domingo, 27 de maio de 2012

Redução de área de floresta é inconstitucional, diz procurador



A decisão do governo de usar uma medida provisória para reduzir cerca de 1.500 km2 de áreas de preservação ambiental na Amazônia foi parar no Supremo Tribunal Federal (STF). Contrário ao método adotado pelo Planalto para acelerar o processo de licenciamento ambiental de uma série de usinas na região, o procurador-geral da República, Roberto Gurgel, apresentou ao STF uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (Adin), com pedido de medida cautelar para barrar a MP 558/2012. A medida provisória, de acordo com Gurgel, “está repleta de inconstitucionalidades”.
O procurador alega que a MP não atende princípios básicos que justifiquem sua publicação. Pela Constituição, argumenta Gurgel, a redução de reservas ambientais só poderia ser feita após audiências públicas com a população, além só poder ser efetivada por meio de lei, isto é, o tema deveria ser objeto de discussão ampla no Congresso. “A MP é temerária e prematura, porque não precedida dos procedimentos legais necessários”, diz o procurador-geral, alegando que as determinações causam lesões ambientais que são, com grande frequência, de caráter irreparável. “Diante do princípio geral da prevenção, e tendo em vista que está em jogo nada menos do que a integridade do Bioma Amazônia, a necessidade de medida cautelar se torna irrefutável”, diz Gurgel.
A ministra Cármen Lúcia é a relatora da ação (Adin 4.717) que será julgada pelo STF. Apesar de a ministra ter cobrado em seu despacho do dia 29 de fevereiro que a Secretaria Judiciária providenciasse “as medidas processuais com urgência”, não há até agora uma previsão muito firme sobre quando o julgamento poderá ocorrer. Isso significa que pode levar dias, meses ou até anos para a Adin ser julgada.
Nos quatro meses que a medida provisória passou pelo Congresso, a Eletrobras tratou de avançar no rito de licenciamento. Na semana passada, o deputado José Geraldo (PT-PA), relator da MP 558 na Câmara, aprovou o texto sem grandes alterações. O parlamentar discorda das alegações feitas pelo Ministério Público Federal e afirma que a MP tem, sim, caráter de urgência para resolver “problemas crônicos”.
“Essa interpretação do procurador-geral [Roberto Gurgel] é equivocada. Com a MP, o governo está resolvendo um passivo latifundiário que existe na região há décadas e que sempre foi ignorado”, afirma. “Além disso, o Ministério Público do Pará defende uma posição política contra as barragens, não é uma posição técnica. Em vez de se preocupar com algo que realmente seja irregular, ele assume um posicionamento radical. Não querem as usinas, mas esquecem que a região Norte queima 6 milhões de litros de óleo diesel por dia para ter energia.”
O mesmo posicionamento é sustentado pela senadora Vanessa Grazziotin (PCdoB/AM), que assumiu a relatoria da MP no Senado. “Não há nenhuma inconstitucionalidade no ato. Há uma decisão de governo em compensar as áreas atingidas. O Brasil é um exemplo mundial de cuidados com o ambiente”, comenta.
A votação do texto pelo Senado tem que ocorrer até o próximo dia 31, data em que expira o prazo da MP. Segundo Vanessa Grazziotin, a medida entrará na pauta da terça-feira. A senadora não acredita em dificuldades para que o texto passe pelo plenário, para então ser sancionado pela presidente Dilma Rousseff. “Não acredito que seja uma votação complicada, porque as áreas afetadas são pequenas. O assunto pode até gerar alguma polêmica, mas estamos conversando com as lideranças. A MP vai passar”, diz.
A Medida Provisória 558 alterou os limites das seguintes unidades: Nacional da Amazônia, Parque Nacional dos Campos Amazônicos, Parque Nacional Mapinguari, Floresta Nacional de Itaituba I, Floresta Nacional de Itaituba II, Floresta Nacional do Crepori e Área de Proteção Ambiental do Tapajós. O tamanho original dessas reservas, conforme dados do ICMBio, era de 45.575 km2. Foram retirados 1.051 km2 das unidades e outros 55 km2 foram acrescidos.
Para justificar a edição da MP, o governo alegou que as alterações eram necessárias para excluir áreas das reservas ocupadas por posseiros, com o propósito de fazer a regularização fundiária. Entre as mudanças estão “correções” feitas no Parque Nacional Mapinguari, que terá parte de sua área inundada pelos lagos das usinas de Jirau e Santo Antônio, erguidas no rio Madeira, em Porto Velho (RO).
Na semana passada, o Movimento Tapajós enviou uma nota de repúdio ao Congresso, pedindo que a MP não seja aprovada. O documento assinado por dezenas de ribeirinhos, indígenas e organizações sociais da região deixa claro que defende a regularização de assentamentos pelo Incra, mas critica o viés para liberar a construção de novas usinas. “Essa medida provisória foi assinada com o objetivo principal de abrir caminho para a implantação das megabarragens de São Luiz do Tapajós e Jatobá no Rio Tapajós, sem qualquer consulta prévia junto às populações ameaçadas, e sem estudos obrigatórios sobre a sua viabilidade socioambiental e econômica”, diz o texto da nota.
Fonte: Valor Econômico


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