Por Carlos Tautz*
A surpreendente saída do Ministro Mangabeira Unger da pasta dos Assuntos Estratégicos, após a minicrise da aprovação da MP 458, mostra que em torno desse tema organizam-se muito mais interesses do que parece. Em verdade, todo tipo e toda escala de interesses, o que exige o envolvimento de vários atores sociais para garantir a transparência e a lisura indispensáveis a ação tão estratégica para o presente e o futuro do Brasil. Deixar o assunto apenas a cargo do Executivo e do Legislativo, como vem sendo até aqui, é mais do que insuficiente. É temerário.
A saída de Unger é o menos importante, ainda que grave. Suspeita-se que ele tenha operado junto à Câmara dos Deputados em defesa de interesses do empresário Daniel Dantas, do Opportunity, a quem assessorava até ir para o governo.
Em verdade, o que importa são as medidas oficiais que volta e meia aparecem, aqui e ali. Articuladamente, elas aprofundam a condição da Amazônia como um grande enclave para a exportação massiva e crescente de natureza - na forma de minérios, madeira, diversidade biológica, energia primaria (gás natural e petróleo) e secundaria (óleos e álcool combustível). De forma tão articulada de configura um verdadeiro modelo. E a história mostra os efeitos deletérios dessa inserção de segunda categoria na economia mundial.
Apesar disso, o crescimentismo econômico entorpece Lula e tem garantido toda a segurança para a implantação de infraestruturas extrativistas cada vez maiores na Amazônia Legal. Voltadas para atender às flutuações do mercado internacional, essa exploração deixa como resultados o agravamento da pobreza e uma interminável sucessão de impactos sociais e ambientais nos territórios em que os projetos se instalam. É o caso de Barcarena (PA) e de muitas outras regiões que volta e meia são alçadas à condição de Eldorado.
Sem levar em consideração as externalidades desse modelo, o sistema de garantias ao capital na Amazônia segue operando sob aval de Lula. Primeiro, a área “técnica” do governo decide retomar o ciclo de hidrelétricas amazônicas superdimensinadas – como Jirau e Santo Antônio (RO) e Belo Monte (PA), que são viabilizadas por dinheiros públicos. Tanto direta (pelo Basa, Banco do Brasil e BNDES), quanto indiretamente (via Petros, Previ etc).
Os excedentes das usinas garantirão a segurança energética a indústrias intensivas em eletricidade – aços laminados, mineral, de ferro e bauxita. A produção será toda exportada para os centros dinâmicos da economia mundial.
Nesse ambiente cria a justificativa para o BNDES virar sócio de qualquer tipo de empresa. Em 2008, por exemplo, o Banco liberou R$ 6 bilhões para frigoríficos como Bertin, JBS, Friboi, Independência e Marfrig, que compram gado engordado em áreas de desmatamento ilegal, o que eleva o Brasil ao posto de quarto maior emissor de gases causadores do Efeito Estufa. Essa “externalidade, porém, é convenientemente esquecida por um certo nacionalismo de resultados. Afinal, o País é o maior exportador mundial de carne bovina.
O sistema de garantias se completa agora com a MP 458, que possibilita a qualquer agente econômico reivindicar uma fatia de até 1500 hectares dos 67 milhões de hectares públicos existentes na Amazônia, mesmo as terras tenham sido griladas e desmatadas.
Assim é o sistema de garantias energética, financeira e legal/institucional. Ele permite a grupos econômicos prepararem-se desde já para dar um salto de produtividade e acumulação no futuro cenário do pós-crise. É o que já faz o Opportunity. Ele migrou do Brasil (tem cerca de 200 mil cabeças) e garante a terra como reserva de valor e meio de acesso a bens naturais. Não é à toa que requereu ao Departamento Nacional de Pesquisa Mineral centenas de pedidos de lavras.
É dessa forma, simples assim, que o sistema se consolida. E se renova.
*Carlos Tautz é jornalista. Publicado no Blog do Noblat.
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