segunda-feira, 2 de maio de 2016

Em um mês, quatro indígenas Guajajara foram assassinados no Maranhão


Entre os dias 26 de março e 22 de abril, os indígenas Aponuyre, Genésio, Isaías e Assis Guajajara (na foto, à frente), todos da Terra Indígena (TI) Arariboia, no Maranhão, foram assassinados. 

Com pouca fiscalização e sem sinal de investigação dos culpados, os indígenas Guajajara que vivem na área – já demarcada e habitada também por índios Awá isolados – sofrem com a constante pressão de madeireiros e temem por sua segurança.

Os assassinatos de indígenas do povo Guajajara – autodenominados Tentehar – têm se sucedido rapidamente e de forma impune na TI Arariboia, e vêm ocorrendo tanto dentro do território de usufruto exclusivo dos indígenas quanto no município mais próximo da área, Amarante do Maranhão (MA), bastante frequentado pelos índios que buscam itens no comércio local ou atendimento em serviços básicos.

No dia 26 de março, o indígena Aponuyre Guajajara, de apenas 16 anos e natural da aldeia Arariboia, uma das mais de cem aldeias do povo Tentehar/Guajajara que compõem a Terra Indígena Arariboia, foi assassinado a tiros no município de Amarante do Maranhão.

Na madrugada do dia 11 de abril, Genésio Guajajara, de 30 anos, habitante da aldeia Formosa,também foi assassinado na zona urbana de Amarante do Maranhão com pauladas e um tiro no tórax. Ele estava na cidade para receber a cesta básica distribuída pela Fundação Nacional do Índio (Funai).

No dia 19 de abril, Isaías Guajajara, de 32 anos, da aldeia Bacabal, foi assassinado a facadas, também no município de Amarante do Maranhão. Poucos dias depois, em 22 de abril, o indígena Assis Guajajara, de 43 anos e morador da aldeia Nova Viana, foi morto a pauladas no interior da própria Terra Indígena Arariboia.

Além disso, na última semana, a morte do indígena Joel Gavião Krenyê, liderança do povo Phycop (Gavião) da TI Governador, também gerou apreensão entre os Guajajara da TI Arariboia, à qual o território dos Gavião é ligada. Embora a justificativa oficial para a morte, ocorrida na noite do dia 21 de abril, seja a de que Joel se envolveu em um acidente automobilístico no caminho entre o município de Amarante do Maranhão e a TI Governador, a perícia ainda não foi realizada e os indígenas acreditam que possa ter ocorrido uma emboscada.

Interesses madeireiros
“As mortes foram muito próximas uma da outra. Estamos de luto”, afirma Suluene Guajajara, uma das lideranças da TI Arariboia. “Hoje, nós vivemos com medo de sair de casa, de sair da aldeia. Não temos liberdade mais”, completa a indígena.
Há anos, os cerca de dez mil indígenas Guajajara e Awá que vivem na TI Arariboia sofrem com a extração ilegal de madeira e com as ameaças e a violência praticada pelos madeireiros da região (na foto abaixo, caminhão carregado de madeira é apreendido em fiscalização).

Frente à incapacidade do Estado em garantir a segurança dos indígenas e a preservação dos limites ao longo dos 413 mil hectares de seu território, os Guajajara resolveram, como medida emergencial, garantir a fiscalização da área e coibir as invasões e a extração ilegal de madeira. Em 2008, criaram um grupo de proteção do território, o qual em 2013 foi oficializado como o grupo dos Guardiões.

A violência contra os indígenas intensificou-se a partir de então. Considerando os dados reunidos no Relatório de Violência publicado anualmente pelo Cimi e os recentes acontecimentos, de 2008 até hoje foram registrados pelo menos 21 assassinatos de indígenas Tentehar/Guajajara no Maranhão.

Suluene explica que a atuação dos Guardiões incomodou grupos econômicos poderosos na região, que movimentam a economia local com serrarias e carvoarias alimentadas por madeira extraída das terras indígenas ilegalmente. Tendo a extração ilegal dificultada, madeireiros passaram a agir com represálias contra os indígenas.

Os Guardiões, por isso, acabaram ficando mais visados pelos agressores. Assis Guajajara, que foi morto dentro da própria aldeia, era membro do grupo que atua na proteção do território. Os Tentehar/Guajajara relatam também que pessoas estranhas têm fotografado os Guardiões dentro da terra indígena, como forma de intimidação e também de mapeamento de possíveis alvos.

Além da violência física, no final do ano passado ocorreram queimadas em cinco terras indígenas do Maranhão, as TIs Awá, Caru, Arariboia, Geralda Toco Preto e Alto Turiaçu (onde vivem indígenas do povo Ka’apor, que também organizaram um grupo de Guardiões e que, como os demais, também sofrem com a pressão de madeireiros).
O caso mais grave foi o da TI Arariboia, que teve 45% de seu território devastado pelo fogo. O incêndio foi considerado criminoso e, durante ação de combate ao fogo, um agente de fiscalização do Ibama foi atingido por um tiro no braço direito, disparado por madeireiros.
Além de devastar a mata amazônica preservada dentro das áreas indígenas, as queimadas e a extração ilegal de madeira colocam em grande risco os indígenas Awá que vivem em isolamento dentro dessas áreas.

Tais ações criminosas destroem os recursos naturais, essenciais para a sobrevivência dos isolados, podendo empurrá-los, contra a sua vontade, para o contato com os não-indígenas e forçá-los ao abandono de seu modo de vida tradicional.

Omissão e insegurança
Suluene Guajajara relata que os acontecimentos recentes têm criado uma sensação de muita insegurança e apreensão na TI Arariboia. “Muitas idosas não conseguem mais dormir. Algumas passam noites inteiras rezando para não acontecer o pior”, afirma.
Ela também conta que o preconceito contra indígenas é bastante forte na região e que os Guardiões são vistos por muitos não-indígenas como “terroristas”.

Para Gilderlan Rodrigues, missionário do Cimi - Regional Maranhão, a utilização de meios cruéis nos crimes recentes – como pauladas, facadas e múltiplos tiros – demonstraria o ódio que os assassinos sentem dos indígenas. 

“As instituições responsáveis não estão cumprindo seu papel. Até agora, nenhuma investigação foi aberta para esses crimes e a sensação que fica para os indígenas é de impunidade”, afirma Gilderlan.

“Queremos um retorno das autoridades”, diz Suluene Guajajara. “É nosso sangue que está sendo derramado”.

Fonte: Cimi - Foto: Luis Carlos Guajajara
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