O Conselho Indigenista
Missionário (Cimi) vem a público denunciar a forma absolutamente ilegal e
autoritária como foram tratados seus missionários e funcionários pela Polícia
Federal no município de Sidrolândia, em Mato Grosso do Sul, no
contexto da reintegração de posse da fazenda Buriti, ocupada por indígenas
desde a última quarta-feira, 15.´
Há um histórico de
ilegalidades nos despejos das comunidades Terena. Particularmente na Terra
Indígena Buriti, em 19 de novembro de 2009, mesmo havendo decisão judicial
favorável a posse da comunidade, os indígenas foram violentamente despejados
por cerca de 30 fazendeiros e 60 policiais militares. Por temerem que a
história se repetisse, os indígenas solicitaram a presença de uma delegação de
observadores externos, no sentido de coibir possíveis violações por parte dos
aparelhos de repressão do estado.
Dessa forma, o Cimi, em
conjunto com a Comissão Pastoral da Terra (CPT), Comissão Permanente de
Assuntos Indígenas da Ordem dos Advogados do Brasil (COPAI/OAB-MS), o Centro
de Defesa de Direitos Humanos – Marçal de Souza Tupã’i (CDDH), a ONG Azul,
a Conferência dos Religiosos do Brasil (CRB-MS), o Comitê Nacional de Defesa
dos Povos Indígenas de Mato Grosso do Sul (CONDEPI) e o Coletivo Terra Vermelha
foram em comitiva, no último sábado, 18, acompanhar o cumprimento da ordem de
reintegração de posse da fazenda Buriti - parte dos 17 mil hectares declarados
em 2010 pelo Ministério da Justiça como território tradicionalmente ocupado
pelo povo Terena da Terra Indígena Buriti.
Na ocasião, o jornalista do
Cimi, Ruy Sposati, teve seus equipamentos arbitrariamente confiscados pelo
delegado da Polícia Federal, Alcídio de Souza Araújo, que, não deu qualquer
justificativa que identificasse alguma legalidade na apreensão. Além da
ausência de ordem judicial de busca e apreensão, a atitude do delegado
constitui flagrante ilegalidade de acordo com a Lei Nº 4.898 cujo artigo 3º,
item J, reza que constitui abuso de autoridade “qualquer atentado aos direitos
e garantias legais assegurados ao exercício profissional”.
Este não é um caso isolado.
Durante a ocupação indígena do plenário da Câmara dos Deputados, em abril deste
ano, o jornalista Renato Santana, editor do jornal Porantim, jornal impresso
mensal do Cimi, foi espancado pela polícia legislativa enquanto realizava
cobertura da ação. Na ocupação indígena da usina hidrelétrica Belo Monte, em
maio, jornalistas que cobriam o caso foram expulsos pela Polícia Militar e pela
Força Nacional, através de uma decisão judicial, e o jornalista de nossa
entidade foi multado em mil reais por ter realizado a cobertura dos
acontecimentos. Em relação a todos estes casos, entraremos com medidas
judiciais e denúncias cabíveis com mandado de segurança na Justiça,
representações no Ministério Público Federal e na Corregedoria da Polícia
Federal.
No Brasil, cada vez mais a
polícia tem cumprido o papel de interlocutora política nos conflitos de terra e
de violações de direitos aos povos indígenas. O que tem ocorrido é a
militarização dos contextos de conflito social relativos à luta por direitos
dos indígenas. A institucionalização dessa prática é um atentado brutal ao
exercício profissional de um jornalista, à liberdade das organizações
sociais e, mais ainda, às relações democráticas e de direito estabelecidas em
nossa sociedade.
Denunciamos este ato de
censura injustificado, arbitrário e ilegal. Está se tornando prática
institucional dos órgãos de repressão governamentais atacarem indígenas que
lutam por seus direitos, e também a imprensa e as organizações que buscam dar
visibilidade a estas ações.
Ao mesmo tempo, jogamos luz
ao fato de que toda a perseguição que jornalistas e organizações indigenistas
sofrem tem como perspectiva política a viabilização das demandas de ruralistas,
latifundiários do agronegócio - e do próprio governo brasileiro, que tem
capitulado cada vez mais com os interesses destes e do capital, e
se justifica a partir de uma leitura e prática absolutamente racistas.
Nessa perspectiva, os indígenas são considerados e tratados por estes setores
da sociedade como seres inferiores, incapazes de tomarem decisões próprias - e
que, por isso, seriam controlados por não-indígenas.
Reafirmamos nossa
solidariedade aos povos indígenas do Brasil e às suas lutas autônomas e
destemidas na reconquista de seus territórios tradicionais, efetiva garantia de
paz, justiça e vida destes povos.
Brasília, DF, 20 de maio de
2013
Assista ao vídeo do confisco
ilegal do delegado da PF, Alcídio de Souza Araújo: