Disponibilizo para os leitores do blog a matéria completa da revista Caros Amigos sobre a situação recente em Anapu.
Quero aqui destacar um trecho da matéria da jornalista Natalia Ribas:
Algumas lideranças, como irmã Jane, analisam que a situação é ainda mais grave se se considerar que Anapu desfrutaria de relativas vantagens em relação a outras regiões, uma vez que os eventos que ali se passam costumam gerar visibilidade singular, por conta da repercussão internacional da morte de Dorothy, bem como por ali terem sido gestados os princípios do modelo de PDS.
O procurador-chefe da República no Pará, Ubiratan Cazzeta, também vê em Anapu um conflito comum a diversos municípios amazônicos, que tributa a uma histórica ausência ou ineficiência do Estado na região. “Há anos que essa tensão existe lá, e há anos que a presença do Estado é insuficiente. Sendo bem objetivo, se nós não tivermos uma efetiva implementação do PDS, a situação de pressão sobre eles vai manter um quadro que a gente conhece em diversos outros locais da Amazônia: você anuncia uma política pública e não faz com que essa política realmente chegue”.
Para o procurador, a implementação do PDS compreende desde a chegada dos créditos de reforma agrária aos assentados até o delineamento de uma visão objetiva do que seja o modelo de sustentabilidade almejado para o assentamento. “E é nessa parte de implementação que os nossos planos falham. Não falo apenas em Anapu, mas quando você fala em Resex, de um modo geral nessas unidades, sejam de conservação, seja esse modelo do PDS. É você ter um plano claro, plano de manejo verdadeiro, manejo no sentido de o que vou fazer nessa área, quais as fontes de recurso pra eu implementar isso, pra onde eu vou vender, qual é a expectativa de renda que eu posso efetivamente trabalhar. É nessa implementação da ideia que a gente acaba tropeçando de quando em quando”.
Para o professor Ariovaldo Umbelino de Oliveira, o problema é ainda mais profundo, e não poderia ser caracterizado apenas como resultado da ausência do Estado. “O que nós temos no Brasil é que a constituição do Estado nas áreas por onde a fronteira foi passando não se fez pela lógica republicana do cumprimento da lei, mas se fez pela lógica do descumprimento da lei, portanto o Estado foi constituído de cabeça para baixo”, analisa. Isso geraria contextos, como os de Anapu e da Amazônia em geral, em que a efetivação de políticas públicas para a maioria da população esbarraria numa estrutura estatal ligada desde o início ao favorecimento dos interesses econômicos dos grandes, o que explicaria a dificuldade de reivindicar nem que seja apenas o cumprimento da legislação prevista. “Quem vai ocupar o cargo de compor os partidos políticos, ser eleito vereador, prefeitos nessas áreas e lutar pela constituição dos municípios e dos novos estados, são exatamente aqueles que foram descumpridores da lei”.
O professor identifica outro elemento que se interpõe entre os camponeses e seus pleitos: a recente lógica adesista do movimento sindical rural ao Estado. “Esse é um problema sério, também. a realidade, o movimento sindical rural tem feito essa política de composição com o Estado para continuar recebendo algumas migalhas das políticas compensatórias. Em outras palavras, a estrutura sindical se afastou da base social, que ela representa. Não quer dizer que em alguns municípios não tenha um sindicato rural atuante, mas ele não é a regra”, aponta.
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