terça-feira, 16 de junho de 2009

Carta Aberta da CPT de Santarém

O final de 2008 e início de 2009 são marcados por medidas governamentais que vão ao encontro das demandas feitas por grupos econômicos que atuam na Amazônia. Na questão fundiária são inúmeras as tentativas de parlamentares para garantir mecanismos que facilitem o acesso a terra por grupos que ocuparam as mesmas, em muitos casos, ilegalmente. Outro caso é a legislação ambiental que tem sofrido vários ataques para afrouxar as regras existentes, tudo em favor do agronegócio.

Em 17 de dezembro de 2008 foi aprovado pelo governo do Estado do Pará a Lei Estadual nº 7.243 que dispõe sobre o Zoneamento Ecológico Econômico da área de Influência da Rodovia BR 163 (Cuiabá – Santarém) e BR 230 (Transamazônica). Este ZEE aprovado atende diretamente aos interesses da agricultura mecanizada que ocupa extensas áreas na região Oeste do Pará. Uma medida do governo para evitar a criação de novas áreas de conservação ou destinação de áreas às populações tradicionais.

No ZEE todas as áreas não protegidas são consideradas zonas de “expansão” e de “consolidação”, que significa gestão de atividades com agricultura mecanizada ou exploração madeireira intensiva. É assim que áreas com características bem distintas como o planalto santareno e a Gleba Nova Olinda recebem os mesmos indicativos de uso, mas sabemos que estas duas regiões possuem características florestais bem diferentes. Porém, a recente ocupação, diga-se de passagem, conflituosa, é feita por cooperativas ou grupos de empresários vindos do sul do país, geralmente com passagem por Mato Grosso, que têm como atividades o monocultivo de soja.

É importante lembrar que o atual ZEE resgata várias iniciativas de sojicultores no Oeste do Pará, pois antes da consolidação da elaboração final do ZEE a Cargill S.A. que contratou a ONG The Nature Conservancy apresentou ao Ministério Público Federal – MPF, IBAMA e INCRA uma proposta de Termo de Ajustamento de Conduta – TAC, em favor dos sojicultores que cometeram crimes contra a legislação ambiental. A CPT teve acesso a uma cópia da minuta do TAC e constatou os absurdos propostos. Entre eles que o IBAMA perdoasse as multas e que o INCRA se comprometesse em emitir títulos fundiários das terras públicas ocupadas pelos sojicultores. A proposta foi muito criticada pelos movimentos sociais e o MPF não aceitou.

Porém, o Governo do Estado do Pará se propôs a atender aqueles grupos e elaborou o ZEE do entorno das BRs. Foi um dos mais rápidos ZEEs já elaborados. Nele todos aqueles que cometeram crimes ambientais foram anistiados, pois foi reduzida a reserva legal de 80% para 50% para o caso de reflorestamento. Para isto, basta que aquele que cometeu o crime celebre um compromisso de recuperação da área. Como podemos acreditar que pessoas que cometeram crimes, agora com um simples acordo vão cumprir a lei?

Para piorar ainda mais a situação e avançar na farra de destruição da floresta, o Deputado Estadual Lira Maia, que foi prefeito de Santarém no período de 1996 a 2004, e que naquele período foi até o Mato Grosso oferecer terras para o plantio de soja em Santarém, recentemente encaminhou para Brasília um projeto de lei diminuindo a reserva legal que hoje é de 80% na Amazônia para até 35%.

Por outro lado, mas no mesmo sentido, ou seja, atender os interesses do agronegócio na Amazônia, o governo Federal vem tentando de todas as formas editar a Medida Provisória 458 que trata de regularização fundiária. Esta MP é posterior a Instrução Normativa 41 e a MP 422 que tratam do mesmo assunto. Porém, a MP 458 escancara ainda mais as portas para a grilagem. Pois, aumenta os limites passiveis de alienação até 1.500 hectares sem licitação, permitem a concessão de uso de áreas até 2.500 hectares ao mesmo tempo em que dispensa a vistoria para áreas de até 400 hectares.

O governo brasileiro parece se propor a acabar com o problema da grilagem legalizando as áreas griladas. É flagrante a postura dos parlamentares ao fazerem emendas no texto da MP 458 que favorece a grupos fundiários que grilam terras na região. Para termos uma idéia, as terras concedidas para a Reforma Agrária através de Assentamentos têm uma alienação de dez anos para a titulação e não podem ser comercializadas. Já na MP a proposta é que as terras tituladas não tenham nenhum tempo de alienação, ou seja, quem obtiver o titulo poderá sem nenhum prazo vender a área.

A CPT tem alertado para as conseqüências negativas que tais políticas apontam. Temos trabalhado junto às comunidades locais e entidades que os representam para garantir seus direitos e acesso a terra. Temos cobrado do governo em suas diferentes esferas de atuação, políticas públicas que atendam os interesses das populações camponesas e tradicionais, mas os resultados são lentíssimos, por outro lado, políticas que agridem aquelas populações vem a galope.

Santarém, 10 de junho de 2009.
Comissão Pastoral da Terra
Santarém Pará.

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