terça-feira, 9 de julho de 2013

Um em cada dez integrantes da ‘lista suja’ tem terra embargada pelo Ibama

Maioria das terras de proprietários com nomes na ‘lista suja’ do trabalho escravo embargadas pelo Ibama estão na Amazônia e servem à pecuária

Por Stefano Wrobleski*
Exploração de trabalho escravo e devastação do meio ambiente continuam caminhando juntas no Brasil.  A relação foi reforçada pela última atualização da “lista suja” do trabalho escravo, como é conhecida a relação oficial de empregadores flagrados explorando escravos mantida pelo Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) e pela Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República (SDH/PR).  Das 142 empresas e empregadores incluídos na última sexta-feira, dia 28, 18 também estão no cadastro de proprietários de terras embargadas pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama).  Com a atualização semestral, a “lista suja” atingiu o número recorde de 504 nomes, dos quais 58 também cometeram crimes ambientais, conforme levantamento feito pela Repórter Brasil a partir do cruzamento com dados do Ibama.  Praticamente um em cada dez integrantes do cadastro da escravidão é também um infrator ambiental, quase a mesma proporção da última atualização, em dezembro de 2012.
Confira no mapa abaixo onde estão as 19 áreas embargadas dos 18 proprietários com infrações ambientais recém-incluídos na “lista suja” do trabalho escravo:

  A “lista suja” vem sendo atualizada semestralmente, desde o final de 2003, e reúne empregadores flagrados pelo poder público na exploração de mão de obra em condições análogas à escravidão.  A “lista suja” tem sido um dos principais instrumentos no combate a esse crime, através da pressão da opinião pública e da repressão econômica.  Após a inclusão do nome do infrator, instituições federais, como o Banco do Brasil, a Caixa Econômica Federal, o Banco da Amazônia, o Banco do Nordeste e o BNDES suspendem a contratação de financiamentos e o acesso ao crédito.  Bancos privados também estão proibidos de conceder crédito rural aos relacionados na lista por determinação do Conselho Monetário Nacional.  Quem é nela inserido também é submetido a restrições comerciais e outros tipos de bloqueio de negócios por parte das empresas signatárias do Pacto Nacional pela Erradicação do Trabalho Escravo – cujo faturamento representa cerca de 30% do Produto Interno Bruto brasileiro.
O nome de uma pessoa física ou jurídica é incluído na relação depois de concluído o processo administrativo referente à fiscalização dos auditores do governo federal e lá permanece por, pelo menos, dois anos.  Durante esse período, o empregador deve garantir que regularizou os problemas e quitou suas pendências com o governo e os trabalhadores.  Caso contrário, permanece na lista.
Amazônia
Dentre as 19 terras embargadas de 18 empregadores, 14 estão dentro da Amazônia Legal.  Entre elas está a Fazenda Três Rios, do pecuarista Aldo Pedreschi, vice-presidente da Associação Rural de Ribeirão Preto (ARRP).  Ele foi reinserido na “lista suja” do trabalho escravo por decisão da Justiça, que cassou a liminar que o mantinha fora do cadastro desde 2005, quando foi incluído por uma operação que libertou oito trabalhadores de sua propriedade dois anos antes.  A terra, que fica no município mato-grossense de Canarana, foi embargada em 2009 pelo desmatamento ilegal de 414 hectares, uma área equivalente a 580 campos de futebol.
O crime colocou Aldo entre os 75 maiores desmatadores e madeireiros da região de Cuiabá (MT) e o Ibama multou-o em R$ 2,6 milhões (valores corrigidos).  Procurado para comentar o caso, um funcionário da ARRP informou que Aldo estava viajando e não poderia atender a reportagem.  De acordo com o portal “Às Claras”, o pecuarista fez doações em 2002, 2008 e 2010 a Welson Gasparini, ex-prefeito de Ribeirão Preto e deputado estadual em São Paulo pelo PSDB desde 2011, quando foi empossado depois que Bruno Covas, seu titular, foi nomeado secretário de Estado do Meio Ambiente.  Somadas, as doações chegam a R$29 mil reais em valores corrigidos.
Outro pecuarista notável é o deputado Urzeni Rocha (PSDB-RR), que ocupa o cargo desde 2012, quando a titular Teresa Surita (PMDB) deixou o mandato para assumir a prefeitura da capital Boa Vista (RR). Em 2003, a Fazenda J.K., propriedade sua que fica no município de Mucajaí, a 60 quilômetros a capital de Roraima, foi multada pelo Ibama em R$ 44 mil por infrações da flora, em valores atuais. Já em 2010, 26 pessoas, incluindo adolescentes, foram libertadas da Fazenda Paraíso, uma propriedade sua no município de Cantá, que fica a 30 quilômetros da capital de Roraima.
Nela, a única fonte de água para os trabalhadores beberem, tomarem banho e cozinhar era a de um córrego em que animais faziam suas necessidades. Além disso, a comida fornecida era descontada dos salários dos empregados, que se endividavam mês após mês sem conseguir ir embora, já que não havia qualquer meio de transporte e a cidade mais próxima ficava a seis a oito horas de caminhada dentro da floresta. Procurado, um assessor do deputado informou à Repórter Brasil que o parlamentar não falaria sobre o caso. Além de Urzeni, outros sete políticos também fazem parte da “lista suja” do trabalho escravo.
Principal atividade na “lista suja“, envolvendo 66 das 142 novas inclusões, a pecuária tem presença ainda maior entre os nomes também incluídos na lista de embargos do Ibama: dentre as 19 terras onde foram cometidos crimes ambientais, 13 (76%) eram destinadas à atividade.  Três dessas terras estão nos municípios de Altamira e São Félix do Xingu, no Pará, e Nova Maringá, no Mato Grosso, e fazem parte da lista de municípios da Amazônia considerados prioritários pelo Ministério do Meio Ambiente, uma relação mantida desde 2007 com os locais em que a taxa de desmatamento aumentou em ao menos três dos últimos cinco anos.  Outro local que também está na relação é Moju (PA), que marcou a entrada do dendê na “lista suja”, com o vice-prefeito do município envolvido com a escravização de dez pessoas.  O dendê é a maior aposta do programa nacional de biodiesel na Amazônia.

*Fonte: Repórter Brasil 
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