terça-feira, 16 de julho de 2013

PLP 227: Dedinhos deles, mãos de Dilma


Ausentes da reunião entre lideranças indígenas e a presidente Dilma Rousseff na última semana, o Advogado Geral da União Luis Inácio Adams e a Ministra da Casa Civil Gleisi Hofmann, teriam atuado diretamente para a aprovação do regime de urgência do Projeto de Lei Complementar 227/2012 na Câmara dos Deputados. O líder do governo na Câmara, Arlindo Chinagli (PT-SP), também teria tido um papel destacado na reunião, falando em nome do governo.

PLP 227/2012 regulamenta o § 6º do art. 231, da Constituição Federal de 1988 definindo “bens de relevante interesse público” da União para fins de demarcação de Terras Indígenas. Pelo texto, fica estabelecido ainda que o “marco temporal das ocupações indígenas é a data da promulgação da Constituição Federal, qual seja, 5 de outubro de 1988”, o que impediria novas demarcações pelo país. Além disso, terras indígenas já demarcadas poderiam ser completamente suprimidas, já que pelo texto proposto ocupações e inúmeras atividades econômicas não indígenas seriam “ressalvados”, se enquadrando como “bens relevantes de interesse público da União”. Ficariam nessa condição: “as terras de fronteira, as vias federais de comunicação, as áreas antropizadas produtivas que atendam a função social da terra nos termos do art. 5º, inciso XXIII da Constituição Federal de 1988, os perímetros rurais e urbanos dos municípios, as lavras e portos em atividade”.

Para se ter uma ideia da gravidade do ataque, praticamente todas as terras indígenas na Amazônia Legal já sofreram algum tipo de concessão minerária pelo Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM), mesmo sem regulamentação constitucional para isso. Com o projeto, essas áreas poderão ser consideradas de “interesse público da União”. Veja no mapa abaixo:
Em amarelo, as terras indígenas delimitadas na Amazônia Legal. As áreas em verde são unidades de conservação. Os quadriláteros pretos são títulos de concessões minerárias em vários estágios (clique na figura para ampliá-la)

Além disso, áreas já desmatadas por fazendeiros, grileiros, madeireiras, posseiros e assentados, apresentadas no texto como “áreas antropizadas produtivas” também ficariam submetidas ao “novo” regime jurídico que, ao regulamentar apenas um parágrafo, acaba por afrontar a integralidade de todo o Capítulo 8 da Constituição, que determina em seu artigo 231:

Art. 231. São reconhecidos aos índios sua organização social, costumes, línguas, crenças e tradições, e os direitos originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam, competindo à União demarcá-las, proteger e fazer respeitar todos os seus bens.

§ 1.º São terras tradicionalmente ocupadas pelos índios as por eles habitadas em caráter permanente, as utilizadas para suas atividades produtivas, as imprescindíveis à preservação dos recursos ambientais necessários a seu bem-estar e as necessárias a sua reprodução física e cultural, segundo seus usos, costumes e tradições.

§ 2.º As terras tradicionalmente ocupadas pelos índios destinam-se a sua posse permanente, cabendo-lhes o usufruto exclusivo das riquezas do solo, dos rios e dos lagos nelas existentes.

§ 3.º O aproveitamento dos recursos hídricos, incluídos os potenciais energéticos, a pesquisa e a lavra das riquezas minerais em terras indígenas só podem ser efetivados com autorização do Congresso Nacional, ouvidas as comunidades afetadas, ficando-lhes assegurada participação nos resultados da lavra, na forma da lei.

§ 4.º As terras de que trata este artigo são inalienáveis e indisponíveis, e os direitos sobre elas, imprescritíveis.

§ 5.º É vedada a remoção dos grupos indígenas de suas terras, salvo, ad referendum do Congresso Nacional, em caso de catástrofe ou epidemia que ponha em risco sua população, ou no interesse da soberania do País, após deliberação do Congresso Nacional, garantido, em qualquer hipótese, o retorno imediato logo que cesse o risco.

§ 6.º São nulos e extintos, não produzindo efeitos jurídicos, os atos que tenham por objeto a ocupação, o domínio e a posse das terras a que se refere este artigo, ou a exploração das riquezas naturais do solo, dos rios e dos lagos nelas existentes, ressalvado relevante interesse público da União, segundo o que dispuser lei complementar, não gerando a nulidade e a extinção direito a indenização ou a ações contra a União, salvo, na forma da lei, quanto às benfeitorias derivadas da ocupação de boa-fé.

§ 7.º Não se aplica às terras indígenas o disposto no art. 174, §§ 3.º e 4.º”

Com o regime de urgência, o projeto pode ser votado  a qualquer momento e diretamente no Plenário, sem passar por comissões por onde antes deveria tramitar: Comissões de Agricultura, Pecuária, Abastecimento e Desenvolvimento Rural; Direitos Humanos e Minorias e Constituição e Justiça e de Cidadania. É autor do mesmo o deputado Homero Pereira (PSD-MT), sendo relator o deputado Moreira Mendes (PSD-RO), ambos ruralistas. 

Como até o momento a ação dos ministros de Dilma de faltar ao encontro com os indígenas e de agir em prol da aprovação do PLP 227não ganhou qualquer repreensão do governo, só se pode concluir que a presidente perdeu o controle de seus ministros e de seu líder na Câmara. Ou então, que a mão da presidente está por trás da medida de bater a foto com os indígenas e de tira-lhes a terra.

Mas, se ainda restou dúvida, esta foi resolvida  em recente nota, quando os ministros Maria do Rosário (Direitos Humanos) e Gilberto Carvalho (Secretaria Geral), ressaltaram que “o governo federal possui, no que tange à questão indígena, uma política unitária, que é resultado da convergência de diferentes pontos de vista, sob a direção da presidenta Dilma Rousseff.”
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