Cerca
de 30 famílias das etnias Borari e Arapium da Terra Indígena (TI) Maró,
município de Santarém (PA), estão acampadas há cerca de cinco dias em área
que está sendo desmatada por madeireiros. A ocupação retoma uma parte da TI que
havia sido apropriada pela fazenda Curitiba. A ação é organizada em resposta ao
corte de 15 árvores na TI, todas de alto valor comercial, como maçaranduba,
jatobá, ipê, amarelão, itauba, uxi e pequiá. Os indígenas trancaram a estrada
que corta o território tradicional e serve de via de transporte ilegal de
toras.
O
corte foi feito em área pleiteada por Celso José Hoffman, que conseguiu
Autorizações para Exploração Florestal (AUTEF 2974/2014) via Secretaria
Estadual de Meio Ambiente (SEMA). Pelo menos 50% do Projeto de Manejo do
madeireiro está dentro da TI, o que é juridicamente ilegal, por ser violação ao
direitos garantidos na Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho
(OIT). O processo de demarcação da Terra Indígena ainda está em andamento e o
mapa do território foi publicado em 2011 no Diário Oficial, sendo, portanto,
disponível a todos os órgãos ambientais.
Pedro
Martins, assessor jurídico da Terra de Direitos que acompanha do caso, aponta
que a SEMA autorizou mais de 10 explorações florestais desde 2007 na área
indígena. “Os órgãos ambientais insistem na desconsideração dos direitos
indígenas sob o pretexto de a área não estar demarcada, o que não se sustenta
no ordenamento jurídico que abarcou a Convenção 169 da OIT.”
No
dia 31 de outubro, os madeireiros que atuam na região não compareceram a uma
reunião marcada com lideranças indígenas. A conversa foi reagendada para o dia
1º de novembro, mas os empresários novamente faltaram. A partir de mensagem
enviada pelos empresários, o encontro foi remarcado para esta quarta-feira (5).
O caso já foi denunciado pela Terra de Direitos à Fundação Nacional do Índio
(Funai), ao Ministério Público Estadual (MPE) e ao Ministério Público Federal
(MPF). Até o momento, não houve resposta. A Terra de Direitos também vai entrar
com representação no MPE e MPF contra as madeireiras.
“O
nosso objetivo não é negociação de madeira”, afirma o cacique Dadá Borari. A
reivindicação da comunidade é por indenização pelos dados causados na área e
por danos morais. Os indígenas requerem o cancelamento do Plano de Manejo e
paralisação imediata da exploração de madeira dentro da Terra Indígena.
As
lideranças cobram um posicionamento do poder público em favor da preservação da
floresta e das comunidades. “Já denunciamos isso há muito tempo, e até hoje nós
não tivemos uma resposta. Até hoje continua do mesmo jeito, tirando sete,
depois tiram 15 [árvores], e vão roubando toda a riqueza dos meus netos e dos
meus filhos”, lamenta. Higino Borari, primeiro Cacique da Aldeia Novo Lugar.
“Aqui é meu pão de cada dia”, completa o indígena.
Para
a população Borari e Arapium, a derrubada das árvores é uma agressão ao modo de
vida, por se tratar de espécies que contribuem para a medicina tradicional e
para a sobrevivência dos animais, base da alimentação das famílias. Edith
Borari utiliza plantas medicinais nativas. “Eu que trabalho com medicina tradicional
preciso dos nossos remédios, que temos aí na natureza”.
Edith
faz um apelo aos órgãos competentes para que resolvam o conflito. “Antes
estavam ao redor da nossa área, agora estão dentro, estão desmatando [...]. Nós
queremos apoio para a demarcação da nossa área. Já chega da gente estar
sofrendo”.
A
conivência do próprio Estado na exploração indevida de madeira na região ocorre
também em outros casos, com autorizações de Planos de Manejo que afetam
diretamente os costumes e a sobrevivência das etnias indígenas. Atuam na região
as empresas Rondobel Ltda, Grupo Mundo Verde, ARCA Indústria e Madeira Ltda
(com sede em Tomé Açu/PA), além do madeireiro Marco Schmidt.
Na
rota da devastação
O
território da Terra Indígena Maró está cravado em uma região de alto potencial de
recursos naturais e pela diversidade de povos tradicionais. Mede 42.373
hectares, derivados de terras devolutas de competência do estado do Pará. A
área reúne cerca de 250 habitantes em três aldeias: Novo Lugar, Cachoeira do
Maró e São José III.
Ameaças
Enquanto
o reconhecimento como Território Indígena não se concretiza, as tensões sociais
só aumentam com invasores, fazendeiros e madeireiros. Lideranças comunitárias
vivem sob ameaça de morte e sofrem violações de direitos humanos fundamentais
por defenderem a preservação da floresta.
Em
novembro de 2009, uma mobilização comunitária reteve e queimou duas balsas
carregadas de madeira com indícios de irregularidade. Em decorrência da ação, o
cacique Dadá Borari passou a sofrer ameaças de morte e atualmente vive sob
proteção policial e com acompanhamento do Programa de Proteção a Defensores de
Direitos Humanos da Secretaria de Direitos da Presidência da República.
Fonte: Terra
de Direitos