Planalto
refaz cálculos e empurra demandas para 2014. Distorções entre as carreiras impedem
concessão de aumento linear a servidores, que prometem greve geral a partir de
hoje
O
baixo crescimento da economia em 2011 e neste ano e o agravamento da crise internacional,
que compromete o desempenho de 2013, derrubaram as previsões do governo petista
e colocaram a presidente Dilma Rousseff numa sinuca de bico para enfrentar as
pressões dos servidores públicos federais, que reclamam da falta de reajuste há
dois anos. Eles prometem greve geral a partir de hoje.
Depois
de conceder aumentos salariais altos em curto período de tempo, que chegaram a
mais de 100% para algumas carreiras, entre 2008 e 2010, fiando-se nos bons
resultados do Produto Interno Bruto (PIB) — e na sua continuidade —, o governo
já concluiu que não haverá recursos no Orçamento de 2013 para bancar aumentos
generalizados, como o esperado. Por isso, pretende empurrar as demandas para
2014. Uma das prioridades da proposta orçamentária em elaboração é aumentar os
investimentos públicos para fazer rodar a economia mais rapidamente, até para
dar musculatura para Dilma se reeleger em 2014.
A
revisão para baixo da expectativa de crescimento do PIB para 2012, que influi
também no resultado de 2013, ameaça, inclusive, o reajuste do pessoal do
Judiciário no ano que vem. Com a elevação de 20,3% dos vencimentos dos
ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), reatroativa a janeiro deste ano, em
curso no Congresso, o governo espera segurar as pressões vindas dos demais
servidores do Judiciário. Por enquanto, somente os professores e os militares
deverão estar na proposta do Orçamento de 2013 que o Palácio do Planalto
enviará ao Congresso até 31 de agosto.
O
governo enfrenta um outro problema. Os aumentos diferenciados concedidos entre
2008 e 2010, que privilegiaram principalmente as chamadas carreiras de elite do
Executivo, elevando significativamente os salários iniciais, agravaram ainda
mais as distorções que já havia entre as categorias. Por isso, reajuste em 2013
para esses servidores, como da área jurídica, auditoria, ciclo de gestão e
agências reguladoras, está descartado.
Qualquer
ganho — mesmo o equivalente à inflação de um ano — para esses cargos eleva
ainda mais a remuneração inicial e final e acirra o abismo remuneratório em
relação aos demais servidores, mantendo a insatisfação do funcionalismo.
"O Brasil está perdido. É uma armadilha em que nós entramos e praticamente
sem saída. A única coisa que o governo pode fazer é travar o processo de
reajuste, mas isso significa aumentar as pressões", afirma o economista
Raul Velloso, especialista em contas públicas.
Abismo
salarial
Um
professor-cirurgião de universidade federal, com doutorado e que desenvolve
pesquisas e cirurgias para a cura de doenças, como do coração e o câncer,
ganha, no fim de carreira, R$ 11,4 mil, salário bem menor que o inicial de um
advogado da União ou de um procurador federal, que precisa comprovar apenas
dois anos de experiência na advocacia para começar recebendo R$ 15 mil, ou de
um gestor, que não requer experiência e tem remuneração inicial de R$ 13,6 mil.
A
comparação com o Legislativo é ainda mais gritante. Os recém-aprovados no
concurso do Senado para o cargo de técnico legislativo, que exigiu apenas o
nível médio, vão começar embolsando R$ 13,8 mil, mais que um cientista com
doutorado em fim de carreira. Em relação ao analista legislativo, que ganha
inicialmente R$ 18,5 mil, a diferença é ainda maior. Sem contar o
auxílio-alimentação, que é o dobro do pago pelo Executivo, e outros benefícios.
Esses
salários não incluem as gratificações por retribuição no exercício de algum
cargo de chefia que, no serviço público, não obedecem necessariamente à data de
ingresso. Mesmo quem tem um ou dois anos de casa apenas já recebe uma dessas
funções, aumentando ainda mais o salário. Os técnicos-administrativos nas
agências reguladoras, de nível médio, têm salário inicial de R$ 4,76 mil, o
dobro de um analista da Previdência Social, cargo que exige curso superior e
com atribuição de analisar o processo de concessão de aposentadorias e de
outros benefícios aos trabalhadores brasileiros.
Paliativo
Com
a Medida Provisória 568, que beneficia no total 937 mil servidores ativos e
inativos, a ministra do Planejamento, Miriam Belchior, espera acalmar os 420
mil servidores ativos e inativos das carreiras do Plano Geral de Cargos do Poder
Executivo (PGPE), Previdência, Saúde, Trabalho e correlatas. Os analistas, de
nível superior, terão reajuste entre 21,4% e 31%, elevando o salário final de
R$ 5,7 mil para R$ 7 mil — total de 84 mil. Entre eles, estão os de infraestrutura.
O
problema é que esse valor — obtido só no fim da carreira — está muito abaixo do
pago aos demais de carreiras similares do Executivo e também do Judiciário e do
Legislativo. Até mesmo dentro do Executivo, os analistas que têm cargos de
engenheiro, arquiteto, economista e geólogo estão com salário final maior, de
R$ 10.209.
"Essas
disparidades ocorrem porque o Executivo pulverizou muito as c
arreiras e ganham
mais as que têm mais força de barganha", afirma Marcelo Caldas, membro da
executiva da Associação Brasileira dos Servidores Públicos Federais Técnicos de
Nível Superior (Abratec). "O governo deveria nivelar o vencimento das
carreiras de nível superior para que possamos trabalhar nos próximos anos com
aumento linear para todos", afirma Caldas.
Escolas
técnicas também param
Os
servidores técnicos administrativos e os professores dos institutos federais de
educação tecnológica oficializam hoje um comando nacional de greve. Formado por
representantes estaduais, o órgão será responsável pelas negociações com o
governo, em conjunto com o movimento dos professores das universidades
federais, que completaram ontem um mês parados, em 55 instituições. A categoria
reivindica, entre outros pontos, carga horária de 30 horas para os técnicos
administrativos. Outras 31 entidades representativas do conjunto dos servidores
federais elaboraram uma pauta unificada que serviu de referência para a
negociação com o governo.
Fonte:
Correio Braziliense