Foto: Depoimento de Adenilson “Pinduca” ao livro “Memórias do povo Tupinambá”, da Organização Thydewa. |
Por
Carolina Fasolo*
O
Agente Indígena de Saúde Adenilson da Silva Nascimento, o “Pinduca”, 54 anos,
foi assassinado por pistoleiros na sexta-feira (1), numa estrada que liga
Ilhéus ao município de Una, nas proximidades da aldeia Serra das Trempes, Terra
Indígena Tupinambá de Olivença, na Bahia. O assassinato de Adenilson ocorreu
apenas quatro dias depois de Eusébio Ka’apor, no Maranhão, morrer numa
emboscada semelhante. Dois homens encapuzados cercaram e atingiram Eusébio com
um tiro nas costas (AQUI).
O
secretário executivo do Conselho Indigenista Missionário (Cimi), Cleber
Buzatto, denunciou, na última quinta-feira (29), ao Fórum Permanente para
Questões Indígenas da Organização das Nações Unidas (ONU), a insegurança das
lideranças indígenas que lutam por seus territórios e pediu providências pela
retomada das demarcações das terras indígenas no Brasil, dever constitucional
que está sendo preterido em nome de interesses políticos. (AQUI)
Protesto
Em
protesto pelo assassinato de Adenilson, cerca de 300 indígenas Tupinambá
fecharam, na manhã desta segunda-feira (4), a ponte que liga o distrito de
Olivença a Ilhéus (BA). Os caciques e lideranças decidiram pela manifestação
depois de reunirem-se durante toda a manhã numa aldeia em Olivença. O cacique
José Sinval disse que a ponte só será liberada quando chegarem representantes
do Ministério da Justiça, da Funai e do Governo do Estado da Bahia. “A única
linguagem que o governo entende é a pressão. Então só sairemos daqui quando
enviarem pessoas que possam nos dar garantias sobre a investigação desse crime
e a demarcação das nossas terras. Adenilson era uma das nossas principais
lideranças. Os fazendeiros estão matando a gente e nada acontece”, afirmou o
cacique.
O
Conselho dos Caciques Tupinambá, em documento divulgado após a morte de
Adenilson, questionou o governo sobre a paralisação nas demarcações, processo
que tem promovido ações violentas contra os indígenas. Os Tupinambá aguardam
desde 2009 a publicação da Portaria Declaratória de seu território, pelo
Ministério da Justiça. “Perguntamos, até onde vai essa situação? Pois já
são mais de 24 lideranças indígenas Tupinambá assassinadas pela luta da
demarcação do território Tupinambá. Por que o governo não assina a carta
declaratória do território Tupinambá de Olivença? Vai esperar morrer mais gente
inocente?”.
Emboscada
Adenilson
voltava de uma pescaria com a esposa, o filho de um ano e outra filha de 15,
quando foram emboscados por três pistoleiros armados, que estavam encapuzados.
Ele morreu na hora e sua esposa, Zenaildes, foi gravemente ferida, baleada na
perna e nas costas. A filha adolescente conseguiu fugir entrando na mata e
manteve contato por celular com caciques e lideranças indígenas, que avisaram
as autoridades competentes.
Ninha,
como é conhecida a esposa de Adenilson, conseguiu proteger o filho e carregá-lo
por cerca de 600 metros depois da fuga dos assassinos, até ser encontrada pelos
agentes da Funai, que chegaram ao local avisados pelos caciques. A criança
encontra-se hospitalizada, mas passa bem. Zenaildes ainda passará por cirurgia,
pois uma bala ficou alojada na perna.
O
sepultamento de Adenilson ocorreu no domingo (3), às 11h30, no Cemitério Nossa
Senhora da Escada, em Olivença, com muita comoção e revolta da comunidade. “Nós
estamos de luto por Pinduca e por todos nossos parentes que tombaram em mãos
assassinas do infame poder que corrói as mentes avarentas. Continuamos cada vez
mais firmes em nossos propósitos e nunca desistiremos de lutar pelos nossos
direitos. Cada vez que assassinarem um de nós nascerão milhões para nos dar
força e coragem”, disse a liderança Katu Tupinambá.
Haroldo
Heleno, do Conselho Indigenista Missionário (Cimi) regional Leste, alertou para
a ineficiência das “Mesas de Diálogo” promovidas pelo Ministério da Justiça,
que muitas vezes acirram ainda mais o conflito na região, e lembrou que a
última reunião ocorreu no dia 29 de abril, entre representantes da Justiça
Federal, Ministério da Justiça, lideranças indígenas e pequenos agricultores.
“A tal mesa de diálogo só serve para aumentar o clima de violência. Sempre que
alguma autoridade visita a região acontece um fato grave envolvendo os
Tupinambá. Desta vez foi o assassinato de Adenilson. A demora na assinatura da
Portaria Declaratória da TI por parte do ministro da Justiça, José Eduardo
Cardozo, rega mais uma vez de sangue a terra do povo Tupinambá e deixa a
comunidade de luto e extremamente revoltada por mais um assassinato”, ressalta
Haroldo.
A
liderança Cazé Tupinambá afirmou, em desabafo: “O governo desavergonhado, cara
de pau, tem o despautério de dizer às organizações internacionais que nós,
indígenas, somos bem assistidos e contemplados, e nesse joguinho de faz de
conta continuamos órfãos da ganância de uma cultura predadora”.
‘Acho
que vou realizar! Vou ter o documento dizendo que a terra é minha. Aí vou ser
mais feliz ainda’ (foto). Este era o sonho de Pinduca, que tombou na terra que
tanto esperou pela homologação. “Assim como outras lideranças, que regaram este
chão de sangue aguardando a resolução definitiva sobre suas terras”, disse o
cacique José Sinval.