A Confederação Nacional da Agricultura até um dia desses tentava se apresentar para a sociedade como um braço moderno da agricultura brasileira, sem nenhuma relação com a “arcaica” UDR (União Democrática Ruralista).
Mas, após a subida de Kátia Abreu à presidência da entidade, tudo ficou mais às claras. Em suas declarações públicas, a senadora do Democratas do Tocantins não fica devendo em nada ao expoente máximo do ruralismo brasileiro, o deputado federal goiano Ronaldo Caiado, também do Democratas.
De lá pra cá, na tentativa de prevalecer os seus interesses, a CNA perdeu até mesmo a qualidade editorial em suas publicações. Há alguns anos atrás, a entidade chegou a publicar um manual chamado “Fazenda Legal é Produtor Tranqüilo” que orientava os seus sócios a manter a propriedade legalizada para evitar a desapropriação para a criação de assentamentos de reforma agrária. A publicação, apesar de ideologicamente complicada, orientava para o cumprimento da GUT (Grau de Utilização da Terra) e GEE (Grau de Eficiência Econômica), a averbação da reserva legal, o pagamento dos direitos trabalhistas e seu devido arquivamento, etc. Ou seja, era a cartilha do “bom produtor rural”, que estava “dentro da lei” e por isso não poderia ser “punido”. De tão “bem intencionada”, o manual teve apoio do Governo do Pará e do Ministério do Trabalho.
Mas, com o novo discurso da CNA e a ofensiva ruralista para acabar com esses índices, bem como o Código Florestal e qualquer direito trabalhista no campo, a tática editorial da entidade também tem sido outra.
Recentemente, foi publicada na página da CNA na internet e lançada pela grande mídia (com direito à presença do presidente do STF, Gilmar Mendes) o “Observatório das Inseguranças Jurídicas no Campo” (Apresentação geral do ObservatórioPDF1,72 M ).
Em matéria vinculada, diz-se: “(...) será apresentado o novo núcleo de pesquisas estratégicas que oferecerá informações seguras à sociedade brasileira e aos órgãos do Poder Judiciário sobre as ações e iniciativas identificadas em todo o País que ameacem o direito de propriedade e o desenvolvimento econômico e social do Brasil.” (Veja em http://www.agrosoft.org.br/agropag/213254.htm).
O portal pretende promover “... por meio de pesquisas e metodologia, um novo estudo sobre as diversas inseguranças que vêm se consolidando nas áreas rurais do Brasil. Conflitos agrários, reintegração de posse, direito de propriedade são alguns temas abordados neste estudo, que começou a ser feito em 2009, primeiramente em 4 Estados brasileiros: Maranhão, Bahia, Pará e Mato Grosso.”, diz a CNA, apresentando os primeiros quatro “casos”.
Os “Estudos Exploratórios”, apesar do nome pomposo, são documentos de 4 páginas com diagnósticos mais esdrúxulos possíveis. O “estudo” do Pará é ilustrativo, especialmente no que se refere aos processos de reintegração de posse:
“TRAMITAÇÃO DOS PROCESSOS
Todas as ações possessórias tramitam em Varas Especializadas instaladas em cidades pólos do Estado. Nos Processos onde há a participação do Ouvidor Agrário ou de representante do INCRA, o proprietário sempre é prejudicado.
Ocorre isso porque as liminares são suspensas por meio de pedidos do Ouvidor ou mesmo pela remessa do processo à Justiça Federal em face da manifestação de interesse nos processos por parte da Autarquia Federal.
(...)
As cidades onde foram instaladas as Varas Agrárias (Altamira, Castanhal, Marabá, Redenção e Santarém) existem mais facilidades para o Ouvidor Agrário participar dos atos processuais prejudicando os interesses dos produtores, pois em todos os processos que há a participação da Ouvidoria Agrária as liminares não são concedidas e quando há liminar concedida a decisão é suspensa ou o processo é enviado para a Justiça Federal ante a manifestação de interesse do INCRA no processo.
- Nas Varas de Comuns, o proprietário da área invadida contava com os seguintes benefícios:
a) facilidade na apresentação da provas na audiência de justificação;
b) celeridade no cumprimento da liminar de imissão na posse e demais atos processuais;
c) os processos não eram abandonados após a imissão na posse, sendo a sentença prolatada proporcionando a segurança jurídica aos proprietários rurais;
d) Não havia a participação do Ouvidor Agrário, pois os acessos às cidades do interior são mais difíceis.”
{ grifos meus, pontuação deles}
Ou seja, para a CNA, segurança jurídica é ausência de varas especializadas, ausência de mediação nos conflitos e rápido cumprimento de sentenças pelo poder local, longe de grandes centros e da própria estrutura judicial. Seria até cômico se não fosse verdadeiro que a impunidade é o que os ruralistas esperam da Justiça.
Portanto, para o “moderno agronegócio” quanto mais distante do Judiciário que funcione, melhor. Alguma diferença para os ruralistas “arcaicos”?
Veja mais em Estudo exploratório do Estado do ParáPDF36 K
Veja ainda:
Estudo exploratório do Estado do Mato GossoPDF88 K
Estudo exploratório do Estado do MaranhãoPDF32 K
Estudo exploratório do Estado da BahiaPDF31 K
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