“A Norte Energia tenta criminalizar os índios,
ela tem feito uma manobra na Justiça Estadual de criminalizar todos ao mesmo
tempo, generalizando-os como índios”, afirma a procuradora da República em
Altamira, Thaís Santi
O
juiz Luiz Trindade Júnior, da 3a Vara Cível de Altamira, não garantiu a
reintegração de posse pedida pela Norte Energia, empresa responsável pela
hidrelétrica de Belo Monte, em construção no Rio Xingu, na região de Altamira
(PA). Aproximadamente 100 índios de sete etnias ocupam, desde a madrugada de
segunda-feira, a entrada de acesso do canteiro de obras da usina (saiba
mais).
Após
conceder, ontem, o pedido de reintegração, o juiz voltou atrás hoje,
suspendendo-o. A ordem de reintegração permitiria o uso de força policial na
retirada de indígenas do local e estabelecia multa de até R$ 20 mil por dia
caso houvesse descumprimento.
Leia: Indígenas bloqueiam acesso a canteiro de obras para cobrar dívida de Belo Monte
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Trindade
Júnior acatou o pedido de reconsideração do Ministério Público Federal (MPF),
que argumentava que a competência para esse tipo de decisão seria da Justiça
Federal, e não da Estadual, pois o conflito envolve direitos de populações
indígenas. A decisão sobre a permanência da ocupação deve ficar suspensa até
que a Justiça Federal julgue o pedido da Norte Energia.
“Reduzir
a reivindicação desse indígenas a mero dano a patrimônio particular seria uma
abstração inaceitável de um conflito que se opera no contexto de um
licenciamento federal com riscos reais à sobrevivência étnica desses povos”,
afirma a procuradora do MPF, Thaís Santi. Ela explica que, embora a reivindicação
dos indígenas ocorra em uma via pública, não há dúvida de que o conflito
envolve direitos indígenas.
A
investida da empresa Norte Energia retomava uma ordem judicial antiga, de maio
de 2014, que pretendia impedir e punir a presença de qualquer indígena nas
proximidades do canteiro de obras da usina.
Em
nota, a Norte Energia afirma que "mantém o rigor no cumprimento dos
compromissos que beneficiam as comunidades indígenas da área de influência da
hidrelétrica" (leia
a nota da empresa).
Licença
de Operação
Em
meio a uma das maiores ocupações indígenas nas proximidades do canteiro de
obras e pendências socioambientais, a Norte Energia decidiu solicitar, nesta
quarta-feira, ao Instituto Brasileiro de Meio Ambiente (Ibama) a Licença de
Operação para Belo Monte. Se conseguir a autorização, a empresa poderá começar
a encher o lago da usina (saiba
mais)
Os
indígenas enviaram um manifesto ao MPF em que explicam suas reivindicações e
repudiam o pedido de Licença de Operação da usina. “Diante de tantas
arbitrariedades, a justiça do estado do Pará determinou que nós pagássemos
multa para a Norte Energia. Os devedores não somos nós, a Norte Energia é que
nos deve!”, diz um trecho do manifesto.
Na
carta, os indígenas relatam que estão sem água potável e esgoto: “até hoje
nenhum dos sistemas de abastecimento de água e esgoto foram entregues”. Cobram
também a construção das bases de vigilância e postos de fiscalização, que
garantiriam a segurança das Terras Indígenas impactadas pelo empreendimento,
obrigações que a empresa deveria ter cumprido antes mesmo de iniciar a obra em
2011, segundo exigências do licenciamento ambiental.
A
pauta de nove reivindicações aponta ainda que os indígenas não conseguem mais
sobreviver da pesca no Rio Xingu. Os programas voltados a atividades
produtivas, como implantação de roças mecanizadas, aberturas de estradas de
castanhais estão atrasados e “não trouxeram nenhum resultado positivo para
nenhuma das aldeias”.
O
documento traz ainda graves denúncias sobre o descumprimento de condicionantes
de responsabilidade do Governo Federal, como a regularização fundiária e
retirada de não índios de terras já demarcadas, ações que deveriam ter sido
concluídas antes de 2011 e sequer começaram.
“Não
vamos aceitar que Belo Monte entre em operação sem a definição da área da Terra
Indígena Paquiçamba e a regularização de todas as terras indígenas impactadas
por Belo Monte”, afirma o documento assinado por 11 aldeias atingidas pela
usina (leia a carta na íntegra).