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quarta-feira, 15 de junho de 2016

A morte de Konibu e o crime de genocídio de Romero Jucá

Enquanto era presidente da Funai, Jucá entregou as terras dos índios Akuntsu a seus algozes, diz sertanista


Parte do sofrimento de Konibu deve-se a um ato de Jucá na presidência da Funai: a destinação da terra onde os indígenas viviam para fazendeiros

Por Felipe Milanez*

Na última quinta-feira, 26 de maio, faleceu em Rondônia o indígena Konibu, o velho líder e xamã do povo Akuntsu. Sobrevivente de um genocídio, ele já estava bastante debilitado por um câncer e problemas cardíacos, e tinha em torno de 85 anos., Morreu em paz, deitado na rede dentro da maloca onde viva, auxiliado por agentes de saúde e pelo sertanista da Funai, Altair Algayer.
Se a morte foi tranquila, no entanto, Konibu sofreu muito em vida. E parte desse sofrimento se deve a um  ato político de Romero Jucá enquanto era presidente da Funai: a destinação da terra onde os indígenas vivam para fazendeiros.
Os Akuntsu, seus vizinhos Kanoê e o “Índio do Buraco” são remanescentes de três povos que sofreram um genocídio de 1985 até os últimos ataques documentados em 1995.
O ex-ministro do Planejamento teve participação direta nesse processo enquanto era presidente da Funai (1986-1988): foi ele quem desinterditou a área e a destinou a fazendeiros que cometeram os crimes.


Resolução de Romero Jucá em 1986, publicada no Diário Oficial
Por isso, a morte de Konibu e a tragédia de seu povo trouxeram à tona uma grave questão atual, com Jucá e as articulações políticas contra os direitos indígenas: o governo interino ameaça rever a demarcação das terras indígenas feitas no governo Dilma, exatamente o que Jucá fez em 1986 com os Akuntsu e que levou ao genocídio.
Em  manifestação recente, a ONU denunciou que estes retrocessos podem implicar em “riscos de etnocídios”. A análise do caso dos Akuntsu revela exatamente o que aconteceu nos anos 1980, e pode novamente se repetir. Retirar o status de proteção de uma área ocupada por indígenas e destiná-la a ruralistas pode levar a um genocídio, como o caso dos Akuntsu, o qual Konibu e seu povo foram vítimas.
O caso a participação de Jucá no processo de genocídio dos Akuntsu não foi reportado no relatório da Comissão Nacional da Verdade, mas consta no livro Memórias Sertanistas: Cem Anos de Indigenismo no Brasil (Sesc, 2015). A questão da participação de Romero Jucá no genocídio, ao desinterditar a área, também foi omitida da  notícia veiculada pela assessoria da Funai na semana passada, ao divulgar a morte de Konibu.
O genocídio Akuntsu
Em 1985, o sertanista da Funai Marcelo dos Santos trabalhava no sul de Rondônia com os Nambiquara, e foi a campo verificar a presença indígena em uma área demandada pela Fazenda Guaratira, que negociava créditos do Banco da Amazônia e pediam à Funai uma “certidão negativa da presença indígena”.
Ao visitar a fazenda, Santos foi informado por trabalhadores de que teria ocorrido um massacre em uma fazenda vizinha: “Olha, não pode falar, não, porque este lugar aqui é muito perigoso. Mas eu vou avisar para você. Aqui, nessa fazenda, vocês não vão encontrar índio, não. Mas se vocês forem lá na Fazenda Yvypytã, ‘aconteceu’ alguma coisa. Teve uma confusão lá, porque acuaram os índios e eles correram” (Memórias Sertanisas, página 332).
A Yvypytã era de propriedade de Antonio José Rossi Junqueira Vilela, acusado de comandar um massacre de garimpeiros dentro dessa mesma fazenda, em 1983 (Inquérito Policial 114/83, na delegacia de Vilhena)
Ao ser informado da denúncia, Santos foi junto de um grupo de índios Nambikwara e do documentarista Vincent Carelli procurar vestígios e encontrou uma pequena aldeia com quatro casas destruídas e cápsulas de revolver. Essas cenas aparecem no filme Corumbiara, de Vincent Carelli, que está disponível na internet.
Com as evidências da presença indígena, Santos negou a certidão e pediu a interdição da área. A Funai enviou o sertanista Sydney Possuelo para comprovar as alegações, e o então Presidente da Funai Apoena Meireles assinou a Portaria nº 2.030/E/1986, publicada em 11 de abril de 1986, interditando 63.900 hectares, com base no levantamento de Santos, com o nome de “Área Indígena Omere”.
“Eu desenhei o mapa da interdição com os poucos conhecimentos que eu tinha na época que eu estava lá dentro da área. Mas não tinha andado no mato para saber porque os pistoleiros não permitiam e nos ameaçavam”, relata Marcelo dos Santos em entrevista.
A interdição envolvia três fazendas na época, e os sertanistas podiam entrar na área para investigar os crimes, o que intimidava os fazendeiros a desmatarem e, possivelmente, praticarem novos ataques.
Ficavam também suspensos os financiamentos e por isso a Yvypytã entrou com uma ação judicial e conseguiu uma liminar para desinterditar a área. Em recurso da Funai ao Tribunal Regional Federal, o ministro Lauro Leitão cassou a liminar para manter a área sob interdição, ante “manifesta a possibilidade de grave lesão”, a “iminente possibilidade do aniquilamento físico da população tribal remanescente”, em decisão datada de 21 de maio de 1986.
Com isso, permanecia válida a portaria da Funai, protegida também por uma decisão judicial de segunda instância. Acontece que nesse mesmo mês de maio de 1986 Romero Jucá assumiu a presidência da Funai.
Não foram poucos os crimes cometidos por Jucá enquanto esteve na presidência da Funai, como escreveram recentemente Pádua Fernandes , em artigo no seu blog, e  João Fellet, na BBC, e a participação no genocídio dos Akuntsu vem a se somar a uma série de violência contra os povos indígenas.
Em 12 dezembro de 1986, Romero Jucá revogou a portaria assinada por Apoena Meireles e assinou uma “nova” portaria com o número 1.813 para “desinterditar” a área e revogar a portaria 2030/E, assinada pelo seu antecessor, Apoena Meireles. Ou seja: fez um novo ato administrativo, já que judicialmente a terra estava garantida aos índios, para transferir a posse aos fazendeiros. Há um temor dos povos indígenas que uma estratégia parecida seja utilizada pelo governo interino de Temer.
A decorrência desse ato de Jucá resultou em novas invasões no território indígena, o desmatamento da área, novos ataques aos Akuntsu, aos Kanoe e, sobretudo, também ao “índio do Buraco”, um outro povo indígena que tem agora apenas um único sobrevivente. Sertanistas da Funai, e Marcelo dos Santos especificamente, passaram a ser proibidos de entrar na área. A participação de Jucá nesse processo de genocídio não foi incluída no relatório da Comissão Nacional da Verdade, que apresenta os envolvimentos de Jucá na invasão de garimpeiros na TI Yanomami.
O contato e o convívio com os sobreviventes
Apenas nos anos 1990, quando Sydney Possuelo assume a presidência da Funai em 1991, que Santos consegue autorização para voltar a investigar o genocídio do rio Omere, em Corumbiara. Nesse período, Altair Algayer, que migrou com sua família do sul para Rondônia, se junta à equipe da Funai.
Em 1995, um mês depois do massacre de camponeses em Corumbiara, Santos, Algayer e Carelli encontram dois irmãos Kanoe, Purá e Tiramantu, em uma pequena clareira que viram numa imagem de satélite e, em campo, descobriram ser a aldeia dos Kanoe. As imagens de Vincent Carelli foram parar no Fantástico e serviram para a Funai publicar uma nova interdição da área e reiniciar o processo de demarcação.



Um mês depois do contato com os Kanoe, os sertanistas foram guiados por eles até os Akuntsu. E, no ano seguinte, encontraram vestígios de um novo ataque ao povo do “índio do Buraco”, descobrindo em meio a um desmatamento feito durante o período de chuvas, o que não é comum, casas queimadas, capsulas de revolver, e diversos vestígios materiais de uma pequena aldeia. Isto prova que o ataque aos indígenas, ao menos desde o massacre relatado por trabalhadores da fazenda em 1985, foi constante até 1996.
Durante esse processo de contato com os indígenas, a Funai contou com apoio de uma rede de colaboradores e movimento social, como o cinegrafista Vincent Carelli e sua esposa, a antropóloga Virgínia Valadão, indigenistas da Opan, como Inês Hargreaves, e da Kanindé, como Pedro Rodrigues, Rogério Vargas, Ivaneide Cardoso, e indigenistas do CIMI. A Terra Indígena Rio Omerê foi homologada em 2006.
Morte de Konibu
Os Akuntsu eram sete indígenas em 1995. Konibu, o mais velho, com uma esposa e três filhas, e uma senhora mais velha, chamada Ururu e um filho adotivo, Pupak. Uma das filhas morreu em 2000 quando uma árvore caiu sobre a casa da família. Em 2009, faleceu Ururu.
Após uma epidemia de doenças respiratórias, idas e vindas em hospitais, e uma profunda depressão sobre os índios, Ururu deitou-se na rede e se deixou morrer, sem se alimentar por uma semana. Escrevi sobre esta triste morte na revista RollingStone, e pode ser lido aqui. Algayer acompanhou todos os momentos, e ajudou os indígenas a preparar o funeral.
Novamente, com Konibu, Algayer também assistiu de perto os últimos momentos. Ele diz que as duas filhas e a viúva estão “desamparadas, desorientadas”, assim como Pupak, filho adotivo de Ururu, que continua bastante impactado. “Desde a morte da Ururu, ele ficou muito abatido, sozinho. Acompanhava o Konibu no dia a dia, ajudando na caça. Mas está bastante isolado e solitário”.
O mais sofrido, conta ele, é a parte espiritual. “O konibu era o último xamã, e elas não sabem fazer os trabalhos rituais. Isso cria uma angústia muito profunda, muita tristeza. Elas temem que o espírito dele não esteja bem. Elas não têm mais segurança espiritual, e nem física. É muito triste.”
No dia do funeral, o três remanescentes Kanoe, o indígena Purá, sua irmã Txinamanty, mãe de Bakwa, já estava na base. Txinamanty é xamã, assim como era Konibu, mas são de povos diferentes e possuem e cosmovisões distintas.
“No outro dia da morte, a gente percebeu que ela passou a noite inteira cheirando rapé. Ela fez um ritual sozinha na aldeia dela. E uns dias antes da morte ela vinha e fazia rituais de cura para ajudar o Konibu, que estava em uma situação difícil, na rede.”
Konibu estava na rede praticamente sem conseguir se mexer e convalescendo desde janeiro. Nos últimos dias, ele precisava de ajuda para se levantar e para sentar. “Não tinha mais força”, relata Algayer.
A tragédia de um fim do genocídio é um drama existencial profundo e perturbador, que Algayer enfrenta com um humanismo extraordinário.
Conforme depoimento de Marcelo dos Santos, às paginas 314 do livro Memórias Sertanistas: “Saiu o Apoena e entrou o Romero Jucá. A primeira providência do Romero Jucá: me proibir de entrar na área. Fui proibido de sair dos Nambikwara e entrar na área do igarapé Omerê. E, junto com a minha proibição, ele desinterditou a área.”
E relata: “Foi a primeira manifestação da Justiça sobre o caso. Assim mesmo, o senhor Romero Jucá entregou as terras dos índios isolados aos algozes.”
Em um artigo que assino junto do antropólogo Glenn Shepard, na revista Tipiti, discute essa trágica situação de povos remanescentes de genocídios recentes, as contradições da Funai com relação as demarcações, e a dedicação e o humanismos dos sertanistas, como de Altair Algayer. O texto pode ser acessado aqui.
*Fonte: Carta Capital- Blog do Felipe Milanez

sábado, 7 de maio de 2016

A gigante Vale contra o professor no Pará

Mineradora processa professor universitário, que recebe apoio da comunidade acadêmica internacional

Por Felipe Milanez*

Um trilho, um trem, muito minério nas costas e muita gente na frente. Esse é o caminho diário das milhares de toneladas de minério de ferro que a Vale carrega para exportação do interior da Amazônia, no Pará, para o Terminal Marítimo da Ponta da Madeira, em São Luís, no Maranhão. No percurso o trem cruza índio, quilombola, camponês, floresta...

E enfrenta quase diariamente manifestações das comunidades atingidas. No fim do ano passado, o trem cruzou com um protesto, como tantos que ocorrem. E dessa vez, a Vale mirou em um professor para processar e tirar do caminho.

O professor da Faculdade de Educação do Campo da Universidade Federal do Sul e Sudeste do Pará (UNIFESSPA), Evandro Medeiros, participou de um ato de protesto em novembro que ocorreu nos trilhos da Vale, junto de professores, técnicos e estudantes da universidade.

O ato era em solidariedade à população vitima do rompimento da barragem da mineradora Samarco, em Mariana (MG), que provocou o maior desastre ambiental da história do Brasil, e não teria chegado a interromper nenhuma composição de trem, sendo considerado apenas simbólico.

A Samarco é de propriedade da Vale e da BHP Billiton, e as duas gigantes se tornaram alvos imediatos de protesto e cobranças públicas de suas responsabilidades no país todo. Como escrevi ano passado aqui na CartaCapital, há motivos de sobra para quem vive no Pará ter medo de que algo parecido venha a ocorrer.

Através de uma investigação privada (portanto, não realizada pela polícia), baseada em fotografias do ato e em comentários nas redes sociais, a Vale chegou à conclusão, que apresenta como de “autoria e materialidade”, de que Medeiros era “o líder” do ato que teria “interditado” a ferrovia, e como tal, nessa visão, caberia a ele responder criminalmente.

Acusa o professor de praticar algo como “justiça pelas próprias mãos”, e de infringir norma legal ao interromper a circulação dos trens. Para a gigante mineradora, o professor teria sido “responsável pela convocação da população em ato preparatório no Campus 1 da UNIFESSPA, reunião que se comprova com o cartaz anexo divulgado pelo líder da manifestação nas redes sociais.

Para além disso, "exerceu liderança durante a interdição ao coordenar o ato, conforme prova documental”. A companhia propôs então uma “queixa crime” contra o professor.

A primeira audiência desse processo criminal ocorreu na última quinta-feira, 5 de maio, e provocou novos protestos da população contra a Vale, em Marabá, que fecharam, dessa vez, a Rodovia Transamazônica.

A Vale compareceu com seus advogados e Medeiros compareceu assistido por advogados da Comissão Pastoral da Terra (CPT). O Ministério Público propôs um acordo em que o professor pagaria à mineradora um salario mínimo. A advogada da Vale propôs ao professor prestar serviços comunitários por 15 dias.

Medeiros recusou tanto a oferta do MP quanto da Vale, alegando inocência. E justificou: “Tenho uma vida dedicada a ‘serviços comunitários’, como professor e como cidadão, reconhecido por muitos, por isso ocupo um cargo na pró-reitoria de extensão da UNIFESSPA. Não preciso ser forçado pela Justiça a realizar ações em beneficio de comunidades carentes e setores populares. A mineradora Vale sim, e mesmo assim não atende plenamente as reivindicações dessas comunidades.”

Na última semana passou a circular na internet um grande manifesto de apoio ao professor, com a assinatura de pessoas de peso da academia internacional, como o português Boaventura de Sousa Santos, da Universidade de Coimbra, o peruano Aníbal Quijano, da Universidad de San Marcos, a pedagoga Celi Taffarel, da UFBA, a filósofa Déborah Danowski, da PUC Rio, Carlos Vainer e Henri Ascerald, do IPPUR/UFRJ, e intelectuais ativistas como Jean Pierre Leroy, da FASE, Paulo Fonteles Filho, da Comissão Estadual da Verdade do Pará, a psicanalista Maria Rita Kehl, diversos professores e professoras da UNIFESSPA e da UEPA, da Federal do Maranhão, do Oeste do Pará, UFRJ, e do Brasil todo. Inclusive eu, autor dessa coluna e professor da UFRB, subscrevo o manifesto em solidariedade ao colega professor. O manifesto, que está na plataforma Avaaz, já tem mais de 600 assinaturas.

Procurei a Vale para saber o que acontece e a razão pela qual ela, uma gigante mundial, processa o professor do interior da Amazônia. A informação é de que nesses casos de protestos coletivos, sempre que ocorrem, a Vale procura as lideranças para serem responsabilizadas. A Vale diz que o ato no trilho impediu o transporte de cargas e de passageiros, o que coloca em risco seus compromissos profissionais.

E diz ainda que “está obrigada a requerer judicialmente a desocupação da linha e o restabelecimento das condições de segurança ferroviária em caso de bloqueio do tráfego de trens por terceiros”.

O professor contesta as acusações. Diz que não havia um líder, que o evento foi organizado coletivamente por pessoas que fazem parte da universidade e dos movimentos sociais.

E contesta a investigação privada da companhia que tenta individualizar nele a conduta coletiva e criminalizar o protesto político: “Por que eu? Por que eu sou negro? Por que eu sou maior?”, questiona. E afirma, ao contestar a proposta de um acordo e defender a liberdade de protesto:

“Por isso, por dignidade, respeito aos moradores dessas comunidades impactadas, em solidariedade as vítimas de Mariana e às outras pessoas também processadas e investigadas criminalmente a mando da Vale, contando com o apoio de centenas de colegas professores de universidade e comunidade acadêmica de todo País, eu não aceitei a proposta de conciliação para encerrar o processo. Prefiro responder criminalmente e enfrentar a Vale de cabeça erguida, para mostra para a população de Marabá que a ganância de uma empresa não é maior que a dignidade de um cidadão, muito menos de um povo inteiro.”

Medeiros é um professor conhecido pelo comprometimento com a pedagogia do campo, com a pedagogia transformadora da realidade e com as lutas sociais. Entre os muitos alunos e alunas que o admiram, estava a ambientalista popular Maria do Espírito Santo, que foi assassinada ao lado de seu companheiro José Cláudio Ribeiro da Silva em 24 de maio de 2011. Estudante de especialização em pedagogia do campo, ela dedicou a Medeiros um agradecimento especial ao concluir o seu trabalho de final de curso: “Ao coordenador do curso, Evandro Medeiros, que durante estes anos de formação sempre procurou educadores/as que estivessem imbuídos neste processo de mudanças dos sujeitos do campo.”

Medeiros também é produtor e diretor de filmes que documentam a história da região, como “Dezinho: vida sonho e luta” (2006), sobre o assassinato do líder sindical José Dutra da Costa, no Pará, “Araguaia Campo Sagrado” (2010), e “Escola Quilombo” (2014).

Ele trabalha o cinema como uma ferramenta de educação e de construção da memória e é organizador do festival internacional de cinema, o CINEFRONT, do qual sou curador. Os filmes são mostrados em escolas da região, em aldeias indígenas, em salas de cinema, no acampamento da juventude do MST na Curva do S, e nos diversos campi da UNIFESSPA.

Por isso, ao mirar em Medeiros e colocá-lo no papel de inimigo a ser processado criminalmente na queixa-crime, a Vale tem provocado uma forte reação contrária da população local, como a que foi demonstrada nos protestos durante a audiência nessa semana, nas redes sociais, na enxurrada de apoio e solidariedade ao professor. Diante disso, não parece que essa ação vai diminuir as insatisfações com a Vale e com o crescimento da mineração no Pará.

A Vale chegou no Pará durante a ditadura e foi o carro-chefe, ou melhor, a “locomotiva” do Projeto Grande Carajás (de 1980), que transformou profundamente a região que veio a se tornar a mais desmatada e violenta em toda a Amazônia.

Nos últimos anos, o aumento massivo da extração e exportação de minério de ferro, em estratégia que serve também para enfrentar o baixo preço das commodities, tem aumentando, também, os conflitos.




A Vale atualmente está expandido as atividades com a nova mina S11D, e duplicando a ferrovia. Se no Plano de Mineração Nacional 2030, de 2011, o governo federal tratava a Amazônia como “a fronteira de expansão da mineração no Brasil” e planejava aumentar a exportação de ferro de 231 milhões de toneladas, previstos para 2015, para 797 milhões de toneladas, em 2030, as principais preocupações estão relacionadas justamente aos “conflitos sobre o uso e a ocupação do território”. Essas preocupações são chamadas pela Vale nos seus relatórios anuais de "risco" da população local.

Risco é uma questão de percepção e perspectiva. O risco que a companhia enxerga é, certamente, diferente do risco e da vulnerabilidade a que está exposta e que é percebida pela população local. Vide Mariana, as 19 pessoas mortas e outras milhares com a vida afetada, o rio morto e o apocalipse ecológico, cuja tragédia, o maior crime ambiental da história do país, completou seis meses.

Abaixo, na íntegra, o manifesto de apoio ao professor e a nota da Vale em resposta à CartaCapital.

Manifesto em apoio ao Professor Evandro MedeirosEm novembro de 2015, estudantes, técnicos e professores da Universidade Federal do Sul e Sudeste do Pará (UNIFESSPA) organizaram um ato em solidariedade aos moradores de Mariana (MG), que, no mesmo mês, sofreram com o rompimento da barragem de rejeitos do Fundão da Samarco/Vale, que causou um dos maiores desastres socioambientais ocorridos no mundo.

O ato, por um lado, questionava as perdas humanas que o desastre provocou, além da destruição de residências, das áreas de produção de alimentos, da floresta, do assoreamento da calha do rio Doce, que aumentou os riscos de enchentes e da presença de metais pesados no rio, provocando riscos de proliferação de doenças crônicas.

Por outro lado, a mobilização também questionava a irresponsabilidade da empresa Samarco, que tem sua composição acionária dividida entre Vale (50%) e a BHP Billiton Brasil Ltda (50%), no tratamento do desastre, uma vez que a mesma não possuía os sistemas de alertas sonoros exigidos por lei, que precisariam ser acionados em caso de desastre, nem uma equipe treinada para assessorar a comunidade após o rompimento da barragem.

O ato promoveu intervenções artísticas, debates e colocou em prática um dos princípios fundamentais da Universidade no Brasil, que é a extensão universitária, princípio este definido pelo Fórum de Pró-Reitorias de Extensão das Universidades Públicas brasileiras como um processo interdisciplinar, educativo, cultural, científico e político que promove a interação transformadora entre Universidade e outros setores da sociedade.

Entretanto, a mineradora Vale, na tentativa de criminalizar o ato, abriu uma Queixa Crime contra o professor Evandro Medeiros da Universidade Federal do Sul e Sudeste do Pará (UNIFESSPA) em processo número 0099446-03.201.5 da 1ª Vara de Juizado Especial Penal de Marabá, enquadrando-o no artigo 345 do Código Penal de exercício arbitrário de suas próprias razões.

É necessário afirmar que ato foi uma reunião coletiva para reflexão não havendo, portanto, nenhum tipo de ação violenta que justificasse qualquer denúncia de crime. Por isso, esta queixa crime movida pela mineradora Vale não ataca apenas o professor Evandro Medeiros, mas a autonomia universitária de realização do princípio da Extensão Universitária, bem como também ataca o direito de manifestação e de reunião que é um direito constitucionalmente garantido.

Da mesma forma, outros cidadãos como Tiago Cruz, Iara Reis, João Reis, Waldy Gonçalves Neves e alguns moradores do Bairro Alzira Mutran em Marabá, também são alvos de inquéritos da Polícia Civil, a pedido da Vale, por se organizarem para lutar por seus direitos.

Repudiamos, portanto, as tentativas de intimidação à liberdade de expressão, de reunião e de reflexão, pela via do poder judiciário, empreendidas pela empresa Vale a quem se manifesta contra seus interesses, bem como manifestamos total solidariedade ao professor Evandro Medeiros.

A ganância de uma empresa não pode tornar a pesquisa, reflexão e luta pelos direitos humanos um crime.

Nota da Vale, enviada pela assessoria de imprensa na quinta-feira 5:

O professor Evandro Medeiros é réu em ação movida pela Vale por ter obstruído a Estrada de Ferro Carajás, no dia 20 de novembro, no município de Marabá, em uma manifestação contra o desastre com a barragem da Samarco, em Mariana (MG).

O protesto impediu o transporte de cargas e passageiros. Por dia, cerca de 1.300 pessoas utilizam o trem de passageiros da Vale para se locomover entre os estados do Maranhão e Pará. Para muitos dos 27 municípios a ferrovia é o único meio de transporte da população.

Em casos de obstrução da linha férrea, a empresa precisa adotar os procedimentos judicias para preservar o direito de propriedade e a manutenção do transporte de cargas e passageiros, conforme determinado no contrato de concessão celebrado com a União.

Logo, em cumprimento à legislação vigente, a Vale está obrigada a requerer judicialmente a desocupação da linha e o restabelecimento das condições de segurança ferroviária em caso de bloqueio do tráfego de trens por terceiros.

A pessoa que invade ou obstrui a ferrovia será acionada judicialmente e responderá a inquérito policial e ação penal, podendo gerar uma aplicação de multa diária e prisão, de acordo com a decisão judicial.

É importante ressaltar que a ocupação da ferrovia compromete a segurança das operações e, principalmente, da população, dos empregados e dos usuários do trem de passageiros, tendo em vista que as locomotivas transportam grande quantidade de combustível.

Além disso, um trem, quando carregado, precisa de pelo menos dois quilômetros para parar completamente após o acionamento dos freios de emergência e de 500 metros quando não está carregado. Em caso de manifestações onde há queima de pneus ou madeira, por exemplo, o risco de explosão pode se tornar maior.

A Vale respeita e acredita na livre manifestação e destaca que não ingressa na Justiça com o intuito de proibir protestos ou manifestações de qualquer natureza em relação às suas atividades.

Como forma de buscar soluções conjuntas para a gestão de impactos socioculturais, econômicos e ambientais, e, com vistas ao desenvolvimento sustentável, a empresa mantém equipes dedicadas ao contínuo relacionamento com as comunidades vizinhas às suas operações.

*Publicado originalmente no blog do Felipe Milanez no sítio da Carta Capital

sexta-feira, 22 de abril de 2016

A explosão da violência na luta pela terra e território

Relatório da Comissão Pastoral da Terra aponta aumento de 39% do número de assassinatos

Por Felipe Milanez*

A violência explodiu no campo e nas florestas. Ano passado foram 50 assassinatos. E a impunidade reina, 20 anos depois do Massacre de Eldorado dos Carajás. Poderia ser pior, sempre pode: 59 pessoas sofreram tentativas de assassinatos e por pouco não morreram para aumentar as "estatísticas", como outras 144 receberam ameaças de morte, e vivem sabendo que podem ser mortas em breve. Uma barbárie que, em termos quantitativos, não ocorria desde 2004. O pior ocorre na Amazônia, sobretudo Pará e Rondônia: nesses estados 40 pessoas foram mortas.

Estes dados do teatro da crueldade que se transformou o Brasil estão compilados no Caderno Conflitos no Campo da Comissão Pastoral da Terra, lançado nesta sexta-feira 15 de abril simultaneamente em Brasília e Marabá. Em Marabá, ocorre a Conferência Internacional da Reforma Agrária, organizada pela Via Campesina, em memória aos 20 anos do massacre de 19 sem-terra em Eldorado dos Carajás, enquanto em Brasília acontece o Acampamento pela Democracia.

Os dados sobre o ano passado não dão conta de acompanhar a barbárie em curso: nesse primeiro trimestre de 2016 já foram 13 mortes. Dois sem-terra foram mortos pela Polícia Militar do Paraná na semana passada, em uma aparente emboscada criminosa que ainda feriu outras seis pessoas.

"Os números às vezes confundem a cabeça da gente, por isso o caderno é acompanhado de textos analíticos ", afirma o advogado da CPT em Marabá, José Batista Afonso. Os conflitos, segundo ele, estão presentes em todo o País e decorrem de causas estruturais relacionadas à expansão do capital no campo e o aumento da concentração da terra. "A aceleração do processo de concentração da terra significa mais gente com pouca ou sem terra e menos gente com muita, mas muita terra mesmo".

Em um dos textos analíticos, escrito pelo professor de geografia da USP Ariovaldo Umbelino de Oliveira, ele aponta que 97,9 milhões de hectares foram concentrados durante os governos Lula e Dilma.
Oliveira sustenta que o elevado índice de violência nos conflitos no campo são decorrência direta da não realização da reforma agrária, e as mortes absurdas, no total de 50, ou seja, quase uma por semana, nada mais são do que "a continuidade da barbárie assolando as terras do País". O Bico do Papagaio, a tríplice fronteira do Pará, Maranhão e Tocantins, é, hoje, segundo a análise de Oliveira,  a região mais conflituosa do Brasil.
Nesse sentido, Batista, da CPT de Marabá, descreve em um outro levantamento a violência no Pará como decorrente do "aumento da impunidade": aqueles que são responsáveis não são punidos.

"Não são apenas crimes só contra a pessoa mas também praticado contra o meio ambiente onde a impunidade predomina, como exemplo o desastre de Mariana, ou o desmatamento na Amazônia. Mas contra a pessoa é mais grave ainda no Estado do Pará, onde o número de violência praticado contra os camponeses é maior do que qualquer outro Estado da Federação. Desde que a CPT tem feito os registros, 1/3 ocorreu no Pará. A cada três assassinados, um ocorreu aqui no Pará."

Em um levantamento específico, a CPT indica que ocorreram 846 assassinatos desde 1980 até 2014, e em apenas 293 houve algum tipo de investigação: "em 65% das mortes no Pará, sequer houve investigação das responsabilidades, nem sequer um inquérito policial", explica Batista. Somados os 19 assassinatos no ano passado, nos últimos 35 anos 861 camponeses e camponesas foram mortos e mortas no Pará.

Essa impunidade é a prova, segundo o advogado, de que a atuação do Poder Judiciário tem sido insuficiente para combater o problema da impunidade. "O pistoleiro que pegou uma morte de encomenda e recebeu dinheiro para assassinar o camponês e não é punido, e ele vai estar no outro dia à procura de uma nova encomenda: é o assalariado da morte. Da mesma forma o mandante vai estar resolvendo o problema do conflito na base sempre da bala, porque tem a certeza de que a lei não o vai atingir."

O avanço violento do capital ocorre junto do que Paulo Cesar dos Santos, da executiva nacional da CPT, chama de "violência institucional" e "violência legislativa": "há ao menos 26 projetos de lei ou emenda constitucional que querem diminuir ou acabar com os direitos conquistados no campo".

Como exemplo, ele cita o projeto que pretende alterar o conceito de "trabalho escravo" para inviabilizar a atuação dos grupos móveis. "Os projetos estão em voga no Congresso mais conservador da história", ou seja, o mesmo que no domingo 17 promete dar um golpe derrubando o governo eleito pelo voto.

"O território amazônico, as comunidades tradicionais e os posseiros que migraram para cá estão sofrendo uma violência enorme", explica Santos. São violências de diversos tipos, que operam da forma mais cruel possível. Como exemplo, a chacina em Conceição do Araguaia, em 17 de fevereiro do ano passado, que matou uma família inteira: Washington Miranda Muniz e sua esposa, Leidiane, assassinados junto de três filhos e um sobrinho.
Também no Pará, duas vítimas foram assassinadas enquanto lutavam contra a hidroelétrica de Belo Monte. Esse foi o ano em que mais se registrou conflitos pela água, com 135 ocorrências, sendo a maioria relacionados com a expansão da mineração, que representa 56% desse tipo de conflito.

Por outro lado, os dados levantados pela CPT indica que se intensificou as manifestações da classe trabalhadora, com um aumento de 40% do número de participantes, "o que significa que mais e mais pessoas estão indo para as ruas", afirma Santos. E, nesse sentido, aumentou a criminalização dos trabalhadores e trabalhadoras rurais, daqueles que vão continuar a lutar contra o sistema capitalista que está ai. Como exemplo, há duas semanas a prisão do cacique Tupinambá Babau, no sul da Bahia.

Quilombolas e indígenas estão em luta pelo território, camponeses em luta pela terra, e estão todos sendo exterminados, assassinados, despossessados. Os "condenados da terra", como escreveu Frantz Fanon, são as vítimas do trabalho escravo e da pistolagem, excluídos do acesso à terra, à água, ao espaço para viver e se reproduzir, que se concentra na mão de fazendeiros, banqueiros e das grandes mineradoras, protegidos por um Poder Judiciário injusto e por representantes políticos fieis à oligarquia que os financia.

Aquela cerca colocada em Brasília para dividir a sociedade brasileira parece ter um efeito simbólico além da linha da direita e da esquerda: a divisão daquela/es que podem viver, daquela/es que devem morrer; aquela/es que se beneficiam de um Estado injusto e desigual, daquela/es que são espoliados, criminalizados e eliminados como obstáculo ao insano ciclo de acumulação predatória e extremamente violenta. Como escreve Ariovaldo Umbelino de Oliveira:

"Esse é o quadro da violência e, portanto, da barbárie que reina no campo, enquanto isso os governos nada fazem. A reforma agrária não é feita. Os crimes não são apurados. As policias militares não prendem os assassinos [quando ela mesma não é a própria assassina]. A justiça não julga, e quando julga nem sempre condena os criminosos. Enfim, o direito não se respeita e a justiça não se faz."

terça-feira, 22 de setembro de 2015

Felipe Milanez: “Os índios estão mais fortes, mas forças anti-indígenas também”

Cientista político e colunista de CartaCapital afirma que a organização indígena se aperfeiçoou, mas esbarra no poder de setores ruralistas e conservadores
Marechal Rondon (esq.), além de militar, também foi o idealizador do Parque Nacional do Xingu e diretor do Serviço de Proteção ao Índio.
Ao longo das décadas, os indígenas brasileiros conseguiram se organizar politicamente de forma mais efetiva, mas em 2015 enfrentam a possibilidade de sofrerem um duro retrocesso em seus direitos no Congresso Nacional. Para o cientista político e colunista de CartaCapital Felipe Milanez, isso reflete o fato de grupos anti-indígenas também estarem “mais organizados e violentos, agindo dentro e fora das instituições”.

Organizador do livro Memórias sertanistas: Cem anos de indigenismo no Brasil (R$ 70,00, 424 págs., Ed. Sesc), cujo lançamento ocorreu nesta quinta-feira 17 de setembro , em São Paulo, Milanez defende que os índios busquem ocupar os espaços de debates nas zonas urbanas para reagir à pressão que sofrem aos ataques. “É nas cidades que se escolhem os congressistas, que as mobilizações ganham maior atenção da mídia e da opinião pública, e é nas cidades que se tenta justificar o saque aos territórios indígenas”, afirma.

A obra Memórias sertanistas reúne doze personagens que doaram suas vidas para garantir a sobrevivência de povos indígenas. Partindo das experiências destes importantes sertanistas, o livro reflete sobre a forma como a cultura ocidental lida com a natureza e sobre a luta pela sobrevivência dos índios que ainda não foram engolidos pela cultura do consumo e da degradação do meio ambiente. Leia a entrevista a seguir:

CartaCapital: Pela tradição oral dos povos indígenas do continente americano, pode-se dizer que seu livro tem uma importância histórica na preservação da memória de lutas destes povos?
Felipe Milanez: O livro tenta preservar as memórias de dez sertanistas, contadas por eles mesmos, e a de Chico Meireles e os irmãos Villas Bôas, relatadas por duas lideranças indígenas que conviveram com eles. Esses sertanistas lutaram em defesa dos povos indígenas, junto dos indígenas, ao lado deles, mas de dentro do Estado. Nesse sentido, são memórias da luta indígena a partir de agentes do Estado. Ou seja, de dentro do Estado, é possível sim lutar e defender os direitos dos povos indígenas, mesmo que seja contra o Estado e contra os interesses privados.

Os depoimentos expõe algumas contradições da relação entre o Estado brasileiro e os indígenas que vivem aqui. E isso foi feito, por um lado, com o intuito de ajudar os povos afetados por erros do Estado a recuperarem direitos territoriais. O sertanista Wellington Figueiredo diz: “É para os índios que escrevi meus diários”. Por outro lado, no atual momento de crise e de violentos ataques contra os povos indígenas e seus direitos, é importante imaginar formas de resistências inspiradas nas histórias de quem lutou a vida inteira ao lado dos índios. As pessoas que compartilham suas memórias nesse livro fizeram com a intenção de que isso possa ajudar os povos indígenas em suas lutas.

CC: As violências sofridas pelos índios durante a ditadura continuam?
FM: A ditadura intensificou processos de violência que já vinham ocorrendo, e produziu novas estruturas que se mantêm até hoje, bastante fortes, mesmo depois da Constituição de 1988. Isso é: antes da ditadura já se praticavam muitos crimes contra os povos indígenas, como foi sintetizado em dois grandes trabalhos: o livro Os Índios e a Civilização, de Darcy Ribeiro, e o Relatório Figueiredo, elaborado pelo procurador Jader Figueiredo. Durante a ditadura, pelo menos oito mil indígenas foram mortos, por ação ou por omissão do Estado, segundo o relatório da Comissão Nacional da Verdade. A ditadura abriu a infraestrutura da invasão dos territórios indígenas, como a estrada BR 230, a Transamazônica, que afetou diretamente pelo menos 18 povos indígenas, com alguns massacres e muitas mortes.

Até hoje nenhum impacto foi compensado, e a violência persiste, como foi o caso recente de ataques da população local contra os Tenharim, no sul do Amazonas, justamente em razão de um conflito gerado pela Transamazônica. Esse é um exemplo, mas o mesmo ocorre com os Aikewara, igualmente impactados pela abertura de uma estrada em seu território, no Pará, ou os Guarani e os Kaiowá, no Mato Grosso do Sul, que tiveram a invasão de seus territórios intensificada durante a ditadura. Talvez um dos piores legados da ditadura, e que persiste até hoje, é o assassinato de lideranças indígenas, seja por forças do Estado, ou então por aqueles que vêem os índios como seus inimigos.

CC: Hoje os índios estão mais organizados?
FM: Os índios começaram a se organizar, em diferentes uniões políticas pan-indígenas, a partir dos anos 1970, e mais intensamente nos anos 1980, com a União das Nações Indígenas, liderada por Ailton Krenak. Os índios foram percursores de muitos movimentos sociais, inspiraram a luta de Chico Mendes e dos seringueiros pelas Reservas Extrativistas, e foram pioneiros no debate sócio-ecológico, contrapondo-se às formas de conservação hegemônicas, que seguem uma velha ideologia ocidental de separar sociedade de natureza, para propor formas sofisticadas de preservação e convívio com o meio ambiente.

Hoje estão organizados em centenas de associações, federações, articulados em uma ampla rede política, e detêm mais ferramentas de comunicação e informação. Por isso, não só não dependem da Funai, pois a Funai se tornou, como antes, um órgão de repressão às iniciativas indígenas. Atualmente, a Funai serve mais ao governo e aos interesses do governo do que na defesa dos povos indígenas. E grandes lideranças estão sendo perseguidas pela Funai e pelo governo, através de processos administrativos, como o que sofre o líder kayapó Megaron Txucarramãe. Por isso, os indígenas estão mais fortes e organizados politicamente, mas as forças anti-indígenas também estão mais organizadas e cada vez mais brutais e violentas, agindo dentro e fora das instituições.

CC: E os perigos contra seus direitos são maiores?
FM: Há um verdadeiro massacre de direitos em pauta no Congresso Nacional, cujo principal objetivo é destruir a Constituição de 1988. A principal força por trás disso é o consenso das commodities, operado pela política neoextrativista e neodesenvolvimentista do governo junto dos tradicionais piratas e saqueadores, como são os ruralistas e grandes mineradoras, para a extração massiva para exportação dos recursos naturais do País. Essa riqueza, já sendo extinguida por todos os lados, ainda está preservada graças aos povos indígenas, e é contra eles que miram com violência, racismo e discriminação.

CC: Os indígenas ainda sofrem racismo no Brasil?
FM: Não é fácil o combate ao racismo no Brasil, apesar do imenso esforço dos indígenas. O racismo caminha ao lado do interesse nos recursos dos territórios indígenas, como um neocolonialismo. A democracia que seguiu a ditadura chegou menos aos indígenas do que aos brancos. Há uma hierarquia de cidadanias, de classes étnicas: os indígenas são inferiorizados, animalizados, bestializados. Isso continua muito forte. Dentro do governo são discriminados, por juízes racistas são discriminados, e assassinados como animais por ruralistas.

CC: Ao retomar a história dos povos indígenas, seu livro busca apresentar para os moradores de grandes cidades uma saída para uma sociedade mais harmoniosa e sustentável?
FM: É preciso reestabelecer uma conexão entre as cidades e as lutas indígenas. Os moradores das cidades são agentes fundamentais para lutar ao lado dos povos indígenas em face das frentes violentas em campo. É nas cidades que se escolhem os congressistas, que as mobilizações ganham maior atenção da mídia e da opinião pública, e é nas cidades que se tenta justificar o saque aos territórios indígenas, como a infeliz argumentação da necessidade imperativa de Belo Monte para algum indivíduo poder ligar seu computador ou usar o ar condicionado. Não é preciso matar um Arara, ou um Xikrin, para ter energia em São Paulo. Não é preciso matar um Guarani para que a balança comercial se recupere. Não é preciso “genocidar” os indígenas para que outros brasileiros, nas cidades, sejam felizes. É justamente ao contrário: defender os direitos indígenas é defender os direitos da maioria da população brasileira, contra uma violenta minoria que pensa apenas em seus próprios interesses pessoais e usam todas as armas para garantir seus benefícios.

Fonte: Carta Capital

Leia também: Memórias sertanistas: cem anos de indigenismo no Brasil (SESC-SP)

domingo, 24 de maio de 2015

Grilagem de terra e saque de recursos: a máquina de matar na Amazônia

Por Felipe Milanez*

Assassinato de ambientalistas no Pará completa quatro anos com mandante solto

Nesse domingo, 24 de maio, completam-se quatro anos do assassinato de José Cláudio Ribeiro e Maria do Espírito Santos, em Nova Ipixuna, Pará. O crime foi sucedido, naquele momento, por uma série de outras mortes, espalhando ainda mais sangue na Amazônia, como o assassinato de Adelino Ramos, em Rondônia, no dia 27 de maio, no total de 29 assassinatos no campo no Brasil inteiro – e entre elas, a de Nísio Gomes, liderança Guarani Kaiowa no Mato Grosso do Sul. Ao mesmo tempo, a bancada ruralista no Congresso avançava na defesa de seus interesses, garantindo um novo código florestal, financiamento para seus projetos, ameaças a direitos indígenas, paralisação das demarcações e, nesse mesmo sentido, facilidades em mecanismos mais sofisticados, juridicamente, de regularização da grilagem de terra.

Nesses anos que passaram, por um lado, aumentou a violência no campo, segundo dados da Comissão Pastoral da Terra, enquanto nas instâncias burocráticas ruralistas e seus aliados no governo exercem cada vez mais o poder para seus próprios benefícios. O último mês de maio expôs ainda mais a violência brutal – que opera, por vezes, de forma silenciosa e discreta com ameaças e intimidações. O Conselho Indigenista Missionário denunciou o sistemático assassinato de lideranças indígenas, com a morte de Eusébio Ka’apor, no Maranhão, e duas lideranças na Bahia, Gilmar, do povo Tumbalala, e Adenilson Pinduca, dos Tupinambá. O CIMI protocolou um pedido de providências em órgãos públicos para tentar alguma medida urgente do Estado no sentido de estancar a série de execuções de lideranças indígenas, levadas a cabo logo na sequência das mobilizações do Abril Indígena no país inteiro.

Todas essas mortes foram de defensores da Terra, de ambientalistas, indígenas, camponeses, extrativistas, que lutam por terra e defendem o território e os recursos da exploração predatória e ilegal. Em todos os casos, o Estado acobertou o crime com impunidade. Se há violência para a demarcação de terras e criação de assentamentos, Leonilde Medeiros, no último caderno de Conflitos no Campo da CPT, nota também uma violência continuada posterior: “o reconhecimento do direito à terra não elimina a pressão e a violência, reabrindo condições para conflitos.” Foi essa pressão e violência que acontece após o Estado reconhecer o direito à terra que levou ao assassinato de Zé Cláudio e Maria. 

Eles viviam em um assentamento criado em 1997, o Projeto de Assentamento Agroextrativista Praialta Piranheira, mas que nos anos subsequentes passou a conviver com extração ilegal de madeira e concentração de terras por grileiros.

O crime contra Zé Cláudio e Maria chocou o mundo. A fala de Zé Cláudio no TEDxAmazonia, realizado em Manaus em novembro de 2010 (em Marabá, difamadores tentam dizer que a palestra teria sido realizada na CIA, nos Estado Unidos) choca qualquer um que assisti-la hoje. Está disponível aqui no youtube. Eu havia convidado Zé Cláudio a falar no TEDx com a intenção de atrair atenção para sua luta, e a pedido dele e de sua esposa, pois sabiam que apenas uma repercussão poderia salva-los. Como ele dizia, para ver se os mandantes fossem ficar mais “receosos”. Não ficaram. E mesmo depois da imensa repercussão do caso, ainda não estão receosos de seguir matando mais pessoas, mais ambientalistas, mais camponeses, mais extrativistas. 

Recentemente, durante a cerimonia em homenagem aos 19 sem terra mortos em Eldorado dos Carajás, na Curva do S, encontrei um assentado que era amigo de Zé Cláudio. E ele me contou: o assentamento hoje vive um clima de terror. A razão: a família do mandante, José Rodrigues, continua ameaçando novas pessoas, concentrando terras, expulsando trabalhadores que sequer se acham ambientalistas, sequer denunciam as irregularidades, e sequer eram amigos de Zé Claudio ou Maria. Simplesmente porque Zé Rodrigues, que esta foragido da Justiça, está escondido no assentamento e quer continuar grilando terras.

Fiquei pensando: como é possível isso? Por que esse “coração das trevas”? De forma patente, há duas razões urgentes. Primeiro, a impunidade de uma justiça injusta, cruel e infame. Depois, um órgão federal tomado por corrupção e descaso – sendo usado, de maneira eficiente, para a concentração de terras. O INCRA veste o que antropólogo Eduardo Viveiros de Castro me disse ser uma suposta impotência estratégica” do Estado. Finge não dar conta do problema, finge uma “ausência”, que na verdade, nada mais é do que uma aliança com certos interesses ilegítimos.

1: A Justiça injusta
O julgamento dos assassinos e dos mandantes foi uma violência contra a sociedade brasileira. O juiz conduziu todo o processo para que ele caminhasse para a impunidade. E foi brindado com uma articulação religiosa entre o advogado e dois jurados que colocaram suas crenças evangélicas sobre a lei. Como me disse o advogado assistente de acusação, da Comissão Pastoral da Terra: “condenar os executores e inocentar o mandante não tem sustentação”.

O juiz Murilo Lemos Simão escreveu, na sua sentença, que as vítimas “contribuíram para o crime”.

Literalmente, o juiz criminalizou as vítimas. Os dois mortos passaram, na retórica da justiça injusta, a terem a culpa por suas mortes.

Esse mesmo juiz soltou, em 2012, o fazendeiro Vicente Correia Neto e os dois pistoleiros  que ele contratou, Valdenir Lima dos Santos e Diego Pereira Marinho, que tinham confessado terem sido pagos para matar o líder sindical Valdemar Barbosa de Oliveira, o Piauí, em 2011, em Marabá. E os movimentos sociais e a CPT protestaram contra a sua parcialidade no julgamento de conflitos por terra. Ano passado, de forma reincidente, mais uma vez esse mesmo juiz soltou outros dois pistoleiros que mataram o líder camponês Jair Cleber e o tratorista Agnaldo Queiroz. Novamente, mais uma vez, os movimentos sociais protestaram.

Para que serve um Poder Judiciário que julga dessa maneira?

E, como previu o advogado da CPT, a sentença de Simão não teve sustentação quando subiu de instância: o Tribunal de Justiça do Estado do Pará, em julgamento em agosto do ano passado, anulou a absolvição de Zé Rodrigues. O tribunal decidiu que foi, efetivamente, a disputa pela terra o que motivou o crime.

Agora vem um fato confuso: Zé Rodrigues está foragido e não se sabe aonde está o mandado de prisão para prendê-lo. As últimas informações que chequei dão conta de que o judiciário paraense não expediu um mandado de prisão. Primeiro, deveria ter sido expedido pelo TJ, logo após o julgamento do recurso que anulou a absolvição. Mas não o fez, e remeteu diretamente o processo para Marabá. Em Marabá, o juiz Simão tampouco mandou expedir o mandado para cumprir o acórdão do TJ. A polícia civil, que deveria prender Rodrigues, tem dado explicações vagas quando questionada. Na Delegacia de Conlfitos Agrários de Marabá e em Nova Ipixuna dizem que nada receberam. Na secretaria de Segurança Pública do estado dizem que o mandado estaria no “setor de inteligência”. Corri atrás do tal mandado de prisão do mandante nessas delegacias no Pará e na secretaria de segurança pública. A última informação prestada pela CPT é que iria peticionar o o Tribunal de Justiça para expedir e determinar a prisão com urgência. Mas, e o Ministério Público, que deveria cuidar da segurança da sociedade nesse caso?

O próximo objetivo dos familiares das vítimas e seus advogados, que corre em paralelo com a expectativa de prisão de Rodrigues, desaforar o júri de Marabá para que um novo julgamento ocorra em Belém. O argumento principal é que não há condições de seguranças para se realizar um novo júri em Marabá – e basta se lembrar que, no julgamento anterior, a principal testemunha foi ameaçada de morte por um irmão de Rodrigues na frente de todo mundo, e nada aconteceu. Aqui uma análise desse gosto amargo da impunidade.

No pedido de desaforamento protocolado, escrevem os advogados da CPT que no primeiro Juri, “A tensão e a pressão também atingiu o conselho de sentença, causando reação de jurados na forma de choro”; “Essa situação comprometeu a ordem pública e, sem dúvida interferiu na imparcialidade do conselho de sentença.” Esse choro reportado havia sido de compaixão evangélica entre uma das juradas e a cena religiosa perpetrada por Rodrigues pedido perdão a seu deus e sendo amparado pelo juiz Simão – o que havia causado transtorno e revolta no público que assistia.

2: O INCRA e a culpa do governo nas mortes
Enquanto Zé Rodrigues estava preso, por ação da polícia civil do Pará que em uma mega operação o havia prendido (nessa reportagem na revista GQ mostrei os detalhes dessa operação que envolveu 65 homes da polícia), escondido com seu irmão e pistoleiro Lindonjonson, a superintendência do INCRA em Marabá decidiu assenta-lo como beneficiário da reforma agrária. Foi um escândalo – como era de se esperar, e o superintendente do INCRA caiu.

Tal foi o erro grotesco do INCRA que suspeitava-se que seria um caso de “desatenção” – e talvez não de “corrupção”.

Acontece que novas denuncias da região apontam que a situação do INCRA em Marabá é absolutamente crítica. Assentados acusam funcionários do INCRA de cobrarem propina para que eles recebam o documento de Relação de Beneficiários (RB). O mesmo INCRA que assentou um assassino, dando causa não apenas a legitimar o crime praticado (isso foi usado como um argumento da defesa no julgamento) também é acusado de extorquir assentados – segundo denúncias dos próprios, eu mesmo ouvi de diferentes pessoas que pediram anonimato – para que suas posses sejam regularizadas.

Uma denúncia a que tive acesso, protocolada no Ministério Público Federal semana passada, aponta que a “omissão de gestores do INCRA foi uma das causas do assassinato do casal.” O INCRA havia assentado diversos laranjas de uma cartorária que grilava terras; o INCRA nunca apurou as denuncias feitas por Maria do Espírito Santo; o casal havia apoiado três famílias extrativistas que viviam no assentamento e que estavam sendo expulsas por Zé Rodrigues, e o INCRA nunca tomou nenhuma providência. E, o pior: o mandante e seus familiares continuam assentados, o INCRA não ingressou com nenhuma ação para retomar os lotes que foram adquiridos de forma ilegal.

A principal vítima que está em risco, agora, é a irmã de Maria, Laisa Santos Sampaio, que continua vivendo no assentamento e tem recebido ameaças de morte da família. A última, ela me contou pelo telefone essa semana, veio de uma irmã de Zé Rodrigues que disse para uma vizinha de Laisa que ela iria ser morta em breve.

Nessa última semana de maio que segue, a presidenta do INCRA Maira Lúcia de Oliveira Falcón prometeu visitar a superintendência de Marabá (SR 27). Não vai faltar problemas a serem seriamente investigados e medidas a serem tomadas com coragem. Caso não venha a ser tomada alguma providência urgente, é difícil imaginar que os escândalos que ocorrem em Marabá não respinguem em Brasília.

Zé Cláudio sabia
Andei escutando novamente as entrevistas que eu fiz com Zé Cláudio em seu lote, quando o visitei no dia 9 de outubro de 2010. Me chamou a atenção rever a sua preocupação com a questão fundiária, a concentração de terras no assentamento, e o que ele previa: as novas ameaças vindo daí. Ele sabia que o INCRA não estava cumprindo o seu papel, e que o risco a sua vida viria da parte de empresários da cidade, um consórcio: com o declínio da madeira em razão da intensidade da exploração predatória, eles iriam começar a grilar terras dentro do assentamento. E isso poderia custar a sua vida.

Zé Rodrigues, nesse sentido, é apenas um dos mandantes – e mesmo assim impune. Há outras pessoas envolvidas, como tem denunciado os familiares de Zé Cláudio e Maria, e como mostrou o inquérito feito pela polícia federal (que apontava um outro pequeno grileiro, dentro do assentamento, e um fazendeiro e empresário da cidade de Nova Ipixuna).

Disse Zé Cláudio:
Eu vivo em constante tensão, vivo de orelha em pé. De noite, a gente não consegue dormir direito. Cachorro quando late você fica alerto. Em constante tensão.

Ultimamente, já teve muita ameaça. Sem contar com ameaça de defender o meio ambiente contra os madeireiros, ainda teve umas ameaças com fazendeiros. E agora as ameaças estão continuando de novo. Porque os empresários estão concentrando terra aqui, porque está ficando difícil: a madeira está acabando mesmo e daqui mais uns anos não vai mais ter madeira mesmo. Então, o que eles estão fazendo? Estão concentrando terra aqui dentro do projeto de assentamento, o que não pode. Não pode comprar terra aqui dentro do projeto de assentamento. Ainda mais empresário. E ai, eu vou para cima, eu denuncio, eu entro no Ministério Público, e vou para o INCRA. Inclusive já teve retomada de área de gente que já esteve concentrando terra, já tomou e já perderam.

E aí, a gente fica na mira que, algum dia que venha acontecer algum negócio desses, a gente não sabe nem da onde foi que veio.

As investigações apontaram, caro Zé Cláudio. Hoje, a gente sabe de onde é que vieram os tiros que mataram você e sua esposa.

E o mesmo que Zé Cláudio viu acontecer com Dedé em Morada Nova, com o Dézinho em Rondon do Pará, com o Dema, em Altamira, conforme tinha me falado,  aconteceu, até agora, com ele e sua esposa: os mandantes estão soltos.

Ainda  bem que as ideias não morreram junto. Zé Cláudio tinha me falado:
Mas a gente tem uma bandeira de luta, a gente tem uma obrigação como cidadão. E eu jamais vou ver uma injustiça e ficar de boca calada, eu não fico, de jeito nenhum. Nem que isso custe a minha vida, mas eu não fico calado. Porque enquanto eu tiver folego de vida e viver aqui dentro eu combato as injustiças, seja pela depredação do ambiente, seja pela apropriação da terra que ninguém tem direito de ter a terra só para si, a terra tem que ser distribuída para todos.

Nesse domingo, 24 de maio de 2015, familiares e diversos ativistas dos movimentos sociais da região estão lá no lote onde o casal vivia, lutando por essas ideias e pela memória de Zé Cláudio e Maria. 


Fonte: Blog do Felipe Milanez na Carta Capital