que diz respeito à inspeção do
trabalho, que deve ser independente de “qualquer mudança de governo ou de
qualquer influência externa indevida”. Para ela, a gota d’água para a decisão
foi a nomeação de uma pessoa para a Chefia da Fiscalização do Trabalho na Superintendência
Regional do Trabalho e Emprego do Rio de Janeiro sem que houvesse consulta à
SIT, como era de praxe em gestões dos outros ministros. Esta não teria sido a
única vez que a Secretaria foi ignorada na gestão de pessoal. Solicitou-se à
cúpula do ministério que a decisão fosse revista, mas não teria havido
resposta.
“Não admito que a
inspeção do trabalho seja desrespeitada como está acontecendo nessa gestão e o
meu gesto é uma demonstração disso”, afirma Vera. Ela ficará no cargo até que a
exoneração seja publicada pelo Diário Oficial e retornará às suas funções de
auditora fiscal do trabalho no Rio de Janeiro.
A Secretaria Geral da
Presidência da República e a Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da
República, com as quais a SIT possui um trabalho estreito por conta dos
programas de combate ao trabalho escravo e de promoção do emprego decente na
construção civil e no setor sucroalcooleiro, também estão sendo informadas da
exoneração.
A Secretaria de Inspeção
do Trabalho é responsável por gerir o cadastro de empregadores flagrados com
mão de obra escrava, a conhecida “lista suja”. O instrumento é considerado um
dos principais no combate à escravidão, sendo usado pelo setor empresarial para
gerenciamento de riscos de suas cadeias produtivas. Por isso, a SIT tem sofrido
ataques por parte de empregadores insatisfeitos com bloqueios comerciais e de
financiamento e de seus representantes políticos desde a criação do cadastro em
2003. Recentemente, houve fortes pressões por conta da inclusão de nomes famosos
na “lista suja”, como a MRV Engenharia, uma das principais executoras do
programa “Minha Casa, Minha Vida”. A empresa se encontra excluída da lista por
decisão liminar.
O ministro Brizola Neto
não foi localizado nesta manhã para comentar o pedido de saída e as afirmações
pela demissionária secretária nacional.
Sua equipe foi informada
pela reportagem sobre a decisão e, em seu gabinete, a notícia provocou
surpresa. “Só podemos comentar em cima de fatos e não fomos informados
oficialmente ainda”, afirmou Fernando Imediato, que faz parte da equipe do
ministro e afirmou que encaminharia a questão. Este blog e a Repórter Brasil
enviaram uma série de perguntas a Brizola Neto, solicitando que o retorno fosse
o mais breve possível.
*Com Daniel Santini da Repórter Brasil. Publicado originalmente no