Por Movimento Xingu Vivo para Sempre!
Mais de 1.500 pessoas compareceram ontem no Ginásio Poliesportivo em Vitória do Xingu na segunda audiência pública referente ao AHE Belo Monte. Foram quase dez horas de debate sob forte policiamento: cerca de 300 policiais garantiam a “segurança” no recinto. A audiência foi marcada por questionamentos, preocupações e reclamações sobre a metodologia da audiência mas sobretudo pela falta de respostas esclarecedoras por parte da mesa diretora, composta por Paulo Diniz, do IBAMA, Valter Cardeal, da Eletrobrás, Ademar Palocci, da Eletronorte e a equipe contratada pelas empreiteiras Odebrecht, Camargo Corrêa e Andrade Gutierrez para realizar os estudos de impacto ambiental.
Poucos indígenas e moradores das áreas rurais que serão impactadas pelo empreendimento estiveram presentes dadas as dificuldades de deslocamento e a falta de transporte, o que foi motivo de muitas reclamações.
Clarisse Gouveia Morais, moradora do travessão do CENEC, área onde serão construídos os canais de derivação e o reservatório dos canais, resume bem o sentimento de centenas de famílias de agricultores familiares e ribeirinhos que terão que ser removidos de suas terras: “Moeda nenhuma pagará minha vida de trabalho, de muito sofrimento e suor. Não tenho vontade de sair daqui para ir para outras terras recomeçar tudo novamente. O que consegui é pouco mas é o que dá sustento aos meus dois filhos. Quero continuar na minha terra, mantendo minha vida e meu serviço e por isso não quero essa hidrelétrica da morte. Não agüento mais, eu vivo da agricultura, eu não tenho estudo para ocupar nenhum emprego. Vocês nunca conseguirão pagar o que tenho aqui.”
Rodrigo Timóteo da Costa e Silva, Procurador da República do MPF em Altamira registrou mais uma vez seu protesto contra os regulamentos da audiência que só permitem três minutos para manifestação dos moradores, “é insuficiente e anti-democrático e não permite que as pessoas esclareçam suas dúvidas.” Também cobrou da mesa diretora, esclarecimentos a respeito do número de empregos efetivos após o término das obras e a previsão de empregos para os moradores da região. Cardeal e Palocci esclareceram que após 10 anos de obra restarão apenas 1.000 empregos na AHE Belo Monte e que cerca de 8.000 pessoas da região do Xingu composta pelos 11 municípios teriam capacidade de ocupar algum posto de trabalho.
Estiverem presentes pesquisadores da UFPA e outras instituições de pesquisa do país. Todos os pesquisadores presentes se queixaram da falta de tempo para estudar o EIA, e apresentaram uma série de falhas tanto na metodologia empregada quanto nos resultados e previsão de impactos para a região. Sônia Magalhães, professora da UFPA faz pesquisa há mais de 20 anos com populações atingidas por barragens, ressalta que um dos principais problemas é que a população que vive a jusante das barragens não é considerada pelo setor elétrico nacional como população impactada. Parte do princípio que somente as pessoas que vivem nas áreas alagadas pelos reservatórios são passíveis de compensação e objeto de planos de mitigação. No entanto, as comunidades a jusante sofrem alterações importantíssimas no seu modo de vida e na segurança alimentar e cultural. Ela alerta que 72,9% dos moradores das comunidades da Volta Grande do Xingu, que teria sua vazão drasticamente reduzida para a formação do reservatório dos canais, vivem do rio e se alimentam dos peixes e que os estudos realizados não permitem afirmar que haverá água suficiente para garantir as mesmas condições ecológicas de hoje.
Hermes Fonseca, doutor em Ecologia e professor da UFPA afirma que além das preocupações que encontrou com a leitura do EIA, ficou insatisfeito pela manipulação de informação durante o período de respostas. Por exemplo, foi difícil para ele conseguir fazer dizer pelos membros da mesa diretora que a energia firme que será produzida é menos da metade da energia anunciada na apresentação feita pela Eletrobrás que é de 11.233 MW. Outra preocupação dele é com o grau de desinformação da população presente: “A população estava altamente desinformada sobre detalhes fundamentais do projeto mesmo depois da apresentação e se mostrou insegura sobre impactos e medidas mitigatórias.”
Antônia Martins, coordenadora do Movimento de Mulheres Trabalhadoras de Altamira Campo e Cidade fala de sua indignação com respeito ao forte policiamento presente durante toda a audiência. “Se uma pequena parte desses policiais garantissem a segurança da população nesta região de forma permanente, agricultores familiares não seriam vítima da violência no campo, relembrando lideranças que foram assassinadas na região.
Hoje em Altamira acontecerá a última audiência pública prevista para esta região. A expectativa é de debates mais acalorados com a participação de um maior número de pessoas e a presença expressiva dos movimentos sociais. Espera-se também nesta audiência uma maior presença dos povos indígenas que serão impactados pela hidrelétrica.
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