Primeiro mandato da presidente é o período em que se delimitou a menor área desde a redemocratização do País; falta de prioridade ao órgão, há 20 meses sob comando interino, persiste com queda no número de funcionários e no orçamento anual
Por Roldão Arruda*
Por Roldão Arruda*
São
Paulo - No momento em que aumentam as pressões no Congresso contra as
reivindicações indígenas por mais terras, a Fundação Nacional do Índio (Funai),
cuja missão é proteger e promover os direitos dessa população, vive um processo
de enfraquecimento no governo Dilma Rousseff. A presidente encerrou o primeiro
mandato com a menor área de terras indígenas demarcada desde a redemocratização
e começou o segundo período no Palácio do Planalto sem indicar mudança no
desinteresse pelo órgão.
Há
20 meses, a Funai está sob comando interino. Desde que a demógrafa Marta
Azevedo pediu demissão, em junho de 2013, Dilma não nomeou oficialmente nenhuma
pessoa para o cargo. O atual presidente interino, Flávio de Azevedo, é um
procurador vinculado à Advocacia-Geral da União (AGU) que prestava serviços à
área jurídica da Funai até outubro, quando assumiu o posto temporário.
Para
organizações que atuam na defesa dos indígenas, essa situação é mais uma
demonstração do desinteresse de Dilma pelo órgão. A presidente é a que manteve
a fundação sob comando interino pelo período mais longo desde sua criação, em
1967. Nesses 48 anos, a Funai teve 33 presidentes – média de 1 ano e 4 meses de
mandato para cada um. Nos dois governos do ex-presidente Fernando Henrique
Cardoso, a instituição teve dez presidentes. Com Luiz Inácio Lula da Silva,
foram três.
Dilma mantém há 20 meses a Funai com presidente interino. Primeiro mandato da presidente terminou com a menor área de terras indígenas demarcada desde a redemocratização |
Na
avaliação de Cleber Buzatto, secretário executivo do Conselho Indigenista
Missionário (Cimi), o enfraquecimento da Funai está se agravando. “A manutenção
de interinos no cargo de presidente é um dos reflexos mais visíveis desse
processo”, disse. “Existem enormes pressões políticas para que não sejam
aprovados relatórios de delimitação e demarcação de novas terras, uma das
principais responsabilidades do presidente da Funai. Como ele pode levar adiante
essa função se está interino no cargo?”
Esse
enfraquecimento da Funai apontado pelo dirigente do Cimi ocorre em paralelo à
maior pressão no Congresso para aprovação de uma emenda constitucional que
delega ao Legislativo o poder de demarcar terras indígenas. Hoje, essa
prerrogativa é exclusiva do Executivo.
No
governo Dilma, essa atribuição foi pouco efetiva. A petista homologou em quatro
anos a criação de 11 terras, um total de 2 milhões de hectares, mais baixa
marca dos governos pós-ditadura militar. Em metade do tempo, Itamar Franco
homologou 16 áreas e 5,4 milhões de hectares.
Quedas.
Para
Buzatto, outros indicadores de enfraquecimento são a redução do quadro de
funcionários, especialmente os que atuam nas demarcações, e do orçamento.
Segundo a Funai, o quadro de funcionários permanentes caiu de 2.396 em 2010
para 2.238 em 2014. O grupo dedicado à delimitação e demarcação de terras foi
reduzido de 21 para 16 funcionários fixos. O número de antropólogos na equipe
baseada em Brasília baixou de seis para dois.
O
encolhimento também é visível no orçamento. Em 2013, a verba da Funai (a soma
de custeio e investimento, em valores já corrigidas pela inflação) chegou a R$
174 milhões. Em 2014, segundo o órgão, foram R$ 154 milhões.
Fora
isso, hoje há 13 processos de demarcação parados no Ministério da Justiça, onde
precisam de uma Portaria Declaratória para seguirem tramitando no governo.
Outros 21 processos de demarcação já estão na mesa de Dilma, à espera da
assinatura da presidente. Segundo levantamento da Assessoria Especial de
Participação Especial, essas terras indígenas totalizam 1,4 milhão de hectares.
Para
André Villas-Bôas, secretário executivo do Instituto Socioambiental (ISA), o
esvaziamento da Funai começou no governo Lula e se agravou com Dilma. “Diante
de obras como as hidrelétricas que estão sendo construídas e que afetam
populações indígenas, o óbvio teria sido o fortalecimento de instituições que
cuidam dessas populações. O que se vê é o oposto, com licenciamentos a toque de
caixa e desenvolvimento a qualquer preço.”
*Fonte: O
Estado de São Paulo