quinta-feira, 11 de março de 2010

1950 – Brasil: A copa tupiniquim

Dirley Santos, do Rio de Janeiro (RJ)*

Em um mundo pós-guerra, o conflito entre as duas grandes potências vitoriosas, EUA e URSS, conhecido como Guerra Fria, se mostraria muito quente. Tropas norte-americanas, sob os auspícios da ONU, invadiram a península da Coréia, buscando impedir o avanço comunista. Deste conflito, que produziria quase 1 milhão de mortos, surgiriam as duas Coréias, do Sul e do Norte.

A Copa do Mundo sofreu os reflexos desta conjuntura pós-guerra. Para respeitar a alternância de continentes como sedes, quebrada em 1938, e para fugir dos escombros da II Guerra, a sede escolhida foi o Brasil. Além disso, a Fifa proibiu a seleção da Alemanha, agora dividida, de participar. Novidade foi a presença da seleção da Inglaterra, que até então se recusara a participar por divergências em relação a regras e ao processo de profissionalização do futebol. Além dela, somente mais cinco seleções européias se fizeram presentes: Suécia, Espanha, Iugoslávia, Suíça e Itália. Também participaram as seleções americanas do Uruguai, Chile, Estados Unidos, Paraguai, Bolívia e México, além, é claro, do próprio Brasil.

A seleção inglesa, que estreara vencendo o Chile por 2 a 0, protagoniza uma grande zebra ao perder para o fraquíssimo EUA por 1 a 0. O gol estadunidense que derrubou a seleção da Rainha foi marcado por um imigrante haitiano lavador de pratos. O feito dos Estados Unidos repetiu a vitória do país na economia mundial após a guerra, superando a Inglaterra e se firmando como principal potência imperialista.

O maior do mundo
O torneio foi recebido com todo ufanismo no Brasil, governado democraticamente com “mão de ferro” pelo general Eurico Gaspar Dutra. Um dos símbolos desse sentimento era o Maracanã, monumental estádio para 200 mil pessoas inaugurado para ser palco do título tupiniquim. Muitos estudiosos ressaltam ainda a importância da copa (e do futebol como um todo) para reforçar a unidade e a identidade nacional.

Graças à evolução do esporte no país, a conquista da taça por nosso escrete era dada como certa. Ainda mais com as avassaladoras vitórias obtidas na fase inicial: 4 x 0 no México, 2 x 0 na Iugoslávia, 7 x 1 na Suécia e 6 x 1 na Espanha (imortalizada pelo coro de 180 mil brasileiros cantando “Touradas em Madrid”); o empate com uma esforçada Suíça por 2 x 2 não derrubaria este ufanismo.

Porém, na partida final contra o Uruguai uma improvável tragédia aconteceria, o maracanazo de 16 de julho.
Após iniciar o jogo vencendo, com um gol de Friaça, nossa seleção mesmo tendo craques da estirpe de mestre Zizinho, Ademir Menezes e Jair da Rosa Pinto acabaria sofrendo uma histórica virada em pleno Maracanã. Com gols de Schiafino e Ghiggia e empurrados pelos berros e brios de seu valente capitão, o negro Obdulio Varela, o Uruguai silenciaria todo o estádio e a Celeste Olímpica levaria novamente a taça.

A derrota, por sua vez, calou fundo na alma brasileira; preconceituosos e racistas de plantão poriam a culpa pelo vexame num eterno “complexo de vira-lata” e sobre os ombros de Barbosa, considerado o melhor goleiro da copa, mas que teria a “infelicidade” de ser negro, e do lateral Bigode que teria se acovardado diante de Obdulio.

Já os jogadores e os críticos mais sensatos responsabilizariam os desmandos técnicos e organizativos (muitos bons jogadores de São Paulo ficaram de fora) e o aproveitamento político. Além de longos discursos de presidenciáveis, o técnico Flávio Costa era candidato a deputado e o artilheiro Ademir Menezes a vereador.

Mas o principal vilão foi mesmo o clima de “já ganhou”. Subestimou-se o Uruguai, uma equipe que o Brasil enfrentara antes por torneios sul-americanos e contra a qual conseguira apenas duas vitórias apertadas (3 x 2 e 1 x 0) e uma derrota (4 x 3). Na véspera do jogo as manchetes dos jornais já traziam a foto da seleção do Brasil como campeã, fato este que teria sido usado pelo próprio capitão uruguaio para incentivar seus companheiros de equipe. Ele teria ordenado: “Pisem e urinem no jornal!”.

Enfim, mesmo superando a perda, até hoje a tragédia de 50 traz más lembranças e seus protagonistas sofreram muito com elas. Pelo lado do Brasil, os jogadores foram crucificados historicamente e tachados de perdedores e pelo lado uruguaio nenhum reconhecimento maior foi dado aos seus “heróis”. A maioria dos protagonistas, brasileiros ou uruguaios, irmanaram-se no esquecimento e na pobreza.
*Publicado em 2006 no sítio www.pstu.org.br e em forma de artigos no Jornal Opinião Socialista por oportunidade da Copa da Alemanha.


Mais informações sobre a Copa de 1950*:
- País-sede: Brasil

- Data: 24 de junho a 06 de julho de 1950

- Participantes: Brasil, Iugoslávia, Suíça, México, Espanha, Inglaterra, Estados Unidos, Chile, Suécia, Itália, Paraguai, Uruguai e Bolívia.

- Jogo de abertura: Brasil 4 x 0 México em 24 de junho no Rio de Janeiro (Maracanã)

- Final: Uruguai 2 x 1 Brasil

- Curiosidades:
- A Copa do Mundo de 1950 contou com a participação de 13 países. Trinta e dois participaram das eliminatórias;

- Apesar de muitos países terem disputado as eliminatórias, houve várias desistências: França, Turquia, Portugal e Birmânia alegaram os altos custos de viagem para o Brasill como principal motivo;

- A Índia não foi pois a Fifa não permitiu que eles jogassem descalços;

- Já a Escócia, parte do Reino Unido da Grâ-Bretanha, foram superados pelos ingleses nas elimintórias e mesmo com direito à vaga, alegou que não participaria do torneio por não poder competir novamente com o mesmo adversário;

- Foi a primeira copa onde se montou uma primeira fase com grupos de países. Mas, a com a desistência de alguns países o Grupo 3 teve apenas 3 seleções (Suécia, Itália e Paraguai) e o Grupo coma 4 apenas 2( Uruguai e Bolívia);

- O Japão, sob sanção internacional, e Alemanha, ocupada por tropas do eixo e da URSS, não tiveram como participar da copa ainda como consequência da II Guerra Mundial;

- A participação da Itália era de grande intesse pela Fifa: os italianos eram os defensores do título (vencedores em 1938), mas o país estava se reconstruindo após o final da Segunda Guerra, e primeiramente havia um interesse próximo ao nenhum dos italianos se inscreverem. A Azzurra foi finalmente convencida a participar, porém há rumores que a Fifa teve que custear as viagens para que a seleção italiana pudesse viajar até o Brasil;

- A vitória da seleção dos Estados Unidos sobre a Inglaterra é considerada a maior zebra da história das Copas. Inventores do esporte, os ingleses participavam pela primeira vez de um Mundial e chegaram ao Brasil como favoritos ao título, mas perderam de 1 x 0. Enquanto isso, os norte-americanos tinham uma equipe amadora, formada por imigrantes. O autor do gol foi Gaetjens, nascido no Haiti. Em 2005, foi lançado um filme sobre a partida,
Duelo de Campeões;


- Enquanto jogavam Brasil e Espanha no Maracanã, no Pacaembu em São Paulo, jogavam Suécia e Uruguai. O empate em 2-2 daria por antecipação o título ao Brasil, já que este goleava a Espanha por 6-1. Mas aos 40 minutos do segundo tempo (85' no tempo corrido),
Ghiggia fez o gol que deu a vitória ao Uruguai, e tirando o título por antecipação do Brasil. Depois de perder para o Uruguai em pleno Maracanã e de virada, o povo brasileiro foi acusado de sofrer, pelo escritor Nelson Rodrigues, de “síndrome de vira-lata”;

- Cerca de 200 mil pessoas (cerca de 10% da população carioca na época) foram ao Maracanã para ver a decisão contra o Uruguai. Seria o maior público da história do futebol se não houvesse "apenas" 173.850 pagantes. Com isso, Brasil x Paraguai das Eliminatórias para a Copa de 1970, com 183.341, é o maior público oficial do futebol. Existe uma lenda no Maracanã que, devido a quantidade de pessoas na final as pessoas tinham que ficar em pé e de lado para que coubesse todos no estádio. Desolados, os quase 200 mil torcedores demoraram mais de meia hora para deixar o estádio. O jogo final é conhecido como “maracanazo” ou “maracanaço”, derivada uma expressão latina usada pelos adversários para provocar os brasileiros.

*Fonte: Wikepédia

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