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sábado, 6 de setembro de 2014

Amazônia, Reforma Agrária, quilombolas, indígenas e meio ambiente no programa eleitoral de Marina Silva (PSB)


Foi verificada no documento  “Programa de Governo – Plano de Ação para Mudar o Brasil”  (241 páginas) da candidata Marina Silva (PSB) a ocorrência das seguintes temáticas:

Amazônia: as palavras Amazônia e região amazônica são citadas ao todo 27 (vinte e sete vezes) no documento, entre diagnósticos e propostas.  Algumas vezes a palavra aparece ligada a temáticas como meio ambiente, reforma agrária e indígenas, sendo aqui tratadas nestes temas.

No Plano de Marina, no Eixo 1 (“Estado e Democracia”) é criticado o fato de o Brasil ter perdido o protagonismo internacional nos debates sobre desenvolvimento sustentável. Em contrapartida, o plano defende um Pacto Amazônico entre os países da Pan-Amazônia destinado à proteção dos biomas em comum e ao desenvolvimento regional.

A Amazônia é citada no documento também no Eixo 2: “Economia para o desenvolvimento sustentável", onde se diz:

“A agropecuária brasileira teve importantes ganhos de produtividade nas últimas décadas. A produção cresce mais rápido do que a área cultivada/ pastoreada, mas há importantes desafios a enfrentar para torná-la adequada do ponto de vista socioambiental. Isso porque, apesar de o desmatamento para conversão de áreas florestais para uso agropecuário na Amazônia ter caído de forma expressiva na última década, a expansão ainda avança sobre áreas de florestas e outras formações de vegetação natural em todos os biomas brasileiros, especialmente no Cerrado.”

“(...) será garantir os aportes necessários para o atendimento dos objetivos do Plano de Agricultura de Baixo Carbono (ABC), que deverão ser financiados pelo poder público ou por meio de linhas de crédito. Os recursos serão destinados a estimular o manejo e a recuperação de pastagens, especialmente na Amazônia Legal.”

No mesmo Eixo 2, mas agora capítulo “Conservação e uso sustentável da biodiversidade” é dito:

“Apesar desse enorme potencial, que eleva o Brasil à condição de ‘potência ambiental’, os processos de degradação evoluem em ritmo extremamente acelerado no país. Segundo os Indicadores de Desenvolvimento Sustentável publicados pelo IBGE em 2012, o país já eliminou 88% da Mata Atlântica, 54% da Caatinga, 49% do Cerrado, 54% do Pampa, 20% da Amazônia e 15% do Pantanal.” 

Sobre a questão do desmatamento na região amazônica, é dito também:

“Tivemos avanços nos últimos 20 anos, como a redução expressiva do desmatamento na Amazônia, historicamente nossa principal fonte de emissões de GEE; a aprovação da Política Nacional de Mudanças Climáticas, com metas de redução de emissões; a criação do Fundo Amazônia; e a implementação do Centro Nacional de Monitoramento e Alerta de Desastres Naturais (Cemadem). Porém, os avanços estagnaram nos últimos três anos e, de fato, já há indícios de regressão nessas conquistas.”

“Esses fatos, que por si só já justificariam uma ação enérgica do governo, são agravados pela constatação de que grande parte do desmatamento é ilegal, realizado sem autorização dos órgãos públicos ou autorizado de forma fraudulenta ou com base em informações imprecisas e insuficientemente analisadas. Para reverter essa situação, a bem-sucedida experiência do Plano de Prevenção e Controle do Desmatamento na Amazônia (PPCDAm) – que integrou a ação de 13 ministérios e órgãos do governo federal a partir de 2004, reduzindo o desmatamento na região em mais de 80% − será estendida aos demais biomas terrestres brasileiros (Mata Atlântica, Cerrado, Caatinga, Pantanal e Pampas).”

A Amazônia é lembrada ainda em várias propostas ligadas ao Eixo de “Educação, Cultura e Ciência, Tecnologia e Inovação”.

Reforma Agrária: Aparece como um capítulo de 4 páginas dentro eixo programático “Economia para o desenvolvimento sustentável”. É citada em outros trechos do documento como nas áreas de direitos humanos, agricultura e movimentos sociais.  A expressão aparece 20 (vinte) vezes ao longo do programa.

É dito no programa que num governo Marina Silva seria adotada uma política onde a pequena propriedade seria uma atividade econômica complementar ao agronegócio de escala global. Como se daria isso? Não é especificado.

É afirmado que será adotada uma reforma agrária para além da “questão social” (resolução de conflitos, distribuição de terras e redução do êxodo rural). É criticada a queda no número de famílias assentadas, a concentração na criação de assentamentos em regiões mais isoladas, como a Amazônia, a redução no orçamento dos órgãos agrários e os baixos resultados no número de famílias assentadas durante o governo Dilma Rousseff.

Destaca a necessidade de aprofundar o conhecimento sobre a malha fundiária brasileira, e defende a unificação do Cadastro Nacional de Imóveis Rurais do Incra, com o Cadastro de Imóveis Rurais (Cafir), da Receita Federal e o Cadastro Ambiental Rural (CAR), do Ministério do Meio Ambiente. A proposta de unificação dos cadastros aparece também entre as propostas ligadas a agriculta, incluindo ainda o cadastro de florestas do Serviço Florestal Brasileiro. O novo cadastro de terras seria chamado Cadastro Federal Integrado de Terras Públicas e Privadas.

Para a reforma agrária, há ainda as propostas que destaco:

Lançar uma força tarefa para solucionar os conflitos fundiários, assentando as 85 mil famílias hoje à espera de lotes, segundo estimativas dos movimentos sociais;
Incorporar à economia cerca de 1 milhão de famílias que vivem em minifúndios de agricultura de subsistência oferecendo-lhes assessoria técnica e crédito público subsidiado. A partir daí, elas poderão ter renda, gerando efeito multiplicador na comunidade local;
Priorizar, ao fazer novos assentamentos, a proximidade com as cidades médias do interior, que podem ser a base tanto para polos regionais como para oferta de serviços vinculados à atividade rural;
Atualizar os indicadores de produtividade agrícola e acelerar o diagnóstico da função social da propriedade rural nos aspectos produtivo, ambiental e trabalhista, permitindo a rápida desapropriação nos casos previstos em lei ou premiando aqueles que fazem uso correto da terra, por meio da criação de um Selo da Função Social;
Profissionalizar a gestão da política agrária, não permitindo o aparelhamento político de seus órgãos (Incra, MDA etc.).
Reorganizar o Incra e dotá-lo de recursos e competências que lhe permitam atuar no apoio aos assentamentos rurais e desenvolver programas de assistência aos assentados.

Também há um capítulo inteiro (2 páginas) dedicado à agricultura familiar em que a reforma agrária também é citada.  Para este segmento são 11 (onze) propostas, entre as quais está destinar 10% dos recursos orçamentários da Embrapa em pesquisas relacionadas à agricultura familiar, melhorar o acesso ao Programa de Aquisição de Alimentos e destinar mais recursos ao Programa Nacional de Agricultura Familiar (Pronaf).

No Eixo 6: “Cidadania e identidades”, no item  “Em defesa dos direitos humanos”, o programa da candidata propõe regulamentar uma bandeira histórica de movimentos de luta pela terra e de direitos humanos:

“Regulamentar o confisco de todo e qualquer bem de valor econômico encontrado nas propriedades que sejam flagradas utilizando trabalho escravo e verificar a possibilidade de usar imóvel na reforma agrária ou em programas sociais.”

Dos três candidatos, o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra é citado apenas no programa de Marina. Isso ocorre no Eixo 6, no capítulo “A Sociedade como Protagonista”. O MST é caracterizado como um movimento legítimo, com quem o seu governo manterá interlocução:

“Dentre os movimentos populares com maior força e peso político, podemos destacar, atualmente, o Movimento dos Trabalhadores Sem Terra (MST) e o Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST). O MST lançou bases entre 20 e 22 de janeiro de 1984, no 1º Encontro Nacional dos Sem Terra, em Cascavel, no Paraná. A reunião visava a organizar as ocupações de terra que estavam ocorrendo em 12 estados. O encontro definiu que a ocupação era um dos instrumentos legítimos de trabalhadores e trabalhadoras rurais para a democratizar a terra. Embora os ruralistas tenham imposto emendas à Constituição de 1988, que significaram retrocesso em relação ao Estatuto da Terra, os movimentos sociais tiveram importantes conquistas nessa arena. Os artigos 184 e 186 fazem referência à função social da terra e determinam que, se for violada, a área seja desapropriada para fins de reforma agrária.”

O documento propõe um “diálogo permanente” com os movimentos sociais, por meio de “canais de comunicação mais ágeis e acessíveis” e “implantar efetiva Política Nacional de Participação Social”. É afirmado que um governo Marina se compromete a combater a repressão e a criminalização de movimentos sociais e populares e que seriam adotadas políticas de proteção aos direitos de manifestações pacíficas dos movimentos populares para evitar repressão e criminalização pelos órgãos do Estado.

Quilombos/ quilombolas: Os dois termos aparecem ao todo 41 (quarenta e uma) vezes ao longo do programa, também contando com um subcapítulo específico dentro do Capítulo “Povos e comunidades tradicionais”, no Eixo “Cidadania e identidades”. Neste capítulo, é destacado a importância destes povos para a riqueza humana e cultura do Brasil, suas contribuições a sociobiodiversidade e a importância na proteção dos ecossistemas.

“Povos indígenas e quilombolas deveriam ter seu território garantido, como prevê a Constituição Federal, o que ainda não acontece totalmente. Outros vivem em territórios cuja situação legal é precária, que são diretamente atingidos por uma colonização agressiva e um pseudodesenvolvimento não planejado, resultando em graves danos ambientais, culturais e sociais.”, afirma trecho deste capítulo que diz ainda:

“Índios e quilombolas são o exemplo mais visível de problemas de acesso à saúde e garantia de territórios, dos quais depende seu modo de vida.”

Há dentro deste capítulo, trechos didáticos sobre o número de comunidades quilombolas pelo país, seu processo de formação, o histórico de conquistas sociais e jurídicas e o que é o critério de autodefinição, além de trazer logo a seguir várias questões associadas a estes povos como políticas de igualdade racial, políticas de cotas, combate ao racismo, etc. Neste trecho, destaco:

“O debate sobre racismo ganhou espaço a partir do governo Lula, mas diminuiu no governo Dilma. O mesmo pode-se dizer sobre as políticas de ação afirmativa. O Estatuto da Igualdade Racial, instituído no governo Lula, foi negligenciado pela sucessora. A Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial (Seppir) foi criada na gestão de Lula, mas o orçamento se tornou incipiente no atual governo. Houve reconhecimento e titulação de Terras Quilombolas nas gestões de Lula, mas na de Dilma, os avanços foram tímidos. Houve também, no governo Dilma, a cooptação dos líderes dos movimentos negros organizados. Realizaram-se encontros com lideranças, sem a presença de setores organizados dos movimentos. Essa postura da secretaria se deu em comum acordo com a Presidência da República e resultou no afastamento das entidades que deveriam representar o anseio da população negra menos favorecida.”

O programa afirma que vai assegurar e garantir os direitos dos povos e comunidades tradicionais. Especificamente para os quilombolas, é proposto:

“Acelerar os processos de reconhecimento e titulação de Terras Quilombolas”
“Criar programa de fomento à criação de cooperativas de artistas indígenas e quilombolas, como forma de aliar a valorização da tradição à geração de renda.”
“Oferecer mais espaço para o ensino sobre os povos indígenas, quilombolas e sobre os povos e comunidades tradicionais no sistema nacional de educação.”

Como parte do Plano de Reforma Agrária da candidata, é apontada a paralisia na regularização de território quilombolas e se propõe “qualificar” os processos de titulação destas áreas:

“Em outra frente, o governo vem perdendo as possibilidades de regularizar os territórios quilombolas. Em 2012, havia 193 comunidades quilombolas tituladas, e outras 1.167 aguardavam titulação de terras no Incra. De 2003 a 2010, expediram-se 75 títulos, em 66 territórios, para 99 comunidades. Entre 2011 e 2012, foram expedidos outros 19 títulos, em 17 territórios, para 18 comunidades quilombolas.”

E é proposto:
 “Priorizar e qualificar os processos de regularização fundiária, especialmente na Amazônia, no Nordeste, na faixa de fronteira e nos territórios quilombolas.”

No eixo de Educação, o programa ressalta as desigualdades étnicas e cita o crescimento no número de matrículas de estudantes em “aldeias e quilombos”, mas ressalta a “grande perda de alunos quando se compara o total de estudantes nos anos iniciais e finais do Ensino Fundamental”.

No Eixo 4, que trata de “Inclusão Social”, é dito:
“As comunidades quilombolas, por exemplo, cujas trajetórias são marcadas pelo racismo e pela negação da sua diferença cultural, não podem ser classificadas simplesmente como “pobres” e atendidas por meio de políticas genéricas de Estado”. A frase aparece no contexto da necessidade de políticas específicas para públicos específicos.

No Eixo 1 (“Estado e democracia”), os quilombolas são lembrados também como um setor excluído e não representado no atual sistema político, caracterizado pela candidata como em crise:

“O show eleitoral de grandes partidos é um empreendimento milionário. Isso se reflete na composição atual do Parlamento: segundo registros do Tribunal Superior Eleitoral, em 2010, das 513 campanhas mais caras, para uma vaga na Câmara dos Deputados, 390 garantiram sucesso nas eleições. Com isso, a representação não se dá de forma equilibrada, excluindo grupos inteiros de cidadãos, como indígenas, negros, quilombolas e mulheres.”


Índios/ indígenas: As duas palavras aparecem ao todo 48 (quarenta e oito vezes) ao longo do programa. Assim como no caso dos quilombolas, onde a palavra aparece associadas várias vezes, há um subcapítulo exclusivo para tratar da questão indígenas dentro do Eixo 6: “Cidadania e Identidades” e várias outras citações em outros eixos do programa.

Neste Eixo 6,  é feito uma caracterização geral dos 241 povos indígenas existentes no país, sua diversidade cultural e sua importância para o país. A atual política indigenista do governo federal é caracterizada da seguinte forma:

“No governo Lula, discutiu-se amplamente uma Política Nacional de Gestão Ambiental das Terras Indígenas (PNGATI). A presidente Dilma Rousseff, por sua vez, assinou o decreto que institui a PNGATI, mas até agora não houve investimento significativo na implementação. Há alguns planos de gestão de terras específicas ainda em elaboração, mas quase nada está efetivamente sendo executado. Na região amazônica, onde a demarcação avançou significativamente, ainda não há solução consistente para gerir os extensos territórios demarcados. Ocorrem conflitos pela posse de recursos naturais, motivados quer pela pressão de frentes garimpeiras e madeireiras, quer pela execução de obras públicas sem planejamento nem consulta aos povos afetados. Em outras regiões, como o Mato Grosso do Sul, a paralisação do processo demarcatório e a ocupação de território por não-índios fazem agravar as disputas por terra.

Os maiores conflitos envolvem terras de ocupação indígena tradicional que foram tituladas em favor de terceiros em diferentes ocasiões, seja pela União, seja pelos estados. No caso de demarcações tardias, a Constituição previa que se concluíssem até cinco anos após a promulgação; havendo incidência de títulos legítimos, os portadores deveriam ser indenizados para reconstruir nos mesmos padrões a vida em outros lugares, sobretudo quando há demanda por ampliação de terras antes demarcadas em extensão insuficiente. Os cinco anos, no entanto, não foram cumpridos pelo governo federal: a demarcação não foi feita.”

O documento critica também a gestão da saúde indígena e ausência de um sistema federal específico de educação indígena. É afirmado que a Funai “está enfraquecida e a CNPI é inconstante, convocada apenas em momentos de crise, conforme a conveniência do governo.”

No eixo “Cidadania e identidade”, é dito:
“O processo de expropriação de povos e comunidades tradicionais acabou agravado por mudanças em marcos legais, como o Código da Mineração, o Código Florestal e o Projeto de Lei Mineração em Área Indígena, entre outros. Em nome do crescimento econômico, tais modificações flexibilizaram os direitos territoriais dos povos tradicionais e a mercantilização dos recursos naturais.”

 Dentre as propostas apresentadas, destacam-se:

Estabelecer mecanismos de gestão de conflitos para finalizar a demarcação das Terras Indígenas, como previsto na Constituição Federal.
Reconhecer os povos e comunidades tradicionais do Brasil como sujeitos de direito perante a OIT, no que se refere ao direito de consulta normatizado pela Convenção 169.
Regulamentar o processo de consulta prévia e informada aos povos indígenas – prevista na Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT) – sobre obras públicas e projetos de desenvolvimento regional que afetem as suas terras.
Completar a demarcação das terras indígenas, com indenização aos atuais proprietários, quando cabível, como alternativa para reduzir conflitos.
Fortalecer técnica e politicamente a Funai, a fim de que possa mediar os atuais conflitos e cumprir sua parte na gestão das terras demarcadas.
Reestruturar o Ministério da Justiça para que atue com rigor ao decidir sobre os limites das terras a demarcar, provendo justiça, tutelando os direitos coletivos dos índios e articulando os ministérios envolvidos na política indigenista.
Dar maior atenção à formação de profissionais de saúde indígena e adotar metas para melhorar os indicadores de saúde dos índios.
Transformar a Comissão Nacional de Política Indigenista (CNPI) em Conselho, com poderes deliberativos e força de lei, prevendo recursos para que representantes indígenas exerçam sua função.
Criar um fundo de regularização fundiária para indenizar povos que ocupam terras originalmente indígenas por erro do Estado que os assentou nessas localidades, reduzindo conflitos e reparando injustiças bem como acelerando as demais demarcações de terras”

No Eixo 3 (“Educação, Cultura e Ciência, Tecnologia e Inovação”),  é dito da necessidade de preservar conhecimentos e memórias (patrimônio imaterial), e é dado como exemplo de patrimônio salvaguardado arte kusiwa– técnica de pintura e arte gráfica dos índios wajãpi, do Amapá. Neste mesmo eixo, o documento critica a apropriação de conhecimentos de grupos tradicionais por grupos econômicos, sem qualquer benefício para as comunidades:
.
Sobre isso, é proposto, entre outros pontos:
“• Propor legislação específica para o reconhecimento e proteção de conhecimentos tradicionais, tema que leis atuais de propriedade intelectual não podem abranger”.

Meio ambiente: Dos cinco temas aqui tratados, é o único que aparece em todos os eixos do programa de Marina. Também, dos cinco temas aqui escolhidos, é aquele em que a candidata Marina Silva apresenta as maiores contradições.

No Eixo 1: “Estado e democracia”, fala-se em uma gestão “socioambiental”  da administração pública e práticas sustentáveis em todos os níveis de governo, o que na prática se materializaria na adoção obrigatória da  “Agenda Ambiental na Administração Pública (A3P)”, cursos de educação ambiental para gestores,  obrigatoriedade de os órgãos públicos elaborarem inventário de emissões de gases de efeito estufa e de definirem meta para reduzi-las, mudanças legislativas  e administrativas, “compras verdes” de produtos ambientalmente corretos, entre outros.

O “meio ambiente saudável” é tratado como um dos “objetivos indissociáveis da “nova estratégia federativa”. Também é abordado com  parte de uma “agenda socioambiental e cultural” de integração econômica na América do Sul, via fortalecimento da Unasul, ao mesmo tempo em que se fala em “abrir as portas para o Pacífico” para a economia.  O documento defende  “a inclusão da questão ambiental na agenda do G-20”. Ainda em relação a política externa, é dito sobre os BRICS:

“Não podemos, todavia, desconsiderar as diferenças nas agendas econômica, política, cultural e ambiental dos Brics, assim como na pauta de direitos humanos e liberdades civis de cada um dos países do bloco. A fim de que o diálogo no grupo seja construtivo e realista, é preciso reconhecer essas diferenças.”

Ainda no Eixo 1, no capítulo sobre Forças Armadas, é afirmado:  

“Em sua missão de defender a pátria, as Forças Armadas devem incorporar a missão de proteção do meio ambiente – particularmente da biodiversidade contra a biopirataria (...).”

No Eixo 2 (“Economia para o desenvolvimento sustentável”) fala-se de uma reforma tributária “do ponto de vista socioambiental”.

A matriz energética brasileira é caracterizada como “otimizada do ponto de vista socioambiental, de forma segura, competitiva e sustentável”. É dito sobre a energia proveniente de hidrelétricas:

“A geração, contudo, se baseia em fontes hídricas, o que representa um desafio à segurança energética e impõe desafios socioambientais importantes, que precisam ser superados.”

Sobre os biocombustíveis:

“A política de apoio à revitalização dos biocombustíveis será associada ao estímulo à implementação de programas de certificação socioambiental a fim de garantir que sua produção se dê de forma social e ambientalmente sustentável, respeitando os diretos trabalhistas.”

As unidades de conservação aparecem como item do Eixo 2, ou seja, são vistas como estratégicas para a implantação de uma “Economia para o Desenvolvimento Sustentável”. Enquanto por um lado o programa de Maria fala em priorizar a criação de unidades de conservação de forma que pelos menos 10% de cada um dos biomas nacionais devam estar protegidos, por outro, propõe, por meio de parcerias públicas privadas, entregar a gestão de parques nacionais para grupos empresariais.

 “O plano deverá especificar as unidades prioritárias a partir de sua viabilidade econômica, priorizando, inicialmente, as que já atraem grande número de visitantes e considerando estratégias de atração de investimentos como o modelo de parceria público-privada (PPP). É preciso também implementar esses modelos de gestão nos parques da Amazônia, transformando o turismo sustentável em importante fonte de renda para a região.”

O item “Economia Global Florestal”, expressa novamente o viés neoliberal (capitalismo verde) de concessão de florestas públicas para exploração madeireira:

Cerca de 60% da exploração florestal na Amazônia ainda ocorre de forma ilegal e concorre de forma desleal com a produção oriunda de planos de manejo sustentável. Tal descontrole fez do setor uma fonte de degradação e um catalisador do desmatamento. Por outro lado, as concessões florestais lentamente estão se tornando a principal fonte de manejo florestal em bases sustentáveis na região e devem atingir 1 milhão de hectares em 2014. Um avanço tímido diante do potencial de 13 milhões de hectares estimado pelo Serviço Florestal Brasileiro.”

Diante deste diagnóstico é proposto:
Zerar a perda de cobertura florestal no Brasil.
Ampliar para 5% a participação do Brasil no comércio mundial de produtos florestais.
Aumentar em 40% a área de florestas plantadas.
Duplicar a área sob Manejo Florestal Sustentável (Amazônia e Caatinga).
Atingir 8 milhões de hectares de concessão florestal, incluindo as concessões para reflorestamento e recuperação florestal.
Dobrar a área de florestas públicas destinadas ao uso sustentável.
Implementar amplo programa de tecnologia de refinamento de biomassa florestal visando à produção de combustíveis, polímeros, fertilizantes, fármacos, essências e outros produtos.

As reservas extrativistas (resex), modalidade de unidade de conservação para comunidades tradicionais, recebem um correto destaque dentro do Eixo 6: “Identidade e Cidadania” e não de “Economia para o desenvolvimento sustentável”, onde outras unidades de conservação são citadas. Neste eixo 6, aparece a seguinte proposta:

“Retomar os processos de criação de Unidades de Conservação de Uso Sustentável – especialmente Reservas Extrativistas e Reservas de Desenvolvimento Sustentáveis.”

No Eixo 3: “Educação, Cultura e Ciência, Tecnologia e Inovação”  aborda-se a ideia de uma nova abordagem de educação ambiental, como tema transversal de todos os currículos.  O meio ambiente também aparece como parte integrante da política de proteção (não seria mercantilização?) do patrimônio imaterial:

“Propor lei de compensação antropológica, científica e arqueológica, similar à lei de compensação ambiental, que traga recursos para ações em comunidades tradicionais e sítios arqueológicos afetados por obras.”

No Eixo 5: “Novo urbanismo”, a questão ambiental aparece vinculada também à qualidade de vida nas cidades e ao saneamento básico.

Leia ainda as propostas para as 5 temáticas dos candidatos Dilma Rousseff  e Aécio Neves

quinta-feira, 21 de agosto de 2014

Marina cresce entre descontentes

Por Cândido Neto da Cunha*

Previamente, aviso que não sou eleitor de Marina Silva. Longe disto, a considero (mais um) grande engodo para desavisados. Esta minha opinião vem de longa data, desde a sua passagem pelo Ministério do Meio Ambiente ainda no governo Lula, com sua atuação na concessão das licenças ambientais para as usinas hidrelétricas do rio Madeira atropelando pareceres técnicos em contrário, a Lei de Gestão de Florestas Públicas que possibilita transferir terras públicas para madeireiras , o esfacelamento do Ibama e a liberação dos transgênicos, só para ficar na área ambiental, onde Marina seria uma “referência”. Neste sentido, vale a leitura do texto “A Rede de Marina” no blog do seringueiro Osmarino Amâncio.

Também não sou de confiar muito em pesquisas eleitorais, ainda mais essa última do Datafolha, produzida ainda sob o impacto da morte de Eduardo Campos e quando Marina ainda nem ainda era dada como um nome certo para sua substituição como candidata à Presidência.

Mas, os dados do Datafolha, ainda que levado em conta o aspecto da inconfiabilidade que inicialmente destaquei, mostram Marina como a mais nova candidatura a Presidência a ser batida. Seu nome, no momento e conforme a pesquisa torna quase certa a existência de segundo turno, coisa que não aparecia com certeza até então. Aliás, salvo engano, é a primeira vez desde 2002 que em pesquisas eleitorais para a Presidência em que o PT não aparece liderando.  Marina aparece empatada com Aécio Neves (PSDB) no primeiro turno (21% a 20%), e, no limite da margem de erro da pesquisa, supera Dilma Rousseff (PT) no segundo turno (47% a 43%).  

Feitas essas considerações iniciais, destaco que a agora confirmada candidatura de Marina é que mais sofre ataques nas redes sociais, especialmente dos petistas, que vão da crítica às fraquezas da sua candidatura até a desqualificação por meio de métodos mais baixos, os mesmos aliás por quais o PT já foi vítima no passado.

Em relação aos ataques que vem sofrendo, Marina possui dois grandes trunfos a seu favor e que também podem ajuda-la a superar a grande desvantagem que tem no tempo de TV, a menor “capilaridade política” (pra não usar um termo chulo) e as contradições (gigantescas) que sua aliança eleitoral tem: o sentimento de descontentamento de parte do eleitorado e os caminhos conservadores também adotados pelos governos do PT.

Aliás, todas as pautas conservadoras apontadas em Marina, sejam na economia, sejam em relação aos chamados direitos civis (homossexuais e direitos da mulher), não é em nada diferente das políticas concretas adotadas pelo governo Dilma, essa sim uma verdadeira “talibã fundamentalista” nas áreas ambientais, indígena e agrária, temas que ainda são identificados como símbolos em Marina.

O eleitor de Marina é no momento, conforme o próprio Datafolha, o típico eleitor petista do passado. Falando de forma generalista, é o eleitor concentrado nos grandes centros urbanos do país, possui maior escolarização, é composto por trabalhadores que recebem salários acima de média nacional, jovens e estudantes, é mais crítico que a média e não dependente dos programas de compensação social. É o setor que politicamente rompeu com PT no passando recente, que não confia no PSDB e que também não é abarcado pelas alternativas da chamada esquerda socialista. É composto por setores que ainda votam “criticamente” em “petistas históricos” até parcela do eleitorado que “não tinha em quem votar” ou iria votar em branco e nulo. 

Soma-se a este perfil, outro com características comuns ao perfil do eleitorado típico (urbano e jovem) e opostas (conservador em relação aos costumes e mais despolitizado), formado por setores pentecostais. Marina pode absorver ainda parte do eleitorado padrão do PSDB, sem a imagem da “herança maldita” dos tucanos, trabalhada eleitoralmente pelo PT já há quatro eleições. Em resumo, Marina pode se apresentar como a imagem da “petista” sem o PT e da tucana sem o PSDB.

Reside na “união” destes dois aparentes contraditórios o grande trunfo eleitoral de Marina. Num eventual segundo turno ela canaliza para si uma parte dos votos de setores que historicamente votavam no PT e uma parte do eleitorado que historicamente sempre foi avesso ao PT, mesmo com sua guinada à direita e que jamais votará em Dilma, por mais “concessões” que ela faça. Essa possibilidade isola o PT ao chamado “lulismo” (trabalhadores desorganizados e precarizados, dependentes dos programas de compensação social, o chamado eleitorado menos ideológicos) e a parte da burguesia nacional (internacionalizada), de pequena densidade eleitoral, mas de grande poder de financiamento de campanha e de controle direto sobre os grandes meios de comunicação. 

Soma-se a tudo isso, o índice ainda alto de rejeição de Dilma, entorno de 34%, enquanto Marina seria rejeitada por apenas 11% do eleitorado, os dois extremos da pesquisa Datafolha em relação a este aspecto.

Ainda é muito cedo para conclusões mais definitivas. A melhora na avaliação no governo apontada também pelo Datafolha, o grande volume de financiamento de campanha, o tempo na TV, as assuntos que serão pautados pelas grandes mídias e o “fator Lula” poderão reverter o cenário em favor de Dilma e de Aécio. Mas, pela primeira vez em vinte anos, o PT e o PSDB não polarizarão uma eleição no país e é praticamente certo que um dos dois, não estará num segundo turno. Marina configura-se assim um terceiro polo nesta eleição e a torna completamente incerta, não podendo ser uma candidata a ser subestimada e sim, a ser batida.

*Direto para o blog Língua Ferina.

sábado, 7 de dezembro de 2013

Com autorização judicial e presença de Katia Abreu, é realizado 'Leilão da Resistência' em Mato Grosso Sul



Com autorização da Justiça e a presença de vários políticos ruralistas ocorreu hoje, 07 de dezembro o chamado “Leilão da Resistência”, evento promovido pela Associação dos Criadores de Mato Grosso doSul (Acrissul) e destinado a obtenção de recursos para pagamento de milícias para atuarem contra as mobilizações indígenas no estado. 

Comunidades indígenas entraram com ação para impedir o evento e tiveram o pedido aceito pela juíza Janete Lima Miguel, da 4ª Vara Federal em Campo Grande. A Famasul (Federação da Agricultura e Pecuária do Estado de Mato Grosso do Sul (Famasul)) e a Acrissul recorreram e tiveram decisão favorável, em caráter liminar, tomada pelo juiz federal Pedro Pereira dos Santos, em substituição na 2ª Vara Federal.

O magistrado autorizou a realização do leilão, porém com duas ressalvas. A primeira delas diz que deverá ser apresentado na segunda-feira (9) um demonstrativo com toda a movimentação financeira do evento, incluindo os nomes dos doadores, valores iniciais e finais dos lances e nomes dos arrematantes.

A segunda estabelece que o valor arrecadado deverá ser depositado em conta judicial na segunda. O dinheiro só poderá ser movimentado após a decisão final do processo e depois de ouvidos representantes do Ministério Público Federal (MPF) e demais envolvidos.

O presidente da associação, Francisco Maia, chegou a afirmar que um dos propósitos do leilão era arrecadar recursos para mobilização, logística, pagamento de honorários de advogados e até mesmo para segurança. À Justiça, a entidade sustentou que o dinheiro não será usado para compra de armas e formação de milícias.


Foto: Tatiane Queiroz/ G1 MS

Além de Maia, estão presentes os deputados federais Ronaldo Caiado (DEM-GO), Luiz Henrique Mandetta (DEM-MS) e Fábio Trad (PMDB-MS) e os senadore Waldemir Moka (PMDB-MS) e Katia Abreu (PDS-TO) que também é presidente da Confederação Nacional da Agricultura. Foram leiloados animais, grãos e equipamentos.

Com auditório cheio de fazendeiros, todos os que subiam ao palanque entoavam a resistência contra a demarcação das terras indígenas. “Essa é a resistência democrática que o MS levanta nesse momento. Chega de desrespeito ao cidadão que faz e que produz”, disse a estrela da noite, o deputado federal pelo estado de Goias, Ronaldo Caiado (DEM). A sendora Kátia Abreu (PSD) de Tocantins também estava presente. Antes do leilão ela afirmou que a Funai é falida, retrógrada e atrasada.

Com um dos discursos mais aplaudidos pelos participantes o deputado afirma que a questão indígena é um problema para todo o país e que o Cimi (Conselho Indigenista Missionário) e a Funai são “preconceituosos contra os produtores brasileiros”.

Para o deputado estadual Zé Teixeira (DEM) pouco importa o leilão e o dinheiro arrecadado e sim que cada produtor conseguir defender sua propriedade. “Há anos os produtores gastam com as invasões. Se o banco tem um segurança na porta, por que a fazenda não pode ter? Esse leilão é um alerta para mostrar que o setor produtivo não vai esperar pelo poder publico e precisa de segurança”, fala.

“Não é o índio que invade e sim essas ONGs, essas organizações de esquerda, que querem desarticular o setor produtivo brasileiro”, garante.

O senador Moka (PMDB) afirmou que o leilão é justo, porque ele é realizado com dinheiro dos produtores rurais e é conseguido com suor e trabalho dos mesmos. “Esses são recursos para a defesa das propriedades. Aqui no MS nós não temos terra grilada nem terra invadida. Nós temos terra produtiva”, disse em discurso.

O evento, muito bem organizado, contou com garçons servindo água, refrigerante e cerveja para os participantes que estavam dentro do local. Quem preferiu ficar lá fora, podia ver os discursos e o leilão embaixo de uma tenda montada com dois televisores e vários climatizadores. No período da noite foram vendidos espetinhos com mandioca por R$10, para quem ficar até o final.

*As informações são do G1 e MidiaMax. Charge: Latuff

sábado, 20 de julho de 2013

Deputado relator do PLP227 afirma que críticas ao projeto são “abobrinhas”


O deputado federal Moreira Mendes (PSD-RO), relator do Projeto de Lei Complementar 227/2012 na Comissão de Agricultura da Câmara, subiu à tribuna no último dia 17 de julho para criticar aqueles a quem denominou de “agourentos de plantão”. Mendes afirmou que recebera críticas por meio de redes sociais contra o projeto.

Na tarde da última terça-feira (16 de julho), um tuitaço com o assunto #GolpePLP227Não chegou ao segundo lugar entre os assuntos mais comentados na rede social em todo o mundo. O deputado, que participa do twitter com o perfil @moreiramendes55, foi extremamente criticado por defender o projeto que ameaça os direitos territoriais dos indígenas. 

Saiba mais sobre o PLP 227/2012 AQUI.

Em seu discurso, Mendes atribuiu à manifestação à pessoas que desconhecem o assunto e a “agourentos de plantão”. “Os comentários feitos nas redes sociais estão completamente desprovidos de conteúdo. Esses ongueiros, essa quadrilha de antropólogos, como já foram denunciados inúmeras vezes por aí, não têm interesse nenhum em regularizar a terra indígena. Querem, na verdade, usar o índio como massa de manobra para os seus interesses escusos”, disse o deputado que afirmou ainda que as críticas não passam de “abobrinhas”.

Além do pronunciamento em plenário, a assessoria de imprensa do deputado produziu uma matéria na página do parlamentar repercutindo o assunto.

“Nós da bancada ruralista defendemos sim as comunidades indígenas. Os conflitos estão sendo gerados por conta dessa irracionalidade de algumas pessoas da Funai, que é permeada por esse ranço ideológico, vencido e ultrapassado que não existe mais”, disse o deputado em fala destacada pela matéria.

Trabalho degradante
Além de repercutir o tuitaço contra o PLP 227, Mendes criticou o artigo do professor Vladimir Safatle, publicado no jornal Folha de São Paulo, edição de 16/07, no qual aponta a revolta de operários da usina hidrelétrica de Jirau ocorrida em 2011 como um ensaio geral para as manifestações de junho que tomaram conta do país. No artigo, o professor da USP aponta as “condições degradantes de trabalho” como causa daquela revolta.


Mas, segundo o parlamentar, trata-se de um exemplo inadequado e inaceitável.

“Quero lembrar que duas das três maiores obras em construção no País estão em Rondônia: hidrelétricas de Santo Antônio e de Jirau. Perdoe-me o Sr. Vladimir, mas o senhor não conhece a realidade. Lá não há e nunca houve nada de trabalho degradante, ao contrário, os trabalhadores dessas duas grandes obras seguramente são os mais bem pagos do setor no País, e os que têm as melhores condições de trabalho, a ponto de terem, todos eles, dormitório até com ar-condicionado”, afirmou o deputado.

Folha corrida
Em 13 de dezembro de 2012, o deputado Moreira Mendes foi condenado por improbidade administrativa por desvio de recursos do Poder Legislativo Estadual.

Para o Tribunal de Justiça de Rondônia, a ausência de observância de procedimentos legais na contratação e as ilegalidades cometidas no fornecimento de passagens aéreas (cancelamento de passagens pagas e reembolso ao titular do bilhete; venda de bilhetes em duplicidade; divergência de valores na emissão do bilhetes e das faturas; cobrança de passagens sem emissão de bilhetes) são atos suficientes para configurarem atos de improbidade na forma prevista na Lei n. 8.429/92.

quarta-feira, 19 de dezembro de 2012

Cotada para ministério, Kátia Abreu recebe Dilma no Tocantins


Cotada para assumir um ministério em 2013, a Senadora e Presidente da Confederação Nacional da Agricultura, Kátia Abreu (PSD-TO), recebeu a Presidente Dilma Roussef nesta quarta-feira (19 de dezembro) em Palmas, capital do Tocantins.

Num evento de formatura do Pronatec Campo (Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e Emprego), promovido pelo “braço educacional da CNA”, o Serviço Nacional de Aprendizagem Rural (SENAR), Kátia era só elogios à Presidente.

"A aprovação de 78% dos brasileiros indica que todos, inclusive nós, tocantinenses, [se] identificam pelo que de fato a senhora é: administradora eficiente, intolerante com a corrupção, democrata acima de tudo e agora, sem dúvida, a presidente da educação", afirmou a líder ruralista em seu discurso.

O Pronatec é mantido por verbas públicas do governo federal e executado em parceria entre o Ministério da Educação e as instituições do Sistema S.

O Pronatec Campo está sendo apresentado pelo Incra como uma das “Novas Diretrizes” que estaria fortalecendo o Programa Nacional de Educação na Reforma Agrária (Pronera), que é defendido por movimentos sociais ligados ao Movimento por uma Educação do Campo, uma concepção antagônica à educação da CNA.

*Com informações da Folha, SENAR, MEC e Cnasi.

Leia também: CNA e Incra acertam “libertação de assentamentos

segunda-feira, 26 de novembro de 2012

Kátia Abreu, antropóloga, criadora da abreugrafia

Por José Ribamar Bessa Freire*

Nelson Rodrigues só se deslumbrou com "a psicóloga da PUC" porque não conheceu "a antropóloga da Folha". Mas ela existe. É a Kátia Abreu. É ela quem diz aos leitores da Folha de São Paulo, com muita autoridade, quem é índio no Brasil. É ela quem religiosamente, todos os sábados, em sua coluna, nos explica como vivem os "nossos aborígenes". É ela quem nos ensina sobre a organização social, a distribuição espacial e o modo de viver deles.

Podeis obtemperar que o caderno Mercado, onde a coluna é publicada, não é lugar adequado para esse tipo de reflexão e eu vos respondo que não é pecado se aproveitar das brechas da mídia. Mesmo dentro do mercado, a autora conseguiu discorrer sobre a temática indígena, não se intimidou nem sequer diante de algo tão complexo como a estrutura de parentesco e teorizou sobre "aborigenidade", ou seja, a identidade dos "silvícolas" que constitui o foco central de sua - digamos assim - linha de pesquisa.

A maior contribuição da antropóloga da Folha talvez tenha sido justamente a recuperação que fez de categorias como "sílvicola" e "aborígene", muito usadas no período colonial, mas lamentavelmente já esquecidas por seus colegas de ofício. Desencavá-las foi um trabalho de arqueologia num sambaqui conceitual, que demonstrou, afinal, que um conceito nunca morre, permanece como a bela adormecida à espera de alguém que o desperte com um beijo. Não precisa nem reciclá-lo. Foi o que Kátia Abreu fez.

Com tal ferramenta inovadora, ela estabeleceu as linhas de uma nova política indigenista, depois de fulminar e demolir aquilo que chama de "antropologia imóvel" que seria praticada pela Funai. Sua abordagem vai além do estudo sobre a relação observador-observado na pesquisa antropológica, não se limitando a ver como índios observam antropólogos, mas como quem está de fora observa os antropólogos sendo observados pelos índios. Não sei se me faço entender. Mas em inglês seria algo assim como Observing Observers Observed.  

Os argonautas do Gurupi
Todo esse esforço de abstração desaguou na criação de um modelo teórico, a partir do qual Kátia Abreu sistematizou um ousado método etnográfico conhecido como abreugrafia que, nos anos 1940, não passava de um prosaico exame de raios X do tórax, uma técnica de tirar chapa radiográfica do pulmão para diagnosticar a tuberculose, mas que foi ressignificado. Hoje, abreugrafia é a descrição etnográfica feita com o método inventado por Kátia Abreu, no caso uma espécie de raio X das sociedades indígenas.

Esse método de coleta e registro de dados foi empregado na elaboração dos três últimos artigos assinados pela antropóloga da Folha: Uma antropologia imóvel (17/11), A Tragédia da Funai(03/11/) e Até abuso tem limite (27/10) que bem mereciam ser editados, com outros, num livro intitulado "Os argonautas do Gurupi". São textos imperdíveis, que deviam ser leitura obrigatória de todo estudante que se inicia nos mistérios da antropologia. A etnografia refinada e apurada que daí resulta quebrou paradigmas e provocou uma ruptura epistemológica ao ponto de não-retorno.

A antropóloga da Folha aplicou aqui seu método revolucionário - a abreugrafia - que substituiu o tradicional trabalho de campo, tornando caducas as contribuições de Boas e Malinowski. Até então, para estudar as microssociedades não ocidentais, o antropólogo ia conviver lá, com os nativos, tinha de "viver na lama também, comendo a mesma comida, bebendo a mesma bebida, respirando o mesmo ar" da sociedade estudada, numa convivência prolongada e profunda com ela, como em  'Lama', interpretada por Núbia Lafayette ou Maria Bethania.

A abreugrafia acabou com essas presepadas. Nada de cantoria. Nada de anthropological blues.Agora, o antropólogo já não precisa se deslocar para sítios longínquos, nem viver um ano a quatro mil metros de altura, numa pequena comunidade nos Andes, comendo carne de lhama, ou se internar nas selvas amazônicas entre os huitoto, como fez um casal de amigos meus. E tem ainda uma vantagem adicional: com a abreugrafia, os antropólogos nunca mais serão observados pelos índios.

Em que consiste, afinal, esse método que dispensa o trabalho de campo? É simples. Para conhecer os índios, basta tão somente pagar entrevistadores terceirizados. Foi o que fez a Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA) que, por acaso, é presidida por Kátia Abreu. A CNA encomendou pesquisa ao Datafolha que, por acaso, pertence à empresa dona do jornal onde, por acaso, escreve Kátia. Está tudo em casa. Por acaso.

Terra à vista
Os pesquisadores contratados, sempre viajando em duplas - um homem e uma mulher - realizaram 1.222 entrevistas em 32 aldeias com cem habitantes ou mais, em todas as regiões do país. Os resultados mostram que 63% dos índios têm televisão, 37% tem aparelho de DVD, 51% geladeira, 66% fogão a gás e 36% telefone celular. "A margem de erro" - rejubila-se o Datafolha - "é de três pontos percentuais para mais ou para menos".

"Eu não disse! Bem que eu dizia" - repetiu Kátia Abreu no seu último artigo, no qual gritou "terra à vista", com o tom de quem acaba de descobrir o Brasil. O acesso dos índios aos eletrodomésticos foi exibido por ela como a prova de que os "silvícolas" já estão integrados ao modo de vida urbano, ao contrário do que pretende a Funai, com sua "antropologia imóvel" que "busca eternizar os povos indígenas como primitivos e personagens simbólicos da vida simples". A antropóloga da Folha, filiada à corrente da "antropologia móvel", seja lá o que isso signifique, concluiu:

- "Nossos tupis-guaranis, por exemplo, são estudados há tanto tempo quanto os astecas e os incas, mas a ilusão de que eles, em seus sonhos e seus desejos, estão parados, não resiste a meia hora de conversa com qualquer um dos seus descendentes atuais".

Antropólogos da velha guarda que persistem em fazer trabalho de campo alegam que Kátia Abreu, além de nunca ter conversado sequer um minuto com um índio, arrombou portas que já estavam abertas. Qualquer aluno de antropologia sabe que as culturas indígenas não estão congeladas, pois vivem em diálogo com as culturas do entorno. Para a velha guarda, Kátia Abreu cometeu o erro dos geocêntricos, pensando que os outros estão imóveis e ela em movimento, quando quem está parada no tempo é ela, incapaz de perceber que não é o sol que dá voltas diárias em torno da terra.

No seu artigo, a antropóloga da Folha lamenta que os índios "continuem morrendo de diarreia". Segundo ela, isso acontece, não porque os rios estejam poluídos pelo agronegócio, mas "porque seus tutores não lhes ensinaram que a água de beber deve ser fervida". Esses tutores representados pela FUNAI - escreve ela - são responsáveis por manter os índios "numa situação de extrema pobreza, como brasileiros pobres". Numa afirmação cuja margem de erro é de 3% para mais ou para menos, ela conclui que os índios não precisam de tutela.

- Quem precisa de tutela intelectual é Kátia Abreu - retrucam os antropólogos invejosos da velha guarda, que desconhecem a abreugrafia. Eles contestam a pobreza dos índios, citando Marshall Sahlins através de postagem feita no facebook por Eduardo Viveiros de Castro:
"Os povos mais 'primitivos' do mundo tem poucas posses, mas eles não são pobres. Pobreza não é uma questão de se ter uma pequena quantidade de bens, nem é simplesmente uma relação entre meios e fins. A pobreza é, acima de tudo, uma relação entre pessoas. Ela é um estatuto social. Enquanto tal, a pobreza é uma invenção da civilização. Ela emergiu com a civilização..."

Miss Desmatamento
A conclusão mais importante que a antropóloga da Folha retira das pesquisas realizadas com a abreugrafia é de que os "aborígenes", já modernizados, não precisam de terras que, aliás, segundo a pesquisa, é uma preocupação secundária dos índios, evidentemente com uma margem de erro de três pontos para mais ou para menos.

- "Reduzir o índio à terra é o mesmo que continuar a querer e imaginá-lo nu" - escreve a antropóloga da Folha, que não quer ver o índio nu em seu território. "Falar em terra é tirar o foco da realidade e justificar a inoperância do poder público. O índio hoje reclama da falta de assistência médica, de remédio, de escola, de meios e instrumentos para tirar o sustento de suas terras. Mais chão não dá a ele a dignidade que lhe é subtraída pela falta de estrutura sanitária, de capacitação técnica e até mesmo de investimentos para o cultivo".

A autora sustenta que não é de terra, mas de fossas sépticas e de privadas que o índio precisa. Demarcar terras indígenas, para ela, significa aumentar os conflitos na área, porque "ocorre aí uma expropriação criminosa de terras produtivas, e o fazendeiro, desesperado, tem que abandonar a propriedade com uma mão na frente e outra atrás".

Ficamos, então, assim combinados: os índios não precisam de terra, quem precisa são os fazendeiros, os pecuaristas e o agronegócio. Dados apresentados pela jornalista Verenilde Pereira mostram que na área Guarani Kaiowá existem 20 milhões de cabeças de gado que dispõem de 3 a 5 hectares por cabeça, enquanto cada índio não chega a ocupar um hectare.

Um discípulo menor de Kátia Abreu, Luiz Felipe Pondé, também articulista da Folha, tem feito enorme esforço para acompanhar a produção intelectual de sua mestra, usando as técnicas da abreugrafia, sem sucesso, como mostra artigo por ele publicado com o título Guarani Kaiowá de boutique (9/11), onde tenta debochar da solidariedade recente aos Kaiowá que explodiu nas redes sociais.

Kátia Regina de Abreu, 50 anos, empresária, pecuarista e senadora pelo Tocantins (ex-DEM,atual PSD), não é apenas antropóloga da Folha. É também psicóloga formada pela PUC de Goiás, reunindo dois perfis que deslumbrariam Nelson Rodrigues.

Bartolomé De las Casas, reconhecido defensor dos índios no século XVI, contesta o discurso do cronista do rei, Gonzalo Fernandez de Oviedo, questionando sua objetividade pelo lugar que ele ocupa no sistema econômico colonial:  

- “Se na capa do livro de Oviedo estivesse escrito que seu autor era conquistador, explorador e matador de índios e ainda inimigo cruel deles, pouco crédito e autoridade sua história teria entre os cristãos inteligentes e sensíveis”.

O que é que nós podemos escrever na capa do livro "Os Argonautas do Gurupi" de Kátia Abreu, eleita pelo movimento ambientalista como Miss Desmatamento? Que crédito e autoridade tem ela para emitir juízos sobre os índios? O que diriam os cristãos inteligentes e sensíveis contemporâneos? Respostas em cartas à redação, com a margem de erro de 3% para mais ou para menos.

Fonte: Portal Pátria Latina, 25 de novembro de2012