Uma dinâmica verificada ao longo de
quase três anos de várias iniciativas e políticas públicas ambientais,
especialmente no nível estadual, de implementação do CAR é a sobreposição de
terras. A sobreposição traz de maneira mais profunda a interposição de formas
de uso da terra, de acordo não só com as categorizações agrárias e jurídicas,
mas, principalmente, consoante com os grupos sociais e culturais que nela
vivem. Por ter uma característica auto-declarada, de delimitação geoespacial e
por abrangência em polígonos (área média da propriedade por pontos espaciais
específicos e fixados em um terreno), o CAR acaba trazendo uma radiografia dos
problemas de sobreposições de terras na Amazônia, uma realidade que o Programa
Terra Legal, do Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA), desde sua criação
em 2009, vem tentando resolver ainda sem muito sucesso.
Na área da Rodovia Transamazônica e da
BR-163, de ocupação teoricamente planejada em vários momentos de atuação e
incidência direta do Governo Federal na Amazônia brasileira, isso tem sido
notado. Entretanto, a não ser pela ação dos movimentos sociais, dos assentados,
e de comunidades tradicionais em geral, a sobreposição é muito pouco debatida
em seu caráter político e de justiça social, ambiental e agrária sob o prisma
do CAR. Quando se nota o grande emaranhado dominial, ou a inexistência
documental dele, pela constatação, por exemplo, de que um território quilombola
não homologado está sobreposto pela posse de uma ou várias famílias ou de uma
propriedade particular, a primeira reação é pensar que o CAR nos ajuda a
visualizar e a “espacializar” o problema. Isso pode até ser verdade. Contudo, é
importante lembrar que a espacialização desses conflitos e de suas
consequências para a própria reprodução social e cultural de vários grupos já é
por eles vivida cotidianamente, e não é o CAR que desvela isso. O CAR registra
o processo, por vezes, com incongruências a depender de quem mapeia.