O julgamento pelo STF está
previsto na agenda de 3 de dezembro. Entenda o que está em jogo.
A Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 3239 voltou
à pauta
de julgamento do Supremo Tribunal Federal (STF) da próxima
quarta-feira, 3 de dezembro.
A ADI 3239 foi proposta
em 2004 pelo então Partido da Frente Liberal
- atual Partido Democratas (DEM) - objetivando a declaração de
inconstitucionalidade do Decreto n.º
4.887/2003 que regulamenta o procedimento para a titulação as
terras ocupadas por comunidades dos quilombos.
A ADI faz parte de uma
ofensiva de interesses conversadores que tentam obstaculizar a efetividade do
direito dos quilombolas à propriedade de suas terras. A eventual
declaração de inconstitucionalidade do decreto pode agravar um cenário que já é
bastante preocupante. Até hoje, somente 5,7% das famílias quilombolas no Brasil
contam com terras tituladas e dessas algumas apenas parcialmente
regularizadas.Os mais 1.400 processos em curso no Incra podem ficar paralisados
no vácuo das regras para continuidade dos procedimentos.
• Conheça o texto do Decreto
n.º 4.887/2003
Julgamento iniciado em 2012
Em 18 de abril de 2012, foi
iniciado o julgamento da ADI com o voto do então ministro Antônio Cezar Peluso,
relator, pela inconstitucionalidade do decreto questionado. O relator
entretanto, “em respeito ao princípio da segurança jurídica e aos cidadãos que,
da boa-fé, confiaram na legislação posta e percorreram o longo caminho para
obter a titulação de suas terras desde 1988”, decidiu modular os efeitos da
decisão para “declarar bons, firmes e válidos” os títulos de tais áreas,
emitidos até agora, com base no Decreto 4.887/2003.
Foto: Lúcia Andrade |
O pedido de vista da
ministra Rosa Weber interrompeu a sessão de julgamento, que agora retorna à
pauta do STF.
Constitucionalidade do
Decreto
Dentre as alegações do DEM
está a de inconstitucionalidade formal do decreto por inexistência de lei que
lhe confira validade. Questiona-se também a adoção do critério de auto
definição para identificar as comunidades remanescentes de quilombos e da
possibilidade de se desapropriar áreas para garantir a regularização das terras
quilombolas.
Já a constitucionalidade do
decreto é defendida pela Advocacia Geral da União, pela Procuradoria Geral da
República e por diversas ONGs e órgãos do governo que requereram a entrada no
processo como amicus curiae como a Sociedade Brasileira de Direito Público,
Conectas Direitos Humanos, Instituto Pró-Bono, Centro pelo Direito à Moradia
contra Despejos, Justiça Global, Instituto Socioambiental, Instituto Polis,
Fetagri-Pará, Procuradoria Geral do Estado do Pará e a Procuradoria Geral do
Estado do Paraná.
A constitucionalidade do
Decreto 4.887/2003 vem sendo reconhecida pelo Poder Judiciário em outras
instâncias. Foi o que aconteceu, entre outros, no julgamento da Arguição de
Inconstitucionalidade nº5005067-52.2013.404.0000. Em dezembro de 2013, Corte
Especial do Tribunal Regional Federal da 4ª Região votou pela constitucionalidade do decreto:
“3. Como direito fundamental
que é, o art. 68 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias guarda
aplicabilidade imediata. 'Princípio é imperativo. Princípio está no mundo
jurídico. Princípio é mais do que regra. Não teria sentido exigir
complementação para um princípio que é mais do que uma regra e que contém a
própria regra'. (Desembargador Paulo Afonso Brum Vaz).
4. Assim não fosse, ad
argumentandum tantum, '...ainda o Decreto 4.887/2003 estaria a regulamentar a
Convenção 169 da OIT. Portanto, ele não seria um decreto autônomo, ele estaria
a regulamentar a convenção 169 e portanto não sofreria dessa eiva de
inconstitucionalidade. Da mesma forma, ele estaria a regulamentar o art. 21 do
Pacto de São José da Costa Rica, que a Corte vem aplicando de uma forma já
agora em inúmeros casos a situações semelhantes à dos autos, não só com relação
à terra dos índios, mas também a terras ocupadas, por exemplo, no Suriname por
negros que fugiam do regime de plantation e que portanto têm uma
situação fática e jurídica em tudo semelhante à dos nossos quilombolas
visibilizados pela Constituição de 88.' (Dr. DOMINGOS SÁVIO DRESH DA SILVEIRA,
citando FLÁVIA PIOVESAN, em seu parecer, evento 46, NTAQ1).
5. O art. 68 do ADCT contém
todo o necessário à concretização de seu teor mandamental, absolutamente
desnecessária qualquer 'complementação', que consistiria apenas em repetir
aquilo que a Lei Maior já diz.
6. A desapropriação, na
hipótese, já está regulamentada em lei, que prevê o uso do instituto por
interesse social, ausente qualquer vedação a seu uso no alcance do escopo
constitucional inarredável de preservar e proteger o quilombo; ou o
remanescente de quilombo.
7. Arguição de
inconstitucionalidade que se rejeita”.
A Comissão Pró-Índio de São
Paulo se soma aos quilombolas, às ONGs e aos juristas que defendem a
constitucionalidade do Decreto 4.887/2003 e a efetividade dos direitos
garantidos pela Constituição Federal às comunidades quilombolas.
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