quarta-feira, 1 de outubro de 2008

Após crise, multa do Incra é auditada

Inclusão de assentamentos na lista dos maiores desmatadores gera polêmica no governo; Lula intervém

João Domingos, BRASÍLIA

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva interveio na crise entre os Ministérios do Meio Ambiente e de Desenvolvimento Agrário, provocada pela inclusão de assentamentos do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) na lista dos principais desmatadores da floresta amazônica, divulgada anteontem. De Manaus, o presidente determinou ao ministro Carlos Minc que faça uma auditoria nas oito multas aplicadas ao Incra por desmatamentos de 2.282 km2 em Mato Grosso. "Em 20 dias corridos, o Ibama terá de dizer o que está certo e o que não está nessas multas", disse Minc.

A ordem ao Ibama para que os processos administrativos sejam revisados foi dada na presença do ministro do Desenvolvimento Agrário, Guilherme Cassel, logo depois de ele ter acusado o Meio Ambiente de irresponsabilidade e de ter cometido "erros crassos" ao elaborar o relatório sobre as multas e sobre os maiores desmatadores.

Entre os erros, afirmou Cassel, há uma coordenada geográfica que não corresponde ao local multado e dois casos de multa aplicada com base em uma imagem de satélite obtida três anos antes da criação do assentamento, em meados da década de 1990. Minc admitiu que não conhecia a lista. Fez um mea culpa: "O critério que adotei foi equivocado. Assumo minha responsabilidade por isso."

Mas, logo em seguida, o ministro atiçou ainda mais a crise. "Não produzi a lista. Ela foi feita pelo Ibama. Perguntei desde quando está pronta e disseram que desde janeiro, fevereiro. Perguntei também por que não foi divulgada. Responderam: Não sei? Determinei então que ela fosse divulgada, porque só trabalho com transparência."

Acontece que em janeiro e fevereiro a senadora Marina Silva (PT-AC) ainda era a ministra do Meio Ambiente. Ao dizer que a lista existia há nove meses, Minc acabou deixando no ar a insinuação de que sua antecessora havia escondido o relatório, talvez por conter oito vezes o nome do Incra, seis deles encabeçando o rol dos maiores desmatadores.


Marina reagiu: "Não sei se o Minc quis dizer que tive a intenção de ocultar a lista. Porque aí seria faltar ao respeito comigo", disse.

CONSTRANGIMENTO
Minc, Cassel e o presidente do Incra, Rolf Hackbart, participaram da cerimônia, na sede do Ibama, de assinatura das três primeiras concessões de florestas públicas para a exploração de modo sustentável pela iniciativa privada. Sentaram-se lado a lado. Mas foi visível o constrangimento entre eles. Cassel estava tão indignado que, em vez de fazer um discurso para louvar a iniciativa da concessão da floresta, foi logo ao ataque contra Minc. "Os dados estão errados. Todas as áreas têm como imagem de satélite os anos de 2006 (sete áreas) e de 2007 (uma área). Nenhum desmatamento se refere ao presente ano e muito menos ao avanço do desmatamento verificado em agosto de 2008."
Minc preferiu não responder imediatamente. Disse que iniciaria sua fala pela "agenda positiva". Depois, voltou ao tema. Anunciou a auditoria nos processos das multas. Disse que é tão a favor da reforma agrária que seus trabalhos de mestrado e doutorado foram sobre o tema. Contou ainda que escreveu livros a respeito do assunto. Afirmou que é preciso buscar a sustentabilidade ambiental para os novos assentamentos da reforma agrária e criar condições de preservação para os antigos.


CERTO TREMOR DE TERRA?
Minc disse que costuma ser transparente em seus atos e sabe das dificuldades que isso provoca. "Saiu a lista, provocou um certo tremor de terra. Foi divulgada, para o bem ou para o mal. Acho até que tem suas vantagens, porque nos leva a debater temas como esses e a pensar que o melhor de tudo é preservar. A reforma agrária deve ajudar a preservação."

Fonte: O Estado de São Paulo de 1 de out de 2008.

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