Mais de
140 índios — a maioria crianças — foram removidos das aldeias com quadro grave.
Quatro bebês Xikrin e Parakanã morreram no final de abril por falta de
atendimento hospitalar
O
Ministério Público Federal (MPF) quer que o Ministério da Saúde coordene em
caráter de emergência uma força tarefa com profissionais de saúde e homens do
Exército para conter um surto de gripe que se alastra nas últimas semanas pelas
aldeias do médio Xingu afetadas por Belo Monte, no Pará.
De acordo
com dados do Distrito Sanitário Especial Indígena (Dsei), responsável pelo
atendimento à saúde na região, mais de 140 índios tiveram que ser removidos de
suas aldeias, sendo mais de 100 crianças, com sintomas graves de gripe e
diarreia. Até o mês passado, segundo o Dsei, cerca de 20% da população indígena
da região já tinha adoecido de gripe.
O surto
de gripe se alastrou mais ainda no final de abril, por conta de programações
realizadas em Altamira em comemoração ao Dia do Índio, em que índios de várias
aldeias foram levados à cidade, fazendo com que a síndrome gripal alcançasse
todas as etnias. Quatro bebês Xikrin e Parakanã chegaram no dia 29 de abril com
quadros graves de febre, tosse e diarreia, mas tiveram que ficar aguardando
internação no hospital municipal São Rafael, por falta de leitos. No mesmo dia
e no seguinte, os quatro morreram.
Em
reunião de emergência no último dia 6 de maio na sede do MPF em Altamira,
entidades envolvidas na contenção do surto trocaram informações sobre a
situação e definiram a necessidade de ações urgentes, com envio da Força
Nacional do Sistema Único de Saúde (FN-SUS). O Dsei informou que a
situação é de “absoluta excepcionalidade”, que os quadros têm evolução muito
rápida com febre abrupta, diarreia e vômito, e que as equipes em campo são insuficientes
para as ações de prevenção.
Normalmente,
o Dsei realiza oito voos por mês para remoção de doentes das aldeias. Na surto
atual, estão realizando cinco voos por dia. Ao chegar em Altamira, os índios
doentes correm o risco de não ter atendimento. Segundo a secretaria municipal
de Saúde, a situação nos serviços de saúde é de superlotação e incapacidade de
atender todos os doentes. E, segundo informaram ao MPF, nesse cenário, caso o
quadro se agrave, levar os indígenas ao Hospital Regional da Transamazônica é
escolher onde a criança vai morrer, pois não há Unidade de Terapia Intensiva
(UTI) disponível.
Diante da
falta de profissionais e estrutura na cidade de Altamira para atender a
demanda, o MPF provocou a secretaria executiva do Ministério da Saúde, solicitando
o envio de esforços para garantir estrutura de apoio para os casos que
necessitem de internação.
A falta
de leitos é agravada pelo inchaço populacional causado em Altamira pelas obras
da usina de Belo Monte. Para mitigar o problema, a Norte Energia construiu um
hospital, como parte das condicionantes impostas pelo Instituto Brasileiro do
Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama). Mas até hoje, seis
anos após o início das obras, ele permanece fechado. Foi prevista a
reformulação do atendimento da saúde indígena para que os índios não
necessitassem ir até a cidade para qualquer atendimento, mas essa condicionante
também ainda não foi cumprida.
A
procuradora da República Thais Santi, de Altamira, também recomendou à Fundação
Nacional do Índio (Funai) que promova a interdição temporária da Casa do Índio
na cidade. O espaço, uma estrutura que abriga indígenas quando se deslocam para
a área urbana, durante compromissos e atendimentos de saúde, é hoje num foco da
doença. O fluxo de indígenas na cidade pode piorar muito a dimensão do surto,
que já é considerado alarmante. A interdição deve ser acompanhada, segundo o
MPF, de diálogo com as lideranças indígenas sobre a gravidade do problema.
“Considerando o caos social gerado pela usina de
Belo Monte, que acarretou o colapso do sistema de saúde municipal, bem como o
aumento do deslocamento dos indígenas para o núcleo urbano e a entrada
constante de não índios nas aldeias, o potencial de alastramento desse surto é
alarmante e a capacidade local para absorção da demanda é notoriamente
restrita”, disse a procuradora em recomendação enviada à Funai.
Fonte: Ministério Público Federal no Pará - Assessoria
de Comunicação