Cerca de 500 indígenas Terena retomaram quatro fazendas que
incidiam sobre a Terra Indígena Buriti, no município de Sidrolândia, Mato
Grosso do Sul, a 70 quilômetros de Campo Grande. Eles reivindicam a
demarcação do território de 17 mil hectares, declarado como de ocupação
tradicional dos indígenas por uma portaria do Ministério da Justiça em 2010.
Até a retomada, os indígenas detinham a posse de apenas 3 mil.
“Os outros 14 mil hectares estão ocupados por 25 fazendas”,
afirmam os Terena em carta lançada nessa sexta-feira, 17. Segundo o documento,
cerca de 5 mil pessoas vivem confinadas em 3 mil hectares de terra, sem espaço
para plantar. “Nós retomamos essas terras porque elas são nossas e porque não
temos terra para plantar. Nosso povo planta muito”, argumentam. A foto ao
lado foi retirada do celular de um dos jagunços de uma das fazendas
retomadas. Data de 28 de março deste ano. Ele treina tiro na sede da
fazenda Querência São José.
O proprietário da fazenda Buriti, o ex-deputado estadual
Ricardo Bacha, entrou com pedido de reintegração de posse contra os indígenas.
A Justiça decidiu favoravelmente ao fazendeiro, convocando a Polícia Federal
para realizar a evacuação da área. Os indígenas temem que o despejo seja
forçado durante o final de semana pelos soldados do pelotão especial
da Polícia Militar. Preocupam-se também em ser notificados de
reintegração nas outras três fazendas: Cambará, Santa Helena e Querência São
José - esta última abandonada há anos, segundo os Terena.
Uma reação violenta por parte dos fazendeiros e
jagunços também é esperada pelos Terena. “Enquanto escrevemos essa carta,
muitos fazendeiros de todo Mato Grosso do Sul estão com suas caminhonetes
forçando para entrar na ocupação. Jagunços e seguranças fortemente armados
estão nos rondando e provocando. Se eles derramarem nosso sangue, a culpa é dos
fazendeiros e do governo que não dá um basta nessa violência”, diz o documento.
No documento, os Terena críticam propostas de alteração à
Constituição, no Congresso Nacional, e portaria do governo federal: “Já ouvimos
a resposta do governo federal às nossas reivindicações: Portaria 303, PEC 215,
intervenção na Funai e orquestrações para paralisar processos de demarcação de
terra”.
A comunidade afirma que não sairá da terra, mesmo com a reintegração
de posse. “Já fomos baleados, presos, espancados e despejados muitas vezes. Mas
aqui nós vamos ficar”, conclui a carta. Leia aqui a
perícia antropológica, arqueológica e histórica solicitada pela Justiça Federal
e realizada pelos especialistas Jorge Eremites de Oliveira e Levi Marques
Pereira sobre a Terra Indígena Buriti. Abaixo, a carta divulgada pelos Terena.
*Fonte: Cimi
Carta Terena à sociedade: porque estamos retomando nosso
território Buriti
Nós somos o povo Terena da Terra Indígena Buriti. Mais de 100
anos atrás, nós fomos expulsos daqui pela ambição do homem branco. Há 15 anos
nós lutamos para retomar nosso território tradicional.
Nessa luta fomos novamente expulsos da nossa terra em muitas
ocasiões. Agora querem nos expulsar mais uma vez. Escrevemos essa carta para
explicar à sociedade porque estamos lutando pela nossa terra, porque retomamos
nosso território.
Hoje, somos 5 mil pessoas confinadas em menos de meio hectare
cada. Dos 17 mil hectares declarados como território tradicionalmente ocupado
por nós Terena em 2010 pelo governo federal, temos a posse de apenas 3 mil. Os
outros 14 mil hectares estão ocupados por 25 fazendas.
Nesta semana, nós retomamos a fazenda Buriti, a fazenda
Cambará, a fazenda Santa Helena e a sede da fazenda Querência São José,
abandonada há anos - todas incidentes sobre nosso território.
Nós retomamos essas terras porque elas são nossas e porque
não temos terra para plantar.
Nosso povo planta muito. Nas nossas retomadas, temos 350
hectares plantados de mandioca,milho, batata, feijão de corda, cana,
abóbora, melancia, eucalipto, maxixe e banana. É assim que vivemos e
trabalhamos. Vocês conseguem imaginar como seria ficar mais de um século sem
sua terra? É assim que nós estamos.
Todas as vitórias que conquistamos foram fruto da nossa luta,
das nossas retomadas. Sabemos que não adianta ficar esperando pela boa vontade
de um governo que cede a todas as pressões dos fazendeiros. Já ouvimos a
resposta do governo federal às nossas reivindicações: Portaria 303, PEC 215,
intervenção na Funai e orquestrações para paralisar processos de demarcação de
terra.
Com apoio do governo, os fazendeiros estão se organizando
cada vez mais. Enquanto escrevemos essa carta, muitos fazendeiros de todo Mato
Grosso do Sul estão com suas caminhonetes forçando para entrar na ocupação.
Jagunços e seguranças fortemente armados estão nos rondando e provocando. Se
eles derramaram nosso sangue, a culpa é dos fazendeiros e do governo que não dá
um basta nessa violência.
Dizemos aos fazendeiros e seus pistoleiros: também estamos
organizados. Todos os povos do Mato Grosso do Sul estão juntos na mesma luta, e
chamamos todos os patrícios e parentes para nos ajudar agora nesta luta pela
vida. Por terra para todas as nossas crianças.
Queremos nossas terras livres e demarcadas. Vamos retomar
nossas terras hectare por hectare. Já fomos baleados, presos, espancados e
despejados muitas vezes. Mas aqui nós vamos ficar. Esta é nossa fala.
Terra Indígena Buriti, 17 de maio de 2013