Dois meses depois da liminar da Justiça Federal que pedia a reintegração de posse imediata da área da Tekoa Itakupe (em guarani mbya, itakupe significa atrás da pedra, em referência ao Pico do Jaraguá), o presidente do Supremo Tribunal Federal, Ricardo Lewandowski, decidiu nesta sexta-feira, 15, pela suspensão da medida. Antes da decisão, os índios guarani que vivem na Terra Indígena (TI) do Jaraguá, assim declarada pela Funai, teriam de desocupar o terreno a partir do dia 25, como ficou decidido após uma reunião entre a Polícia Militar e Antônio Tito Costa, que reclama a propriedade das terras.
“Entendo prudente que a decisão
judicial objeto desta suspensão seja provisoriamente suspensa, neste momento,
para que o juízo da 10ª Vara Federal em São Paulo promova uma tentativa de
conciliação entre as partes ou, então, justifique eventual impossibilidade de
levá-la a efeito”, publicou Lewandowski.
Apesar da reintegração ter sido
suspensa, a ação judicial movida por Antonio Tito Costa em 2005 ainda deve ser setenciada.
Disputa
na Justiça
Em março deste ano, a Justiça Federal
determinou a reintegração imediata do terreno. A determinação veio depois de um
agravo solicitado pelo advogado Antônio Tito Costa, que foi deputado federal e
prefeito de São Bernardo entre 1970 e 1990. A disputa pelo território está na
Justiça desde 2005, quando os indígenas ocuparam pela primeira vez o espaço.
“Nós ficamos seis meses aqui, mas naquela época não tínhamos apoio”, explica o
cacique Ari Augusto Martim.
Em 24 de abril de 2013, o despacho nº
544 da então presidente da Funai, Marta Maria do Amaral Azevedo, delimitou a TI
do Jaraguá: um território de 532 hectares que se expande pela aldeia Tekoa Ytu,
já demarcada, por sítios da região, incluindo o terreno reclamado por Tito Costa
e, também, por uma área do Parque Estadual do Jaraguá.
A área de 72 hectares teria sido
adquirida pela família da falecida mulher de Tito Costa e um sócio, em 1947.
“Nossa área nunca foi habitada por índios. A Constituição diz que terras
indígenas aquelas que são habitualmente ocupadas por índios e que nelas
produzem. Está inteiramente fora dos critérios da Constituição. Esse laudo da
Funai é só um laudo antropológico.”
Apesar da TI Jaraguá ser considerada
território tradicional pela Funai desde 2013, ainda não foi publicada portaria
declaratória pelo Ministério da Justiça (MJ) e, por consequência, tampouco
houve a homologação da Presidência da República. De acordo com o MJ, “o
processo de demarcação da Terra Indígena Jaraguá foi restituído à Funai para cumprimento
de diligências e retornou no dia 30 de janeiro de 2015 ao Ministério da
Justiça, onde está sob análise da Consultoria Jurídica.”
A
menor aldeia do Brasil
Segundo a Funai, 600 indígenas vivem
na TI Jaraguá, sendo 42,6% de crianças de até 10 anos. É nessa região que está
a menor terra indígena já demarcada no País, a aldeia Tekoa Ytu, com 1,7
hectare. Sua demarcação foi feita em 1987, antes da atual Constituição, que
promoveu mudanças nas demarcações de territórios tradicionais.
A extrema restrição de terreno é
determinante para os indígenas, que vivem da agricultura, e é o que mais os
motiva a lutar pela demarcação do território tradicional. “É uma terra muito
pequena e que não é apropriada para se manter a tradição guarani. Toda nossa
história é por meio do alimento sagrado”, explica Karai Popygua, nome guarani
de David Martim, morador e professor na aldeia. Hoje, além de não terem espaço
para plantar, os guaranis enfrentam a superlotação e condições precárias, como
falta de tratamento de esgoto e excesso de cães, que constantemente são
abandonados no local.
Apesar das atuais famílias guaranis
terem se estabelecido na TI Jaraguá em 1950, segundo o relatório da Funai, a
documentação história indica que o terreno é composto por terras vinculadas ao
antigo aldeamento de Barueri, do século 17, o que tornaria o terreno
tradicionalmente indígena. Essa também foi a análise da pericia isenta
solicitada pela Justiça na ação. De acordo com resposta enviada pela Funai à
reportagem do Estado, “a perícia judicial atesta as conclusões da Funai de que
a área em litígio é de ocupação tradicional Guarani”.
Além da Tekoa Ytu, desde a década de
1990, os guaranis ocupam 3 hectares na Tekoa Pyau – sob litígio – que fica ao
lado e que antes dedicavam apenas à plantação.
Fonte:
Agência Estado via Combate ao Racismo Ambiental