José Júlio da Ponte*
No ano passado, recebia, em minha Clínica de Planta, a visita do líder comunitário da Chapada do Apodi, José Maria Filho - o Zé Maria do Tomé: "Vim adquirir os livros que você escreveu contra esses venenos".
Dei-lhe, graciosamente, os livros solicitados, a par de palavras de encorajamento.
Pouco tempo depois, a tenacidade de sua luta o levaria à primeira vitória: a Câmara de Vereadores de Limoeiro do Norte, rendendo-se aos seus argumentos e aos apelos da Pastoral da Terra, aprovava a lei municipal que coibia as pulverizações aéreas (usando aviões) de agrotóxicos, tal como pretendiam os poderosos produtores de bananas da Chapada.
Zé Maria telefonou-me exultante. Afinal, aquele era o objeto imediato de sua campanha. Todavia, havia mexido em um vespeiro de pujante ferocidade, justo os tais bananicultores. Com efeito, Zé Maria viveu pouco para comemorar.
No dia 21 de abril deste ano, seu corpo tombava, cravejado por 19 balas. Uma cilada covarde, inominável, urdida, por ironia, junto ao campo dos aviões que impedira de voar. Calaram a voz de protesto do ambientalista.
Com Zé Maria, sepultavam, pouco tempo depois, a lei que proibia as pulverizações aéreas.
A mesma Câmara não hesitou em torná-la sem efeito. O mesmo prefeito apressou-se a sancionar a revogação, mui sensível aos apelos dos ilustres produtores de bananas. Prevaleceu, enfim, a lei dos mais fortes. Segundo Marx, "Homens de argila que se moldam facilmente aos caprichos dos capitalistas". Assim, sepultaram um sonho. Um crime inominável.
Quase dois meses depois, não se sabe quem o praticou e quem o patrocinou.
Enquanto isto, milhares de consumidores continuam a ingerir as frutas envenenadas oriundas da Chapada do Apodi. Resta-me o profundo constrangimento.
Réquiem a um ambientalista.
*Diário do Nordeste, em 17/06/2010. José Júlio da Ponte é presidente da Academia Cearense de Ciências
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