“Nós, servidores da Fundação
Nacional do Índio, vimos a público repudiar a forma como o atual Governo vem
tratando os povos indígenas e, consequentemente, a FUNAI, no
desrespeito às suas atribuições legais para a promoção e defesa
dos direitos dos povos indígenas e, sobretudo, no tocante aos processos de
demarcação de Terras Indígenas.
A condução dos processos de
demarcações de Terras Indígenas é uma atribuição da FUNAI e segue um
procedimento administrativo legal, claro e cuidadoso conforme previsto na
Constituição e no Decreto 1.775/1996.
Cabe destacar que o
Governo Dilma Rousseff foi o que menos homologou Terras Indígenas desde a
Constituição Federal de 1988.
O argumento ruralista
de que os povos indígenas teriam “terras demais” não reflete a realidade, ainda
mais se considerarmos as conjunturas regionais, como, por exemplo, a situação
de confinamento territorial do povo Guarani Kaiowá no Mato Grosso do Sul, ou
dos povos das regiões Sul, Sudeste e Nordeste do Brasil. Situações bem
conhecidas do Governo Federal, que tem se omitido em assumir a sua
responsabilidade e em dar as condições mínimas para que a FUNAI cumpra seu
papel institucional, apesar das inúmeras manifestações dos servidores contra a
falta de condições de trabalho.
É descabida a manipulação
dos fatos que leva setores reacionários da sociedade e influentes no Governo
Federal a deslocar o problema fundiário no Brasil para a questão da demarcação
de Terras Indígenas. O Censo Agropecuário do IBGE de 2006 aponta que a
estrutura agrária brasileira é uma das mais desiguais do mundo, demonstrando
que as grandes propriedades com mais de 1 mil hectares concentram 43% da área
total do país. Somado a este dado, sabemos que grandes latifundiários são
influentes na condução política do país, e são justamente os atores que têm se
colocado frontalmente contra os direitos territoriais indígenas.
Chegamos então ao
questionamento dos reais interesses que levam alguns políticos a desqualificar
instituições públicas que trabalham pelo interesse coletivo e nacional e na
defesa de direitos humanos e constitucionais.
Desta forma, repudiamos
veementemente a maneira como setores do próprio governo vêm conduzindo a
opinião pública, alimentando e reproduzindo preconceitos históricos sobre os
povos indígenas.
Repudiamos a pretensão
inconstitucional da Ministra-Chefe da Casa Civil Gleisi Hoffman de suspender os
processos de identificação e delimitação de Terras Indígenas no estado do Paraná,
entendendo que a ministra atuou em causa própria, tendo em vista sua intenção
de candidatura ao governo do estado do Paraná, utilizando as demarcações de
Terras Indígenas como palanque eleitoral.
Repudiamos também a
tentativa absurda de submeter à análise da Empresa Brasileira de Pesquisa
Agropecuária (Embrapa) os estudos de identificação e delimitação de Terras
Indígenas, sendo que a própria empresa, vinculada ao Ministério da Agricultura,
Pecuária e Abastecimento, assumiu em Nota Pública não ter “por
atribuição opinar sobre aspectos antropológicos ou étnicos, envolvendo a
identificação, declaração ou demarcação de Terras Indígenas no Brasil”. Tal
manobra só confirma as relações promíscuas entre o Governo Federal e o setor
ruralista latifundiário. Além disso, alertamos que esta iniciativa só vem a
colaborar com o aumento e a intensificação dos conflitos fundiários e com a
violência no campo.
Repudiamos a forma como o
Governo vem criminalizando o movimento indígena atuante na defesa de seus
territórios.
Repudiamos a atuação da
Força Nacional como instrumento estatal de repressão, visando impor a
realização dos estudos de viabilidade de empreendimentos que impactam os
territórios indígenas sem a devida anuência dessas populações.
Repudiamos ainda a nota absurda
e vergonhosa da Secretaria Geral da Presidência da República sobre a ocupação
indígena do canteiro de obras de Belo Monte, na qual o governo, ao invés de
dialogar responsavelmente, opta por criminalizar as lideranças e a resistência
do povo Munduruku e demais povos que serão impactados pela construção dos
empreendimentos hidrelétricos nos rios Tapajós, Teles Pires e Xingu.
Repudiamos a Operação
Eldorado da Polícia Federal, realizada em Novembro de 2012, que resultou no
assassinato de um indígena e em outros dois feridos, além da destruição da
Aldeia Teles Pires do povo Munduruku, e que até o presente momento não houve
responsabilização criminal dos envolvidos.
Por fim, reivindicamos uma
FUNAI fortalecida, capaz de atuar concretamente em defesa dos direitos
constitucionais dos povos indígenas, que garanta condições dignas de trabalho
aos seus servidores e que atue como executora de uma política de Estado que
responda aos anseios dos povos indígenas, já tão massacrados por mais de 500
anos de genocídio e esbulho de suas terras, e não que atue em função interesses
privados e escusos de setores privilegiados e minoritários da sociedade
brasileira.
Esperamos que haja resposta
contundente do Ministério da Justiça e da Presidência da FUNAI aos recentes
ataques veiculados na mídia.
Os servidores da FUNAI estão
junto com os povos indígenas e suas organizações na defesa pelos seus direitos
territoriais e socioculturais, garantidos pela Constituição Federal
de 1988.”