Parlamentares alegam que CPI da Funai e do Incra pediu a quebra de sigilo bancário das entidades sem fundamento
O coordenador da Câmara do MPF que
atua na defesa das populações indígenas e das comunidades tradicionais (6ª CCR)
recebeu parlamentares da Comissão de Direitos Humanos e da Frente Parlamentar
em Defesa dos Povos Indígenas da Câmara dos Deputados, para falar sobre a CPI
da Funai e sobre a suposta tentativa de criminalização das instituições de
defesa dos direitos de indígenas e de quilombolas, como o Instituto
Socioambiental (ISA), o Conselho Indigenista Missionário (Cimi) e a Associação
Brasileira de Antropologia (ABA).
Os deputados relataram ao MFP que a
CPI aprovou, sem maioria qualificada, como prevê o regimento, na última
quarta-feira, 6 de julho, requerimento para a quebra de sigilo bancário dessas
organizações. A votação ocorreu em sessão secreta. “Nesse episódio, os
deputados mostraram total descumprimento com o regimento interno, com o Código
de Ética, afrontaram à Constituição Federal, para cercear direitos de
indígenas, quilombolas, assentados”, alertou o deputado federal Patrus Ananias
(PT/MG).
Reforçando as denúncias, os deputados
entregaram ao MPF um documento que traz uma série de denúncias sobre possíveis
atos ilegais cometidos pela CPI da Funai. Entre os atos questionados, está a
solicitação de informações sensíveis, que podem prejudicar populações
indígenas.
Para o coordenador da 6ª Câmara de
Coordenação e Revisão do MPF, subprocurador-geral da República Luciano Mariz
Maia, “esse conjunto de informações é preocupante. Normalmente, se instala uma
CPI para investigar algo que não funciona. Essa faz o contrário, investiga
porque está funcionando”, questiona. Instalada em novembro de 2015, a CPI tem
por objetivo investigar a atuação da Funai e do Incra na demarcação de terras
indígenas e remanescentes de quilombo.
Segundo o sócio-fundador do ISA,
Márcio Santilli, os movimentos são transparentes com suas contas, e a atitude
da CPI teria cunho político. “Não se trata de receio quanto às nossas contas,
toda informação é publicamente disponibilizada no nosso site. A decisão da CPI
é extravagante, pede a quebra dos sigilos sem qualquer fato contra essas
pessoas”, afirmou. Ele informou que as entidades irão recorrer à Justiça contra
a decisão da CPI.
O MPF se comprometeu a levar o caso à
Comissão de Acompanhamento da Atuação do Ministério Público na Defesa dos
Direitos Fundamentais do Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP). Além
disso, irá acompanhar de perto iniciativas da CPI, futuras diligências
realizadas, despejos e reintegrações de posse e instauração de inquéritos
contra indígenas, por meio dos procuradores naturais dos casos, pleito dos
parlamentares.
De acordo com Luciano Mariz Maia, é
imprescindível a construção de uma rede de informações entre os atores, para
que cada um atue na sua área, mas de maneira coordenada. “É importante nos
aproximarmos mais, trabalharmos juntos e com o mesmo objetivo, para somarmos
esforços”, declarou.
O
coordenador da 6ª CCR também criticou a tramitação de 29 projetos de decretos
legislativos na Câmara dos Deputados que pretendem sustar atos da presidente
afastada Dilma Rousseff, que homologaram terras indígenas, ou declararam de
interesse social imóveis para fins de desapropriação para reforma agrária, ou
imóveis incidentes em área identificada como territórios quilombolas. Luciano
Mariz Maia considera as proposições do Congresso inconstitucionais.
MPF defende validade de atos do Executivo em favor de povos indígenas, quilombolas e para fins de reforma agrária
A
Câmara do Ministério Público Federal que trata de questões referentes à
populações indígenas e comunidades tradicionais (6ª CCR) divulgou nota nesta
terça-feira, 12 de julho, reafirmando a legalidade e a validade dos atos do
Poder Executivo que homologaram terras indígenas, reconheceram terras
quilombolas ou que declararam, de interesse social, imóveis para fins de
desapropriação para reforma agrária.
Atualmente,
29 projetos de Decreto Legislativo tramitam na Câmara dos Deputados com o
intuito de anular os atos. Segundo
nota, os decretos presidenciais só poderiam ser anulados se o Congresso
considerasse como violada, pelo Executivo, atribuição conferida pelo próprio
Parlamento para que o Executivo legislasse ou em caso de abuso, excesso ou
desvio de regulamentação de matéria legislativa votada pelo Parlamento
(Constituição, art. 49, V).
A
nota lembra que, de acordo com a Constituição, a União deveria ter concluído a
demarcação das terras indígenas brasileiras no prazo de cinco anos de sua
promulgação (art. 67 do ADCT); ou seja, em 5 de outubro de 1993. O atraso é de
23 anos. “A não regularização de terras tem sido causa de conflitos fundiários
já existentes em várias dessas áreas, expondo em risco a integridade física e
cultural dos grupos envolvidos. Em 2007, 92 líderes indígenas foram
assassinados, ao passo que em 2014 o número havia aumentado para 138”, diz o
texto.
“Qualquer medida que tente esvaziar ou desfazer tais atos (de
demarcação), em razão de pressões econômicas e políticas, significa renúncia de
bem público da União, tal como são as terras indígenas (arts. 20, XI, e 231 da
Constituição), e grave violação de direitos humanos, em clara afronta ao que
dispõe o texto constitucional”, reforça a nota.