Fotografia: Maurício Torres |
A comunidade tradicional de Montanha e Mangabal, no Alto Tapajós
(PA), luta há um século e meio por seus direitos mais básicos. E parece que,
pelo tom do atual governo, essas famílias ribeirinhas terão que gritar por mais
150 anos para terem o acesso ao que a lei lhes garante: serem ouvidos.
Suas vidas serão profundamente impactadas se nada detiver a obsessiva
fixação da presidente Dilma Roussef de barrar todos os rios da Amazônia. A
pretensão da usina hidroelétrica de São Luiz do Tapajós, no município de
Itaituba-PA, além de submergir parte do território de Montanha e Mangabal,
ainda transformaria em lago, o rio onde e do qual vivem. Isto é concreta ameaça
às condições de sobrevivência do grupo no local onde têm oito gerações
enterradas e onde desenvolveram e detêm um rico saber patrimonial de uso e
manejo do meio.
Em 2002, o Brasil ratificou a Convenção 169 da Organização
Internacional do Trabalho (OIT), que, entre outras coisas, confere aos Povos e
Comunidades Tradicionais – com é o caso de Montanha e Mangabal
– o direito a serem consultados antes que sejam tomadas decisões que possam
afetar suas condições de reprodução materiais ou simbólicas, trata-se da consulta livre, prévia e informada.
Ainda assim, parece que isso está longe de acontecer.
Em 17 de setembro de 2014, representações de Montanha e Mangabal e
de índios Munduruku, outro grupo diretamente afetado pela intenção de
barramento do rio Tapajós, foram à Brasília para reunião com o governo federal.
Para surpresa dos ribeirinhos, Nilton Tubino, coordenador geral de Movimentos
do Campo da Secretária-Geral da Presidência da República, afirmou que eles não
teriam direito à consulta prévia, apenas o povo Munduruku.
A explicação ao arbítrio de Tubino estaria numa interpretação de uma decisão judicial de
novembro de 2012, onde a Justiça Federal em Santarém (PA), em resposta a uma
Ação Civil Pública interposta pelo Ministério Público Federal, proibiu o
licenciamento da usina São Luiz do Tapajós enquanto não fosse realizada
consulta prévia ao povo Munduruku. Contudo a ACP impetrada pelo MPF demandou a consulta para
todas as populações tradicionais, não apenas aos indígenas.
O MPF interpôs um
Agravo de Instrumento e teve seu pedido acolhido integralmente pelo
Desembargador João Batista. Em seguida, o STJ suspendeu essa decisão do
TRF1, mas o Ministro Félix Fischer salientou que a consulta abrange comunidades
indígenas e tribais:
"Nada obstante,
entendo que, para se dar fiel cumprimento aos dispositivos da Convenção, o
Governo Federal deverá promover a participação de todas as comunidades,
sejam elas indígenas ou tribais, a teor do seu art. 1º, que podem ser
afetadas com a implantação do empreendimento, não podendo ser concedida a
licença ambiental antes da sua oitiva". [voto do Ministro Félix Fischer
no Agravo Regimental na Suspensão de Liminar e de Sentença 1745 PA]
Ao que parece, quando o sujeito de direitos são ribeirinhos,
índios, beiradeiros, quilombolas e demais povos e comunidades tradicionais, o
atual governo federal só cumpre a lei se for sob ordem judicial.
Saiba mais: A não gente que vive no Tapajós - Por Eliane Brum
Observação: Matéria alterada em 22 de setembro de 2014 (23h), para inclusão de informações sobre decisões judicias no âmbito de Ação Civil Pública movida pelo Ministério Público Federal.
Saiba mais: A não gente que vive no Tapajós - Por Eliane Brum
Observação: Matéria alterada em 22 de setembro de 2014 (23h), para inclusão de informações sobre decisões judicias no âmbito de Ação Civil Pública movida pelo Ministério Público Federal.